A sepse, um tipo de infecção grave, está entre as principais causas de morte materna em todo o mundo, causando cerca de 260 mil óbitos anualmente, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Em países desenvolvidos, a taxa de mulheres que perdem a vida durante a gestação ou 42 dias após é cerca de 5%, enquanto nos subdesenvolvidos esse número chega a 11%. Uma única dose de um antibiótico popular pode reverter esse quadro. Em um estudo apresentado nesta quinta-feira (9/2), na reunião anual da Sociedade de Medicina Materno-Fetal dos Estados Unidos, cientistas mostram que a azitromicina reduz em 33% o risco de morte materna em decorrência de septicemia.
Elas estavam, pelo menos, na 28ª semana de gravidez, se planejavam para ter um parto vaginal e foram designadas, de forma aleatória, a receber uma dose de azitromicina ou de um placebo. Dessa forma, 14.590 receberam o antibiótico e 14.688, a substância neutra. Todas foram acompanhadas por 42 dias após o parto. A análise dos dados mostrou que uma única dose de azitromicina, administrada por via oral, foi capaz de reduzir o risco de morte materna ou de sepse em 33% em mulheres que tiveram um parto vaginal.
Segundo Alan Tita, principal autor do estudo e subespecialista em medicina materno-fetal na Escola de Medicina na Universidade de Alabama, "a azitromicina fornece cobertura contra bactérias adicionais que causam infecções maternas". A droga é prescrita para tratar uma ampla variedade de infecções bacterianas, com "pesquisas anteriores apoiando a sua eficácia".
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No novo estudo, a equipe observou benefícios como redução do risco de ocorrência de endometrite materna, infecções, reinternações e visitas não programadas ao hospital. "Nossa pesquisa mostra que apenas uma dose de azitromicina pode ser uma intervenção útil e de baixo custo para reduzir a sepse e as mortes maternas concomitantes", enfatiza Tita. "A simplicidade dessa intervenção deve permitir que sua adoção em todo o mundo proteja as mães durante o parto", defende, em nota.
Combinação de fatores
Os pesquisadores optaram por analisar os efeitos do antibiótico em partos vaginais devido às maiores taxas desse tipo de procedimento em países de baixa e média renda e aos maiores índices de mortalidade materna globalmente. "Muitos desses países têm baixas taxas de cesariana. Então, as infecções mais graves que levam à morte ocorrem após o parto vaginal", explica o autor.
Segundo Ângelo Pereira, coordenador da Obstetrícia do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, a sepse materna é mais comum em países em desenvolvimento pelo menor acesso à saúde de qualidade, pela falta de informação e educação em saúde sexual. "Essa combinação de fatores leva a um maior número de gestações e suas complicações infecciosas, seja ao longo da gravidez por doenças não tratadas, como pneumonias e infecções urinárias, seja no parto e no abortamento pela realização de procedimentos em ambientes insalubres, pela dificuldade em acesso a antibiótico em tempo oportuno e pelo atraso no reconhecimento e no enfrentamento da sepse de forma efetiva", detalha.
Tatianna Ribeiro, obstetra e especialista em reprodução humana da clínica Rehgio, em Brasília, lembra que alterações fisiológicas da gravidez podem mascarar e piorar a resposta do organismo a um processo de sepse, dificultando seu diagnóstico. "A maior parte dos agentes etiológicos causadores da sepse materna já compõem naturalmente a flora vaginal da mulher. Essa flora sofre alterações durante a gestação e só retorna ao estado fisiológico prévio por volta de seis semanas após o parto", explica. "O desenvolvimento da doença vai se dar pela ascensão desses micro-organismos para o útero ainda mesmo durante o trabalho de parto, tendo seu 'momento de pico' por volta do 3º dia".
A médica diz que, na gravidez, o útero se encontra mais suscetível às infecções devido à grande área sensibilizada pelo descolamento da placenta. Outros fatores obstétricos que influenciam no desenvolvimento da infecção são corrimento vaginal, história de infecção pélvica, gravidez múltipla, reprodução assistida e procedimentos invasivos, como cerclagem cervical, parto cesáreo, trauma vaginal e hematoma de ferida operatória. Obesidade, diabetes, intolerância à glicose e idade materna acima de 35 anos também são facilitadores para o quadro infeccioso.
Nesse cenário, Ângelo Pereira afirma que o uso de antibióticos, no momento do parto, é fundamental para reduzir as taxas de infecções e, consequentemente, a infecção generalizada. "Porém, as taxas de sepse no início da gestação, durante os casos de aborto infectado e ao longo da gravidez por complicações clínicas não serão contempladas", lembra o obstetra. Para a redução eficaz da sepse materna, avalia o médico, são necessárias medidas mais amplas, que contemplem todos os momentos da gestação, assim como "ações educativas e de planejamento familiar que melhorem as condições de vida das mulheres em idade fértil".
*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza
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