Até 400 anos atrás, parecia não haver dúvidas de que mente e cérebro eram engrenagens da mesma máquina. Com o "século das luzes", porém, o conceito foi jogado fora: a filosofia setecentista não dava espaço para uma interpretação que poderia soar mística. Mas, agora, a neurociência reabilita a ideia de que um não existe sem o outro.
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Segundo os pesquisadores, da Universidade de Washington, em St. Louis, o estudo ajuda a explicar alguns fenômenos ainda sem resposta. Por exemplo, por que pessoas que se dedicam regulamentarmente a atividades físicas costumam ser mais otimistas; o que faz os ansiosos andarem de um lado para o outro; e por que o estímulo de um nervo específico, que regula a digestão, pode melhorar sintomas depressivos.
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"As pessoas que meditam dizem que, ao acalmar seu corpo com, digamos, exercícios respiratórios, você também acalma sua mente", afirmou, em um comunicado, o primeiro autor, Evan M. Gordon, PhD, professor de radiologia.
"Esse tipo de prática pode ser muito útil para pessoas com ansiedade, por exemplo, mas até agora não há muitas evidências científicas de como isso funciona. Encontramos uma conexão. Encontramos o lugar onde a parte da mente altamente ativa e voltada para objetivos se conecta às partes do cérebro que controlam a respiração e a frequência cardíaca. Se você acalmar um, isso deve ter efeitos de feedback no outro."
As conclusões do estudo não têm relação com a intenção inicial da equipe de Gordon e de Nico Dosenbach, professor de neurologia na universidade. O que eles pretendiam verificar era a validade de uma teoria da década de 1930 proposta pelo neurocirurgião norte-americano Wilder Penfield. O médico tentava descobrir a cura para a epilepsia e, durante os experimentos, aplicava descargas elétricas leves em pacientes submetidos a cirurgias cerebrais, observando a resposta.
Foi Penfield quem descobriu que o estímulo de uma pequena faixa de cada metade do cérebro provoca espasmos em determinadas partes do corpo. Além disso, verificou que áreas de controle do órgão estão dispostas na mesma ordem das partes do corpo que dirigem, com os dedos dos pés em uma extremidade de cada faixa e o rosto na outra. Ele criou um diagrama para ilustrar a teoria, apelidado de homúnculo (homenzinho), um clássico nos livros de medicina.
Na época, o médico, um dos pioneiros na área da neurociência, não tinha os recursos que, hoje, são acessíveis aos pesquisadores, como a máquina de ressonância magnética funcional (fMRI, sigla em inglês). O equipamento detalha, precisamente, a imagem e as reações fisiológicas do órgão e, por isso, é um dos apetrechos mais utilizados nesse campo científico. Gordon e Dosenbach utilizaram a fMRI para replicar o trabalho de Penfield. Para isso, contaram com sete voluntários que se submeteram à técnica durante horas, seja em repouso ou na execução de tarefas.
Mapas detalhados
O robusto conjunto de imagens resultou em mapas cerebrais de cada participante. Depois, com três bancos de dados que, juntos, contêm a varredura do cérebro de 50 mil pessoas, os cientistas validaram o resultado. Foi, então, que viram que o diagrama de Penfield estava equivocado. Na área motora, encontraram três regiões que não pareciam ter relação com o movimento.
Por outro lado, partes do órgão sem relação com atividades motoras aparentemente estão fortemente conectadas entre elas e a regiões associadas a pensamento, planejamento, excitação mental, dor e controle de órgãos internos, além de funções como pressão sanguínea e frequência cardíaca.
Outros experimentos com imagens mostraram que, embora as áreas sem movimento não se tornassem ativas quando as pessoas se mexiam, elas "acordavam" quando o voluntário pensava em se mover. "Todas essas conexões fazem sentido se você pensar sobre para o que o cérebro realmente serve", disse Dosenbach.
Segundo ele, a função primordial do órgão é se comportar com sucesso no ambiente, garantindo que o indivíduo atinja seus objetivos sem riscos. "Você move seu corpo por uma razão. Claro, as áreas motoras devem estar conectadas à função executiva e ao controle dos processos corporais básicos, como pressão sanguínea e dor. A dor é o feedback mais poderoso, certo? Você faz alguma coisa e dói, e você pensa: 'Não vou fazer isso de novo.'"
Dosenbach e Gordon chamaram o circuito recém-identificado de Rede de Ação Somato (corpo)-Cognitiva (mente), ou Scan. Para entender como ela se desenvolveu e evoluiu, os pesquisadores examinaram o cérebro de um recém-nascido, o de um bebê de 1 ano e o de uma criança de 9.
Eles também analisaram dados previamente coletados em nove macacos. A Scan não foi detectável no recém-nascido, mas se mostrou claramente evidente na criança de 1 ano e quase como se comportaria em um adulto na de 9
Já os animais tinham um sistema menor e mais rudimentar, sem as extensas conexões vistas nos humanos. "Isso pode ter começado como um sistema mais simples para integrar o movimento com a fisiologia para que não desmaiássemos, por exemplo, quando nos levantamos", disse Gordon. "Mas à medida que evoluímos para organismos que pensam e planejam muito mais complexo, o sistema foi atualizado para conectar muitos elementos cognitivos mais complexos."