A Finlândia foi recentemente reconhecida como o país mais feliz do mundo, pelo sexto ano consecutivo. Diversas teorias já foram apresentadas para explicar por que o país nórdico continua a figurar no topo do ranking da felicidade. Elas vão da maior igualdade de renda até o tempo passado em meio à natureza. Mas um professor de sociologia finlandês creditou a posição do país a "uma orientação cultural que define limites realistas às expectativas para uma boa vida". Ou seja, ele parece acreditar que os finlandeses são felizes porque suas expectativas não são altas demais.



Devemos, então, reduzir nossas expectativas para ser mais feliz? Eu defenderia que as pesquisas na área da psicologia indicam o oposto. Altas expectativas são importantes porque nos permitem sonhar e criar objetivos.

O processo conhecido como contraste mental faz com que nós criemos julgamentos sobre as nossas expectativas de futuro para decidir quais sonhos são realistas e podemos buscar - e quais deveríamos abandonar.

Imagine-se, por exemplo, vivendo uma vida com muitos amigos à sua volta. Se você estiver sentado sozinho em casa tendo esse sonho e se sentir triste com a sua realidade solitária, o contraste mental ajuda você a identificar o seu sonho, antecipar possíveis obstáculos, planejar as ações a serem tomadas para superá-los e buscar um objetivo que o ajude a fazer amigos, como filiar-se a um clube, por exemplo.





Por isso, as altas expectativas, quando são realistas, podem servir de força motivadora rumo a uma mudança. E as altas expectativas também nos mantêm otimistas, para continuarmos avançando frente às adversidades.


Leia também: Brasil desaba em ranking da felicidade; descubra onde foi parar.

Quando algo de ruim acontece com alguém que desenvolve a expectativa de que tudo sairá bem — apesar da adversidade e mesmo que não pareça realista naquele momento —, isso pode fazer com que essa pessoa tome medidas positivas para seguir adiante.

Digamos, por exemplo, que tenha passado pelo término de um relacionamento e a sua expectativa de encontrar um parceiro de vida diminua. Se você continuar a ter altas expectativas de que irá encontrar a pessoa certa, terá mais possibilidade de entrar em um site de namoro e buscar oportunidades de encontrar novas pessoas.





Por outro lado...

As baixas expectativas limitam nossa capacidade de desenvolvimento e de crescimento.

Ter baixas expectativas de conseguir realizar o que esperamos não é uma boa forma de adaptação às mudanças da vida e pode gerar sentimentos de impotência e desespero.

Leia também: O que é a ditadura da felicidade e como podemos escapar dela.

Quando temos baixas expectativas de sucesso após uma adversidade, nossa propensão a desistir é maior — não tentar um aplicativo de namoro, por exemplo. E, mesmo quando nossas possibilidades de sucesso são objetivamente altas, nós deixamos passar oportunidades — de encontrar novas pessoas, talvez — devido às nossas baixas expectativas de que as coisas funcionem bem para nós.

Por isso, com altas expectativas, podemos nos adaptar às mudanças de circunstâncias e seguir adiante. É um sinal de resiliência, adaptabilidade e bem-estar.





Expectativas dos demais

Embora seja útil definir altas expectativas para nós mesmos, também costumamos atingir melhores resultados quando outras pessoas têm altas expectativas de nós. É o chamado efeito Pigmaleão.

Quando sabemos que as outras pessoas nos consideram capazes e acreditam que podemos realizar mais do que pensamos, isso nos incentiva a buscar melhor desempenho. E, da mesma forma, quando os demais têm baixas expectativas sobre nós, geralmente nossos resultados diminuem.

O efeito Pigmaleão foi extensamente testado no trabalho e na escola, com resultados similares.





A Finlândia foi reconhecida como o país mais feliz do mundo pelo sexto ano consecutivo

(foto: Getty Images)

Quando as altas expectativas podem ser ruins?

Definir expectativas altas demais pode ter efeitos negativos. Imagine que você tenha superestimado seus conhecimentos e definido desafios grandes demais para você mesmo. Você pode ter começado a jogar Candy Crush no celular do seu parceiro e o nível dele é muito mais alto do que o seu. O descompasso de competência entre você e o novo nível do jogo pode gerar frustração e até ansiedade.

Para neutralizar esta situação, tudo o que você precisa é voltar para um nível mais adequado para a sua experiência — um nível que seja um desafio, mas que permita que você atinja altos resultados para progredir no jogo.

Nossa tendência é fazer o mesmo na vida real para manter o equilíbrio. Digamos que você esteja organizando um jantar para os seus amigos. Se você se comprometer com uma refeição sofisticada, que apresente grandes dificuldades, sua ansiedade pode atingir níveis tão altos que você não conseguirá desfrutar do seu próprio jantar.





Mas você pode reduzir suas expectativas, preparando uma refeição que não exija tantos conhecimentos, mas ainda seja um desafio (e que seus amigos, sem dúvida, ainda irão aproveitar).

Administrando as expectativas

Todos nós temos anseios — o desejo de uma versão ideal das nossas vidas.

Alguns dos nossos anseios tornam-se objetivos (ter filhos, por exemplo), enquanto outros se tornam desejos de toda a vida que provavelmente nunca irão se realizar (como vencer em um programa de televisão).

Um dos motivos que levam as pessoas a não querer ter altas expectativas é se proteger da desilusão quando suas esperanças não se realizarem. A preocupação é válida. Mas aprender a controlar as emoções na hora da tristeza e da frustração nos ajuda a lidar com as adversidades de forma mais efetiva.

Os prós da alta expectativa quando ela nos motiva a definir e atingir objetivos superam os contras e qualquer tipo de "proteção" que possamos ter com baixas expectativas. Considerando tudo isso, acho simplista demais acreditar que este seja o motivo da felicidade dos finlandeses.





 

*Jolanta Burke é professora do Centro de Ciências da Saúde Positivas da Universidade de Medicina e Ciências da Saúde do Colégio Real de Cirurgiões da Irlanda.

 

Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em inglês.

compartilhe