Você já deve ter percebido que, durante o inverno, sente mais fome - e o apetite parece estar sempre a um passo à frente. Neurocientistas identificaram circuitos cerebrais que fazem os mamíferos quererem comer mais quando são expostos a temperaturas frias. O estudo, publicado no último dia 16 na revista Nature, mostrou descobertas de circuitos cerebrais que podem levar a potenciais terapias que ajudem na saúde metabólica e perda de peso.
"Os pesquisadores identificaram um aglomerado de neurônios que funcionam como um 'interruptor' para esse comportamento de busca de comida relacionado ao frio em camundongos. Sabemos que os mamíferos queimam automaticamente mais energia para manter a temperatura corporal normal quando expostos ao frio. Esse aumento do gasto de energia ativado pelo frio desencadeia um aumento no apetite e na alimentação, mas o mecanismo específico que controla isso até então era desconhecido", diz a endocrinologista, com pós-graduação em Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro (SCMRJ), Deborah Beranger.
Uma das primeiras observações foi que, com o início das temperaturas frias (de 22ºC a 3ºC), os camundongos aumentam sua busca por alimentos apenas após um atraso de cerca de seis horas, sugerindo que essa mudança comportamental não é simplesmente um resultado direto da sensação de frio. "Usando técnicas chamadas de limpeza cerebral total e microscopia de folha de luz, os pesquisadores compararam a atividade dos neurônios em todo o cérebro durante condições frias e quentes. Logo eles fizeram uma observação importante: embora a maior parte da atividade neuronal no cérebro fosse muito menor na condição de frio, porções de uma região chamada tálamo mostraram maior ativação", diz a médica.
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Eventualmente, a equipe se concentrou em um grupo específico de neurônios chamado núcleo xifóide do tálamo da linha média, mostrando que a atividade nesses neurônios aumentou em condições de frio pouco antes de os ratos saírem de seu torpor induzido pelo frio para procurar comida. "Quando menos comida estava disponível no início da condição de frio, o aumento da atividade no núcleo xifóide foi ainda maior - sugerindo que esses neurônios respondem a um déficit de energia induzido pelo frio, em vez do próprio frio", diz o estudo.
Quando os pesquisadores ativaram artificialmente esses neurônios, os camundongos aumentaram sua busca por comida, mas não outras atividades. "Da mesma forma, quando a equipe inibiu a atividade desses neurônios, os camundongos diminuíram sua busca por comida. Esses efeitos apareceram apenas sob a condição de frio, o que implica que as temperaturas frias fornecem um sinal separado que também deve estar presente para que ocorram mudanças no apetite", diz a endocrinologista.
Em um último conjunto de experimentos, a equipe mostrou que esses neurônios do núcleo xifóide se projetam para uma região do cérebro chamada núcleo accumbens - uma área conhecida por seu papel na integração de sinais de recompensa e aversão para orientar o comportamento, incluindo o comportamento alimentar. Os pesquisadores acreditam que os resultados podem ter relevância clínica, pois sugerem a possibilidade de bloquear o aumento habitual do apetite induzido pelo frio, permitindo que regimes de exposição ao frio relativamente simples conduzam à perda de peso com muito mais eficiência.
"Um dos principais objetivos agora é descobrir como dissociar o aumento do apetite do aumento do gasto de energia. Os pesquisadores também buscam descobrir se esse mecanismo de aumento do apetite induzido pelo frio faz parte de um mecanismo mais amplo que o corpo usa para compensar o gasto extra de energia, por exemplo, após o exercício. Com isso, há a possibilidade de criação de medicamentos ou terapias para modular o apetite extra nesses casos", aponta Deborah.
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