Os primeiros casos de tuberculose extensivamente resistente (como se chama o tipo da doença que não responde ao tratamento com medicamentos específicos) foram obervados no Brasil. A constatação é de pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz (IAL), em estudo conjunto com o Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP). A variação da patologia torna o o enfrentamento mais complexo e com propensão a manifestações graves. As informações são divulgadas pelo ICB através do Jornal da USP.



O Brasil é o país das Américas onde há a maior incidência da doença - dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) dão conta de mais de 100 mil casos em 2021. A tuberculose extensivamente resistente define-se como uma forma de tuberculose multirresistente - para essa última designação, o Brasil figura na na penúltima posição no ranking de seu continente em relação ao índice de casos.

Segundo a publicação da USP, o projeto de pesquisa, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), ainda em fases iniciais, tem como objetivo estudar as características fenotípicas e genéticas da Mycobacterium tuberculosis - bactéria causadora da tuberculose - que apontem resistências do microrganismo a medicamentos. Em colaboração com o Centro de Vigilância Epidemiológica de São Paulo (CVE), da Secretaria de Saúde do Estado, o grupo visa a elaboração de um modelo de laudo detalhado que auxilie os médicos no tratamento mais eficiente e adequado a cada paciente.

A tuberculose é uma doença acentuada pela desigualdade social. No Brasil, é mais recorrente em determinados perfis, como na população privada de liberdade, população em situação de rua, pessoas que vivem com HIV e indígenas, além de indivíduos com restrições a certos medicamentos. A limitação da venda dos remédios em farmácias, com fornecimento mediante indicação médica, é uma garantia de segurança para que as substâncias não sejam utilizadas de forma inadequada. Um desafio para o tratamento eficaz é justamente o abandono do processo, que decorre geralmente por seis meses após o diagnóstico - muitos pacientes, se sentindo melhor depois de algumas semanas, param de tomar as medicações.




Conforme o material exposto no Jornal da USP, a resistência aos novos medicamentos foi detectada no Laboratório de Referência para Tuberculose do Instituto Adolfo Lutz pelos métodos tradicionais e pela detecção das mutações no genoma da bactéria, realizada no Laboratório de Pesquisa Aplicada a Micobactérias do ICB, coordenado pela professora Ana Marcia de Sá Guimarães, do Departamento de Microbiologia. A análise genética permite um mapeamento mais rápido e detalhado do microrganismo, em comparação com a análise tradicional, em que os bacilos têm sua reação a cada fármaco testada individualmente.

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O tratamento dessa classe da tuberculose é mais longo e chega a 18 meses. É recomendado quando, além da resistência à rifampicina e isoniazida, antibióticos usados no tratamento oferecido pelo SUS há décadas, é observada resistência a qualquer fluorquinolona (antibiótico de amplo espectro indicado para o tratamento de diversos tipos de infecções) e pelo menos um dos medicamentos recém-introduzidos no Brasil, como, por exemplo, a bedaquilina, fármaco recomendado para tratar a tuberculose multirresistente.

Até então, de acordo com a publicação, haviam sido detectados apenas casos de bactérias multirresistentes - em baixa frequência -, que acontece quando há resistência a dois desses fármacos utilizados pelo SUS (rifampicina e isoniazida). "A detecção da resistência aos novos medicamentos, como a bedaquilina e delamanida, que foram aprovados para uso no Brasil nos últimos cinco anos, reforça a necessidade de um esforço constante para o monitoramento do surgimento desses casos, como também a busca de novos medicamentos", aponta Ana Marcia de Sá Guimarães.



Os microrganismos, que naturalmente desenvolvem alterações genéticas que os tornam resistentes à ação do fármaco em questão, são selecionados quando são expostos a um medicamento de forma inadequada. Considerando essas situações, buscam-se alternativas de outros medicamentos que possam substituir aqueles que não serão eficazes para curar a tuberculose. Mais do que a imunização para o gerenciamento da doença, que protege somente contra a tuberculose infantil, o tratamento realizado pelo SUS consiste no uso de antibióticos variados, o que diminui a chance de seleção das bactérias resistentes e alcança altas taxas de cura quando realizado de maneira completa.

"O novo tipo de exame consistirá na análise das mutações relacionadas aos antibióticos disponíveis para o tratamento da tuberculose, gerando um documento que indicará ao médico formas de personalizar o tratamento com base no que ele tiver à disposição para aquele paciente", explica a professora Erica Chimara, diretora técnica do Núcleo de Tuberculose e Micobacterioses do Instituto Adolfo Lutz e uma das pesquisadoras do estudo. "Temos cerca de 13 antibióticos disponíveis. Quanto melhor o médico conhecer o perfil de resistência de cada um, mais preciso será o tratamento do paciente", atesta.

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