Três anos atrás, os primeiros pacientes a desenvolver COVID longa começaram a relatar sintomas debilitantes. Uma pesquisa recente sugere que 14% das pessoas com COVID longa perderam seus empregos desde então.
Antes da pandemia, Marcus Whitehead tinha uma carreira exigente e prazerosa no setor de serviços financeiros em Londres. Mas, depois de pegar coronavírus em 2020, ele ficou doente demais para trabalhar.
Três anos depois, embora esteja fisicamente muito melhor, a confusão mental provocada pela COVID longa impede que o britânico de 55 anos volte ao trabalho.
Marcus, que mora em Harpenden, no interior da Inglaterra, diz ter um "sentimento de perda" por ter que se aposentar mais cedo e perder sua agilidade mental. "Eu não sou mais quem eu era", diz ele.
'Como ser injetado com tranquilizante de cavalo'
Marcus teve os primeiros sintomas da covid-19 em abril de 2020.
"Foi um caso típico — febre, tosse — um pouco como uma gripe. Não foi tão ruim e consegui trabalhar um pouco", diz ele.
Mas, alguns dias depois, a doença o atingiu "como uma tonelada de tijolos" e ele sentiu "uma fadiga esmagadora e paralisante, como se tivesse sido injetado com tranquilizante para cavalos".
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Marcus também sofreu dores fortes em órgãos do corpo e dores de cabeça intensas, passando os três meses seguintes na cama.
"Fiquei outros 12 meses no sofá. Por 18 meses, eu não dirigi e tive que usar uma bengala. E desde então não consigo trabalhar."
Marcus era sócio-gerente da firma Barnett Waddingham, em que gerenciava uma equipe de mil pessoas.
Ele diz que trabahar com estratégias dos clientes e gerenciar funcionários era como equilibrar "pratos giratórios".
"Eu fazia malabarismos com dezenas de pratos por dia e, depois da COVID, me transformei nessa pessoa que mal conseguia segurar um único prato, muito menos girar dezenas deles."
Em 2022, ele tentou se reintegrar ao trabalho com apoio da empresa.
"Consegui trabalhar por dois dias, mas voltei a ficar de cama, após uma grande recaída."
"Foi arrasador, quando eu estava tão perto de voltar ao trabalho. A primeira vez que coloquei meu cérebro sob qualquer tipo de pressão, ele simplesmente desistiu de mim novamente."
Por fim, ficou claro que Marcus teria de deixar seu emprego e se aposentar uma década antes do planejado.
"Eu tenho muita sorte de ter recuperado muito de minha saúde. Mas foi uma mudança bastante dramática em relação ao que eu esperava que seria a década antes dos meus sessenta e poucos anos", diz ele.
O custo pessoal para Marcus também foi sentido por outros trabalhadores e pela economia. Uma pesquisa em março com 3 mil pessoas que disseram ter sofrido com covid longa descobriu que 14% delas haviam perdido o emprego por motivos relacionados à doença.
Dos dois milhões de pessoas no Reino Unido que relatam ter COVID longa, 20% sentem-se significativamente limitados em sua capacidade de realizar atividades cotidianas, de acordo com o Escritório de Estatísticas Nacionais, o órgão britânico de estatísticas.
Claire Hastie é fundadora da instituição de caridade Long Covid Support, que possui mais de 60 mil membros online. Ela formou a entidade depois de não consegir encontrar informações ou ajuda quando tentava se recuperar do vírus.
"Um grande número de pessoas não consegue mais trabalhar, ou retomar sua capacidade anterior, tendo que reduzir suas horas e assumir cargos menos importantes", diz ela.
Claire acredita que a história de Marcus mostra que é urgente haver mais pesquisas sobre covid longa.
“Em um momento de escassez de mão de obra e habilidades, o impacto da covid longa na economia é significativo”, diz ela.
Além daqueles que pararam de trabalhar, “outros lutam para manter seus empregos, mas com um custo enorme para sua saúde e capacidade de fazer qualquer outra coisa”, acrescenta.
E o problema não se limita apenas àqueles com covid longa, mas também às suas famílias. A esposa de Marcus, Sue, também decidiu parar de trabalhar por um tempo para ajudá-lo a se recuperar.
"Percebi que a saúde de Marcus era melhor nos fins de semana, quando estávamos fazendo coisas juntos e eu não trabalhava dez horas por dia, deixando-o por conta própria."
Ela acredita que se demitir de seu emprego como diretora de uma organização foi essencial para a recuperação de Marcus.
Embora Marcus ainda lute contra o sintoma de nevoeiro mental, sua saúde melhorou recentemente.
O casal teve que buscar soluções por conta própria, vasculhando as redes sociais em busca de conselhos, já que "a profissão médica não tinha cura e ainda não tem" para a doença.
Eles contam que tentaram de tudo para melhorar sua condição. "Eu me sentia como uma cobaia. Às vezes eu implorava para Sue não achar outra tentativa de solução", diz ele.
Ele passou um tempo em uma câmara hiperbárica de oxigênio, mudou sua dieta e tomou todos os tipos de pílulas e suplementos — "recorrendo até mesmo à compra de medicamentos de Bangladesh".
Sue também mudou a dieta do marido, se livrando de alimentos ultraprocessados.
Mas a verdadeira mudança ocorreu no início deste ano, por meio de um programa chamado Lightning Process, que tem sido usado para tratar pessoas com síndrome de fadiga crônica.
O programa concentra-se nas interações entre o cérebro e o corpo.
"A reviravolta foi realmente dramática", diz Marcus. "Eu já estava em uma boa curva de cura, mas isso deu um novo impulso."
"Não há provas médicas e científicas — é apenas minha experiência pessoal — mas tentei muitas coisas que não funcionaram. Agora me sinto fisicamente muito melhor."
Sue diz que o casal agora está viajando e visitando amigos, depois de observar que Marcus se sente melhor.
Um porta-voz do Departamento de Saúde e Assistência Social disse que o Reino Unido está investindo 50 milhões de libras (mais de R$ 600 milhões) para entender melhor os efeitos a longo prazo do coronavírus.