médicos conversam com paciente

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EVARISTO SA/AFP

Segunda cirurgia mais frequente em mulheres na idade reprodutiva, sendo superada, no Brasil, apenas pela cesariana, a histerectomia é indicada em casos de mioma, endometriose e tumor, entre outras complicações. O grande volume de procedimentos, porém, não ameniza as preocupações quanto a possíveis efeitos adversos.

Histerectomia: procedimento do passado, presente ou futuro?

Na tentativa de aprofundar a análise de vantagens e desvantagens desse tipo de tratamento, pesquisadores do Centro de Pesquisa da Sociedade Dinamarquesa do Câncer avaliaram o risco comparativo de câncer, doença cardiovascular e morte entre mulheres submetidas a histerectomia benigna com a retirada dos ovários.

"A histerectomia é a cirurgia de retirada do útero com ou sem seus órgãos anexos, como tubas e ovários. Ela é benigna quando a indicação do procedimento cirúrgico está relacionada a uma patologia não oncológica, ou seja, que a doença não é câncer. São exemplos miomas uterinos e adenomiose", explica Leticia Sandre, cirurgiã ginecológica da Maternidade do Hospital Santa Lúcia, de Brasília. 

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A retirada das glândulas reprodutivas femininas visa aumentar as chances de sobrevivência de mulheres com alto risco de câncer de ovário. No entanto, de acordo com os pesquisadores, não se sabe o suficiente sobre como esses procedimentos afetam outros aspectos da saúde das pacientes.

O estudo, com base em dados de mais 140 mil mulheres na Dinamarca, mostra que as mulheres que tiveram os ovários removidos apresentam um risco menor de câncer de ovário, mas outros resultados de saúde variaram de acordo com a idade/estado da menopausa. A cirurgia foi associada, por exemplo, ao aumento do risco de doença cardiovascular em mulheres mais jovens e ao de câncer nas mais velhas com menor vulnerabilidade de serem acometidas por tumores.

 

"A remoção de ambos os ovários no momento da histerectomia benigna é controversa. Sabemos que ela beneficia mulheres com predisposição genética ao câncer de ovário, mas para mulheres sem essa predisposição, esse câncer é raro, e a redução de sua ocorrência deve ser ponderada em relação a outros benefícios e riscos de saúde a longo prazo", afirma Mathilde Gottschau, primeira autora do artigo, publicado na revista Annals of Internal Medicine, da American College of Physicians.

Para chegar à conclusão, Gottschau e colegas analisaram registros nacionais de saúde disponíveis na Dinamarca, com informações sobre diagnósticos, cirurgias, status de migração e óbito. "Incluímos 142.985 mulheres, das quais 22.974 tiveram ambos os ovários removidos ao mesmo tempo em uma histerectomia benigna. Queríamos investigar o impacto da remoção dos ovários em diferentes aspectos da saúde", conta a autora.

O grupo também observou que as mulheres na pré-menopausa submetidas à cirurgia apresentaram um risco maior de hospitalização por doença cardiovascular, enquanto as na perimenopausa (transição para a menopausa), pós-menopausa precoce e pós-menopausa tardia, um risco maior de câncer. "Além disso, entre as pacientes com os ovários removidos na perimenopausa, houve mais mortes nas avaliações feitas 10 e 20 anos após a cirurgia. E nas mulheres com 65 anos ou mais, houve menos morte quando avaliadas 20 anos depois", detalha a autora.

Hormônios

Na avaliação de Sandre, os resultados obtidos pela equipe dinamarquesa se justificam pela cessação de produção dos hormônios pelos ovários. "Sabe-se que o órgão produtor de hormônios femininos continua uma mínima produção na pós-menopausa, e é exatamente isso que protege a mulher de doenças cardiovasculares, osteoporose e alguns tipos de câncer", explica. "Contudo, devemos considerar que, para todas as doenças citadas, a ausência do órgão e, consequentemente, dos hormônios é apenas um fator de risco associado."

Tatianna Ribeiro, ginecologista da clínica Rehgio, em Brasília, explica que o procedimento de remoção dos ovários (ooforectomia) costuma ser realizado com a histerectomia e outras cirurgias intra-abdominais. Porém, a médica alerta que é necessário levar em consideração, além das queixas da paciente, outras comorbidades associadas, a idade e o histórico de saúde familiar. "A retirada cirúrgica dos ovários propicia redução abrupta dos níveis de estradiol e testosterona séricos tanto na transição quanto na pós-menopausa. Essa queda nos esteroides sexuais pode resultar em redução da libido, aumento no risco de fraturas por osteoporose e elevação nas taxas de doenças cardiovasculares", justifica.

A ginecologista defende que a decisão final sobre a realização ou não da retirada dos ovários cabe à mulher, que deverá se basear nas informações atualizadas sobre os benefícios e possíveis danos à saúde. Tanto as especialistas quanto a autora lembram que os mecanismos por trás dos riscos adversos à saúde em decorrência da histerectomia com a retirada dos ovários são complexos devido à influência do estado da menopausa e de outros fatores associados à saúde ginecológica da mulher, como a produção de hormônios, e também de fatores externos — tabagismo, sedentarismo, alimentação inadequada e história familiar, entre outros.

Ainda assim, a conclusão da equipe de pesquisadores é de que as desvantagens gerais da remoção dos ovários superam as vantagens em mulheres na pré-menopausa, enquanto para as pós-menopáusicas, os dados não indicam um claro benefício. Para Gottschau e colegas, a expectativa é de que o estudo faça parte de um conjunto de investigações na área que contribuam para uma avaliação geral dos benefícios e riscos desse tipo de procedimento.

*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza