A tecnologia revoluciona a medicina com velocidade nunca antes vista. Procedimentos minimamente invasivos, visão dos órgãos em 3D por meio de microcâmeras que projetam imagens na tela, intervenções cirúrgicas com assistência de robôs e, mais recentemente, a experiência em lidar com o chatbot, que é movido a inteligência artificial (IA). O chatGPT, que se imaginava, seria ferramenta para acelerar a gestão na área da saúde com seus prontuários e formulários, agilizar processos, cortar burocracia, já atua na medicina diagnóstica, por exemplo, ao acelerar resultados e garantir precisão na interpretação de imagens. Onde tudo isso vai parar? Terá limite? Os benefícios e ganhos sobrepõem os riscos e perigos do uso cada vez maior de tanta tecnologia?

Simplificando, pode-se dizer que a IA é a capacidade das máquinas de pensarem como seres humanos,  aprender, perceber e decidir. Salto tecnológico que permite que sistemas simulem uma inteligência similar à humana. O que é incrível e assustador ao mesmo tempo diante do uso, da responsabilidade, dos resultados e consequências. Existe controle? Há ameaça às pessoas? Com saúde não se brinca. É sabido que se faz experiência (experimentos, afinal são ciência), mas será aceitável ficar nas mãos de algoritmos? Filmes com a temática da IA sempre despertaram curiosidade, inquietação, aplausos e perplexidade. Obras como “2001, uma odisseia no espaço”, “Blade runner”, “Matrix”, “AI: inteligência artificial” e “Her”, ao mostrarem um futuro, para muitos inquietantes e sempre longínquo.



Na verdade, já há muito dessas ficções na vida real da sociedade do século 21, ano 2023. Na série de TV “Chicago med”, drama da NBC que se passa na emergência de um hospital, no fim da 8ª temporada, o dr. Will Halstead sabota a tecnologia OR 2.0, uma unidade de cirurgia avançada de IA, durante o reparo de uma hérnia. Ele toma essa atitude depois que um colega, dr. Crockett Marcel, lida com a morte de um paciente em que fazia uma cirurgia com o auxílio do OR 2.0. No fim, Marcel descobre que não foi sua culpa, imperícia médica, mas sim o mau funcionamento da ferramenta durante o procedimento, que é obrigado a usar pela gestão do hospital. Claro, ficção, mas que levanta questões diante de uma cena bem próxima do que apresenta a vida real.

Na vida de Mauro Estevam, de 65 anos, paulista de Itapetininga, mas morando em BH, a tecnologia foi salvadora. Formado em administração de empresa e atuando como gerente comercial, ele conta que, diagnosticado com câncer de próstata em maio de 2018, foi descobrir os avanços das técnicas inovadoras na medicina: “Ao receber o diagnóstico, perdi o chão. No primeiro momento, assusta, e meu estágio já era caso cirúrgico. Então, conversando com médicos e fazendo pesquisa, me deparei com a cirurgia robótica e tive de tomar uma decisão”.
 
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Para Mauro, apesar da situação delicada, a escolha foi segura: “A decisão pela cirurgia robótica comparado às convencionais, como videolaparoscopia ou aberta, foi a melhor depois de analisar as vantagens e desvantagens. Na robótica, tive a precisão cirúrgica, ela é minimamente invasiva, tempo menor de internação e menor sangramento. Sem falar da visão em 3D e imagem ampliada tridimensionalmente, o que me passou ainda mais segurança. Esses fatores me convenceram a optar pela cirurgia robótica”.





Mauro conta que foi operado numa quinta-feira, e no sábado estava em casa: “Sem dor e andando normalmente. Uma semana depois estava na minha rotina normal. Agora, já se passaram cinco anos desde a cirurgia, hoje estou curado totalmente e tenho uma vida absolutamente normal. A tecnologia na medicina é um caminho sem volta, cada dia atua em outras áreas, e é um ganho para médicos e pacientes”.

