É muito comum que algumas pessoas diagnosticadas com transtorno do espectro autista (TEA), principalmente as crianças, tapem os ouvidos, se escondam ou tenham medo de determinados sons e objetos. O comportamento é típico da chamada hipersensibilidade auditiva, distúrbio do processamento sensorial, que deixa o cérebro com dificuldade para compreender, filtrar e reagir a certos estímulos. Alguns estudos relatam que cerca de 56% a 80% dos pacientes com TEA apresentam algum tipo de hipersensibilidade. No caso do som, quem tem essa disfunção percebe os ruídos de forma mais aguçada e até mesmo intolerável.
Para minimizar o incômodo, três shoppings de BH vêm desenvolvendo um gesto especial: BH Shopping, DiamondMall e Pátio Savassi emprestam abafadores de ruído para pessoas com o transtorno do espectro autista afetadas pela variedade de sons muito comuns nesses ambientes. Com isso, além de tornar a visita mais agradável, colocam em prática a importância de incluir e agregar a diversidade de público que ocupa esses espaços.
Para usufruir do benefício, o responsável pela pessoa com TEA ou o próprio paciente com hipersensibilidade auditiva, pode, assim que chegar ao DiamondMall ou Pátio Savassi, ir ao Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) e solicitar o empréstimo gratuito do acessório. Clientes do BH Shopping retiram o equipamento no Espaço Família, localizado no Piso Mariana. Não há limite de tempo para uso do aparelho, que pode permanecer com o usuário enquanto ele estiver nos malls. A devolução também é feita nos mesmos locais de retirada. "É uma atitude simples, mas faz uma grande diferença na vida de quem tem TEA e apresenta a hipersensibilidade auditiva", destaca a diretora regional da Multiplan, Lívia Paolucci. Os três shoppings oferecem ainda vagas de estacionamento exclusivas para clientes com o espectro.
Autismo
O psicólogo Gustavo de Val Barreto, doutor em neurociências e professor do Uni-BH, afirma que a hipersensibilidade ao som é apenas um dos traços de um amplo espectro repleto de nuances como o autismo. "Não é uma característica de todas as pessoas com o diagnóstico, mas é um traço relativamente comum entre os indivíduos com TEA, que tendem a apresentar não só hipersensibilidade auditiva como também sensorial e tátil. Muitos, às vezes, têm sensibilidade a com certo tipo de tecido, além de hipersensibilidade alimentar", cita.
Ainda segundo o especialista, a sensibilidade a ruídos pode ser reduzida, por meio de algum nível de controle, que inclua estratégias para lidar melhor com situações mais ruidosas, entre elas o uso de abafadores aderidos pelos shoppings. "Entretanto, não há estudos que possibilitam eliminá-la", diz.
O professor também pontua que os critérios diagnósticos vêm mudando com o passar dos anos. Atualmente, dois principais sintomas que podem ser considerados como importantes na detecção do transtorno do espectro autista são a dificuldade na comunicação e interação com outras pessoas e a presença de estereotipias, comportamentos motores ou verbais repetitivos, feitos da mesma maneira e em várias ocasiões. "Elas podem estar presentes tanto em crianças quanto em adultos, mas são mais comuns e melhor estudadas em crianças. Algumas, por exemplo, incluem sacudir as pernas, bater as mãos e pés, e balançar o corpo", explica.
O mais importante, conforme destaca Gustavo, é não protelar o diagnóstico, já que quanto mais precoce, melhores são as condições para uma boa qualidade de vida do paciente. "A descoberta tardia pode trazer muitas implicações não só para a pessoa com TEA, mas também para a família. Isso porque o indivíduo tem mais chances de comprometer suas habilidades sociais e atividades diárias. Isso sem falar que a descoberta tardia aumenta as chances de transtornos psiquiátricos que seriam evitáveis."
Colega de Gustavo de Val Barreto no Uni-BH, Luana Teixeira, psicóloga e professora do curso de psicologia, acrescenta que, uma vez confirmada a condição, o tratamento vai demandar profissionais multidisciplinares, justamente porque os comprometimentos do espectro são de diversos níveis. "É preciso, por exemplo, um fonoaudiólogo para trabalhar as questões linguísticas. Já o terapeuta ocupacional investiga os aspectos sensoriais, enquanto o neurologista ou psiquiatra trata do desenvolvimento neurológico/comportamental. Questões familiares, por sua vez, demandam o trabalho de um psicólogo. Vale destacar, porém, que nem todo indivíduo diagnosticado vai precisar de todos esses tratamentos. As intervenções devem ser adaptadas às necessidades de cada paciente."
Luana acrescenta uma dica crucial. O primeiro passo para os pais de uma criança com sinais característicos do TEA é procurar um profissional capacitado e de confiança que consiga fazer uma avaliação adequada. "O UniBH oferece avaliação psicológica gratuita a toda população. O atendimento, disponível para todas as faixas etárias, é conduzido por estudantes do curso de psicologia e supervisionado por professores. Esse é um caminho para confirmar o diagnóstico do TEA", reforça. Os interessados devem preencher este link, e aguardar o contato dos profissionais, realizado de acordo com a ordem de inscrição. A avaliação será realizada presencialmente na clínica do Uni-BH, na Avenida Professor Mário Werneck, 1685 - Buritis.