panfleto com sintomas da tuberculose

Tossindo há mais de três semanas? Pode ser tuberculose

Flickr
O número de casos de tuberculose no Brasil voltou a aumentar, interrompendo uma sequências de dois anos seguidos em queda. Com isso, aproximou-se do cenário observado no período pré-pandemia de Covid. O aumento é atribuído ao represamento de diagnósticos que deixaram de ser efetuados nos dois primeiros anos da crise sanitária. E ele preocupa devido ao avanço da doença entre crianças e adolescentes.

 

Boletim epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente, do Ministério da Saúde, aponta que em 2022 foram registrados 2.703 casos em menores de 15 anos, o que corresponde a 3,5% do total de casos no país, a maior proporção verificada desde 2012. Destes, 1.788 foram em crianças com menos de dez anos.

Houve também um aumento na proporção de novos diagnósticos em crianças de 0 a 4 anos. No ano passado, essa faixa etária respondeu por 37,5% dos casos até menores de 15 anos, a maior fatia desde 2012.

Ao todo, o país acumulou no ano passado 78.057 novos casos da doença (36,3 por 100 mil habitantes), superando os 74.385 (34,9 por 100 mil habitantes) e 70.554 (33,3 por 100 mil habitantes) de 2021 e 2020, respectivamente.

O número de 2022 é ainda o mais alto desde 2012, ficando abaixo somente dos mais de 79 mil contabilizados (quase 38 por 100 mil habitantes) tanto em 2018 quanto em 2019.

Segundo o boletim, houve ainda um aumento de mortes provocadas por tuberculose de 11% em 2021 em relação ao ano anterior, passando de 4.569 mortes para 5.072.

Para Pedro Campana, infectologista da Santa Casa de São Paulo, do Hospital das Clínicas da USP e do NuMa (Núcleo de Medicina Afetiva), os mais jovens têm apresentado, em geral, um quadro pior, com acometimento múltiplo de órgãos e sistemas, não só pulmões. "Temos percebido um aumento no número de pacientes que chegam ao hospital em estado grave."

A tuberculose é uma doença contagiosa provocada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis. Ela é transmitida pelas vias aéreas e se dissemina facilmente em áreas com grandes aglomerações de pessoas, alta concentração de pobreza, ambientes sem entrada de luz solar e pouca circulação de ar.

Ele explica que o aumento da incidência da doença tem relação direta com a piora das condições sociais do país nos últimos anos, principalmente em pacientes desnutridos. Além disso, os novos casos em crianças menores de cinco anos podem ter tido uma influência direta com o período de confinamento provocado pela pandemia da Covid.

"Sempre que temos um caso de tuberculose em uma criança de cinco anos ou menos é preciso procurar quem é o adulto que mora com aquela criança e provavelmente transmitiu a bactéria", reforça Campana.

Uma forma de proteger a forma grave nas crianças é com a vacina BCG, ofertada amplamente no Programa Nacional de Imunizações, mas ela não impede a infecção na idade adulta.

"[A vacina] BCG previne a infecção na infância, mas tem menor eficácia em adultos, isto é, a imunidade vai se perdendo com a idade. Por isso, hoje busca-se aumentar a duração da imunidade ou criar um reforço", diz Luciana Leite, pesquisadora sênior do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan.

Leite é a coordenadora da pesquisa que procura desenvolver uma vacina de BCG recombinante compreendendo uma linhagem da bactéria modificada para produzir uma proteína da bactéria E. coli, que serve como um adjuvante (potencializador) da resposta imune. Essa vacina concluiu as etapas pré-clínicas, em laboratório, onde foi demonstrado que ela induz maior proteção e maior duração da resposta imune em camundongos. Agora, espera-se que avance para testes em humanos.

A queda na cobertura vacinal de BCG pode ter provocado um aumento de novas infecções nos pequenos, afirma a pesquisadora. "O país sempre foi muito bem situado na vacinação em geral, e a cobertura de BCG tinha bons índices, mas com a pandemia a cobertura caiu muito", diz.

NORTE DO PAÍS CONCENTRA ALTA INCIDÊNCIA

Embora a incidência de tuberculose no país como um todo tenha crescido de 2020 a 2022, os estados que concentram a maior incidência da doença são Amazonas (84,1 casos por 100 mil habitantes), Roraima (75,9), Acre (52) e Pará (49,4).

Entre os demais estados do Norte, Amapá (43,1) e Tocantins (13,6) já apresentavam tendência de crescimento antes da pandemia, enquanto Rondônia (26,9) é o único da região com tendência de queda nos últimos quatro anos.

Em relação às etnias e cor de pele, a maior proporção de novos casos de tuberculose de 2012 a 2022 se concentra na população preta e parda, mas também houve aumento de incidência em pessoas amarelas e indígenas, enquanto nos brancos caiu.

Para Campana, os dados reforçam a situação de vulnerabilidade social dos indígenas, que já são considerados um grupo de maior risco para tuberculose. "Eu costumo falar para os meus alunos que um fator de risco para tuberculose é viver no Brasil. Muitas pessoas das classes média e alta nunca tiveram contato com a realidade da tuberculose, mas ela está disseminada em todo o país, especialmente nas populações mais vulneráveis."

Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que o cenário da tuberculose no país foi agravado pela pandemia, e que permanece uma doença infecciosa que, mesmo com medidas de prevenção e tratamento disponíveis, ainda causa um elevado número de mortes no Brasil.

Em relação aos novos casos em crianças, a pasta disse que elas são frequentemente afetadas por serem contatos de adultos doentes, e que uma das principais formas de proteção contra casos graves é a vacina BCG, ofertada logo após o nascimento. A atual gestão afirmou que "está totalmente empenhada em resgatar as altas coberturas vacinais no país".

DIAGNÓSTICO PRECOCE NA POPULAÇÃO COM HIV


Entre as populações de maior risco estão também as pessoas vivendo com HIV e em situação de rua, onde a taxa de óbito chega a ser 15 a 21 vezes maior do que na população geral.

Em março, o Ministério da Saúde distribuiu 13,9 mil testes rápidos aos municípios para ampliar o diagnóstico de tuberculose na população vivendo com HIV/Aids.

Diferente do teste tradicional, o novo exame, chamado LF-LAM (fluxo lateral para detecção de lipoarabinomanano), tem uma sensibilidade muito maior nessa população, o que leva a um diagnóstico mais rápido e eficaz, fundamental para identificar os primeiros sintomas da doença e iniciar o tratamento.

Ele é ofertado em todos os serviços de saúde e utiliza amostras de urina, com resultado em 25 minutos.