Mauro Estevam se beneficiou da robótica para tratar um câncer em 2018

(foto: Jair Amaral/D.A Press)

Efeitos indesejados

José Roberto Colombo Jr., médico do epicentro de cirurgia robótica em urologia do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, e coordenador executivo da pós-graduação de cirurgia robótica em urologia, afirma que “alguns efeitos indesejados acompanham o desenvolvimento tecnológico atrelado à evolução da área médica. Entre os principais estão o custo de instalação e manutenção dessas tecnologias e a falta de treinamento à classe médica para estar atualizada para a utilização adequada e segura, principalmente nas áreas cirúrgicas. O treinamento aos médicos ainda é escasso e, muitas vezes, de qualidade discutível. Nos últimos anos, os cursos de certificação para a plataforma robótica cresceram rapidamente, aproveitando a inexistência de qualificação de médicos em formação nas residências médicas. Este fato criou um espectro de qualidade desses cursos no qual a grande maioria peca por falta de recursos (simuladores, programas cirúrgicos com volume cirúrgico adequado), falta de estrutura para o ensino prático e pela própria ganância destas supostas 'instituições de ensino'”.
 
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Para o urologista, o tema é interessante e gera discussões, mas o fundamental é que “algumas destas tecnologias têm o objetivo de facilitar o aprendizado do ensino médico, ajudar a tomada de decisões clínicas e padronizar condutas em serviço de atendimento. Mas a inserção de novas tecnologias exige maior atenção à formação da classe médica, que ainda é um sério problema no Brasil. Vale registrar que a maior parte dos tumores de próstata, rim e bexiga podem ser tratados utilizando-se da tecnologia robótica, que em 2023 completará 15 anos desde sua implementação no Brasil”.



André Berger destaca resultados positivos de cirurgias robóticas, que ainda não têm IA acoplada

(foto: Oncoclínicas/Divulgação)


Tecnologia é aliada 

O coordenador nacional de uro-oncologia do Grupo Oncoclínicas, André Berger, explica que “não há cirurgia robótica com inteligência artificial (IA) acoplada, existem apenas casos experimentais”. No entanto, o avanço dessa técnica entrega benefícios a pacientes e médicos: “A cirurgia robótica oferece imagem em alta definição e tridimensional (3D), que magnifica os tecidos em até 15 vezes o tamanho original. Os instrumentos são mais delicados e flexíveis que o próprio punho, com isso é possível fazer movimentos mais exatos e chegar a regiões de difícil acesso. O método reduz a perda sanguínea com uma menor taxa de transfusão de sangue. No câncer de próstata, por exemplo, a cirurgia robótica melhora drasticamente as taxas de preservação de continência e ereção. É uma cirurgia determinante para a cura em casos iniciais, e igualmente decisiva nas fases mais avançadas, podendo eliminar a necessidade de tratamentos adicionais ou mesmo diminuir o intervalo de tempo entre os demais tratamentos oncológicos (quimioterapia, radioterapia). Celeridade é uma prioridade no enfrentamento do câncer”.

Para Colombo Jr., novas tecnologias esbarram no alto custo e na escassez de médicos treinados adequadamente

(foto: Arquivo Pessoal)


O sistema robótico pode ser empregado em alguns tumores do aparelho geniturinário (próstata, rim, suprarrenal e bexiga) e digestivo (esôfago, estômago, intestino delgado, colorretal, fígado, pâncreas, vesícula biliar e baço), ginecológicos (colo uterino, ovário e endométrio), de cabeça e pescoço (tumores de base de língua, tireoide) e pulmonar. “Trata-se de um procedimento meticuloso que demanda cirurgiões capacitados e habilidosos, que passaram por treinamentos específicos. Em cancerologia, o cuidado integral do paciente é fundamental e deve ser conduzido por equipes multidisciplinares. A cirurgia robótica e outras inovações associadas vêm para se integrar à jornada do paciente oncológico”, destaca André Berger.

A inovação e a tecnologia são bem-vindas, como enfatiza André Berger, ao divulgar que o Hospital Vila da Serra (HVS), em Belo Horizonte, o Hospital UMC, em Uberlândia, e o Hospital Santa Izabel (HSI), em Salvador, vão receber um novo equipamento robótico, o Da Vinci: “O HVS receberá o Xi, e os demais a geração X. Asseguramos assim um programa de cirurgia robótica “world-class” voltado para a oncologia robusta em volume clínico, ensino e pesquisa, um dos maiores da América Latina”.

 

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