A prática esportiva segue, e muito, as características regionais de onde é realizada. A partir do momento em que um esporte nasce em uma região e é difundido para outros locais, algumas questões influenciam para que tenha sucesso, desde aspectos financeiros e a infraestrutura que vai receber a atividade, até formas de marketing e divulgação ou a relação com outras modalidades que eventualmente se destaquem mais em cada região. Isso acontece, por exemplo, com as lutas que saíram de outros países para chegar ao Brasil, ou com a capoeira, "produto" nacional para exportação. É o que observa o professor de educação física e fisioterapeuta Elliot Paes.





"E o kickboxing não chegou por aqui de outra forma. Claro que quem tem o esporte mais perto está mais propenso a praticar. Isso tudo considerando que esportes diferentes preveem demandas diferentes em relação às capacidades físicas e funções musculares exigidas para a prática, partindo dos níveis iniciais até os mais elevados", aponta Elliot.
 
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Ele ressalta que os grandes benefícios também têm a ver com a preparação para participar da modalidade. É o que se chama uma fundação, ou base atlética, explica. "É o que todos que participam de uma forma mais direcionada ou organizada de um esporte deveriam ter. Principalmente já a partir da escola. Para qualquer modalidade, dar uma boa estrutura àquela criança que está em maturação, em crescimento, para ingressar de forma mais eficiente naquela atividade é fundamental", pontua Elliot, lembrando que o kickboxing é um esporte que não está isento da ocorrência de lesões. "O praticante deve estar preparado para, a todo momento, ter condições de exercer com eficiência as qualidades físicas exigidas", acrescenta.

Thiago Michel Pereira da Silva, de 39 anos, recebeu do pai a paixão pelo kickboxing. É filho  de Ely Pereira e Silva, referência no esporte. Todos os dias, quando Ely saía de casa para ir à academia, quando ainda dava aulas de taekwondo, o garoto ia junto. Entre idas e vindas, o começo de tudo. Aos seis anos, ele pediu para entrar nas aulas, primeiramente de taekwondo. Aos 8, passou a praticar também o kickboxing - de forma exclusiva a partir dos 12. "Nunca perdi a identidade do taekwondo. É minha base para o kickboxing", diz. E não parou mais, ele que, aos 16 anos, já era faixa preta, agora faixa preta 3º dan.



Por 24 anos, Thiago participou de competições nacionais e internacionais, sempre se inspirando no pai Ely

(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Títulos

Dos 8 aos 32, a rotina era participar de competições em Minas (BH), em outros estados brasileiros e fora do país. Thiago já disputou mais de 190 lutas e, com o kickboxing, esteve no Chile, Paraguai, Espanha, Rússia e Estados Unidos. Entre muitos títulos, ele foi por quatro vezes campeão da Copa do Mundo de Kickboxing Wako e também esteve nos três mais importantes eventos do esporte mundial: o WGP, maior evento de kickboxing da América Latina, quando foi campeão e conquistou o cinturão; no Glory, maior evento de lutas em pé do mundo, em que fez uma luta e também foi campeão; e o Bellator, grande evento de MMA, com três lutas.

Para Thiago, o kickboxing é uma oportunidade de criar novos vínculos, construir amizades e conhecer países. Quando o foco é a saúde, ele destaca os ganhos no bem-estar mental e emocional, a tranquilidade alcançada, o combate ao estresse, a chance de extravasar. Sob a ótica de professor (dá aulas desde os 16 anos),  Thiago ressalta a importância do praticante procurar um profissional qualificado, de preferência filiado a alguma entidade que organiza o esporte. "Para mim, o melhor é poder viver tudo isso do lado do meu mestre, que é meu pai. Mais que títulos, é poder estar com ele, que me abriu tantos caminhos", diz.

O atleta e professor de kickboxing Rafael Spin Araújo, de 31 anos, sempre gostou de lutas - não fica tímido em dizer que, inclusive, tinha um temperamento briguento na infância. Aos 16 anos, pediu à mãe para lhe colocar em uma aula de luta, e o primeiro contato foi mesmo com o kickboxing, em uma academia perto de sua casa, em BH. O professor, João Guedes, que fazia parte da equipe de Ely Pereira, logo percebeu seu potencial e, já com três meses de prática, sugeriu a inscrição no campeonato mineiro. Foram nove lutas. Rafael ganhou todas e foi campeão. Ely e Thiago, depois de assistir ao embate, fizeram o convite para que ingressasse na equipe. Com o título mineiro, a classificação para a competição nacional é automática. Em sua primeira participação, em 2009, Rafael, então com 17 anos, não ganhou, mas essa história mudou e se tornou sinônimo de vitória.



Elliot Paes, fisioterapeuta e educador físico: 'Praticante deve estar preparado'

(foto: Arquivo pessoal )

Invicto

 Aos 18, repetiu todo o processo de competições, em níveis regional, nacional e internacional, e venceu tudo o que disputou. Em 2010, foi campeão mineiro, brasileiro, da Copa do Brasil e do Pan Americano. Não parou mais. Hoje, faixa preta 2º dan, é dono de muitos troféus. Fora do Brasil, ganhou competições na Sérvia, Hungria, Croácia, Chile, e México. Foi campeão mundial em 2014, vice-campeão mundial em 2017, campeão da Europa neste ano, conquistou o Pan Americano quatro vezes consecutivas e o Sulamericano três vezes consecutivas.  Está invicto no Brasil há 10 anos e em 2017 foi considerado o melhor atleta do mundo em sua categoria. No ranking brasileiro, é o primeiro desde 2010, é o quinto colocado do planeta em uma categoria e 13º do mundo em outra.

Rafael diz que uma das coisas que gosta no esporte é a variabilidade que a técnica permite - é possível aplicá-la de diferentes formas, imprimindo a própria personalidade dentro do que a regra permite. "Com minha vivência no esporte, posso incentivar as pessoas a construírem a própria história de forma mais leve, menos agressiva. Muita gente tem preconceito quando se fala de luta, mas depende da forma como é trabalhada. Também me agrada poder dar aulas. O kickboxing me cativa, me encontrei na luta", relata.

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