A man undergoes a rapid VIH test during the Gay Pride Parade in Santiago on June 23, 2018.   The initiative aims to encourage prevention, as there is concern about the alarming increase of new HIV infections (Acquired Immunodeficiency Virus) in the country. / AFP / CLAUDIO REYES

A man undergoes a rapid VIH test during the Gay Pride Parade in Santiago on June 23, 2018. The initiative aims to encourage prevention, as there is concern about the alarming increase of new HIV infections (Acquired Immunodeficiency Virus) in the country. / AFP / CLAUDIO REYES

(CLAUDIO REYES)

Mais uma pessoa teve remissão do HIV após ser submetida a um transplante de medula. O chamado paciente de Genebra mostra sinais de remissão do vírus a longo prazo e é o sexto relato do tipo. Desta vez, porém, a cura funcional se deu por um outro método. A medula óssea que ele recebeu não tinha uma mutação conhecida por bloquear a entrada do vírus nas células humanas. Esse resultado, avaliam especialistas, abre novas possibilidades de pesquisa e futuras intervenções médicas.

O caso foi apresentado nesta quinta-feira (20/07), em Brisbane, na Austrália, antes da Conferência da Sociedade Internacional da Aids, que terá início no próximo domingo. Até então, todos os pacientes funcionalmente curados tinham uma situação em comum: foram acometidos por leucemia, uma forma de câncer, e se beneficiaram de um transplante de células-tronco de doadores com uma rara mutação, do gene CCR5 delta 32, que impede a entrada do HIV nas células.

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Com o paciente de Genebra, a situação é diferente. Ele vive com HIV desde o início da década de 1990 e sempre fez tratamento antirretroviral. Em 2018, para tratar uma forma de leucemia especialmente agressiva, foi submetido a um transplante de células-tronco. Porém, o procedimento veio de um doador que não portava a famosa mutação CCR5. Um mês após o transplante, suas células sanguíneas haviam sido completamente substituídas por células do doador, e houve uma grande diminuição de células portadoras do HIV.

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Vinte meses depois de ter interrompido o tratamento antirretroviral, o HIV continua indetectável em seu corpo. O paciente é acompanhado pelos Hospitais Universitários de Genebra, em colaboração com o Instituto Pasteur, o Instituto Cochin e o consórcio internacional IciStem. O paciente de Genebra, que não teve a identidade revelada, declarou que o que está acontecendo em sua vida "é magnífico, mágico". "Estamos olhando para o futuro", completou.

Promissor

As equipes científicas não descartam que o vírus persista nele, mas consideram que se trata de uma nova remissão da infecção pelo HIV. Dois casos anteriores, conhecidos como os pacientes de Boston, também receberam células-tronco sem a mutação CCR5 nos transplantes de medula. Porém, em ambos os casos, o HIV retornou alguns meses depois que o tratamento com antirretrovirais foi interrompido.

Asier Saez-Cirion, do Instituto Pasteur, da França, explica que, quando não há sinais do vírus depois de 12 meses, "a probabilidade de que ele seja indetectável no futuro aumenta significativamente". Segundo o cientista, que apresentou o caso do paciente de Genebra em Brisbane, há algumas possíveis explicações para a nova cura funcional. "Nesse caso específico, talvez, o transplante eliminou todas as células infectadas sem necessidade da famosa mutação. Ou, talvez, o tratamento imunossupressor, solicitado depois do transplante, teve um papel", afirma.

Para Sharon Lewin, presidente da Sociedade Internacional de Aids, o novo caso é "promissor". "Porém, aprendemos com os pacientes de Boston que apenas uma partícula do vírus pode provocar um rebote do HIV", pondera. Segundo ela, esse homem, em particular, deverá ser monitorado rigorosamente durante os próximos meses e até anos.

Obstáculos

Werciley Júnior, infectologista e chefe da Comissão de Controle de Infecção do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, explica que, em um transplante de medula, o sistema imunológico do paciente é destruído, assim como os chamados santuários do vírus. "Destruir essas reservas de vírus é o que permite que não haja mais o HIV. Ou seja, você elimina totalmente os vírus e a sua possibilidade de tê-los escondido em algum lugar no corpo."

Apesar de os casos de remissão a longo prazo gerarem esperanças para uma possível cura para infecção pelo HIV, o transplante de medula óssea não é uma opção para as milhões de pessoas que vivem com o vírus. O procedimento é considerado agressivo e arriscado pela comunidade de saúde.

"Para receber um transplante de medula óssea, o paciente precisa ser submetido a medicações que acabam com a medula dele. É um tratamento arriscado. Isso não pode ficar sendo repetido nos nossos pacientes soropositivos. Acabar com a medula óssea significa que ele pode adquirir outras infecções", explica Eliana Bicudo, infectologista da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal.

Saez-Cirion afirma que, embora o protocolo não seja transponível em larga escala devido a sua agressividade, "esse novo caso traz elementos inesperados sobre mecanismos de eliminação e controle dos reservatórios virais que serão importantes para o desenvolvimento de tratamentos curativos para o HIV." Ainda segundo o cientista, os resultados obtidos também motivam os cientistas a continuarem estudando as células imunes inatas, que atuam na linha de frente da defesa contra vários patógenos.

Palavra de especialista: Um caminho de tratamento

 "Infelizmente, não temos medula nem mesmo para quem precisa de transplante por conta de outras doenças. Então, essa não poderá ser uma terapêutica para qualquer paciente, considerando a quantidade de pessoas hoje que são portadoras do vírus HIV. No entanto, as medicações que ele usou, ou que ele usa, para diminuir a rejeição da nova medula podem ser um caminho para o desenvolvimento de tratamentos e fazer com que chegue a um período de remissão, já que a gente não considera que esse paciente esteja totalmente curado. Ele precisa de observação."

Eliana Bicudo, infectologista da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal