Todos os dias, cerca de 800 milhões de pessoas em todo o mundo estão menstruadas. Considerando esse dado, é surpreendente que pouco se saiba sobre o sangue menstrual. A médica Sara Naseri espera mudar isso com uma startup de saúde chamada Qvin. Ela acredita que examinar essa amostra de sangue mensal amplamente ignorada poderia oferecer novas descobertas na área da saúde.
Além de sangue, o líquido menstrual contém secreções vaginais, muco cervical e células endometriais.
O endométrio é uma membrana que reveste o útero e fica mais espessa a cada mês para permitir a implantação do embrião. Se a gravidez não ocorrer, esse revestimento é eliminado pela vagina.
“O sangue é o fluido corporal mais comumente usado para a tomada de decisões médicas”, diz Naseri. "Pensei: 'As mulheres sangram todo mês. Por que ninguém usou esse sangue para fins de saúde?'"
A equipe da Qvin está tentando preencher a lacuna de pesquisa conduzindo uma ampla gama de estudos para avaliar se existem correlações significativas entre o sangue menstrual e o sangue retirado de uma veia ou de uma picada no dedo. Os resultados iniciais foram promissores, mas mais estudos são necessários.
Se paralelos confiáveis puderem ser comprovados, examinar o sangue menstrual poderá se tornar um método viável de monitorar ou diagnosticar uma série de condições de saúde comuns.
Por exemplo, se os marcadores biológicos dos níveis de colesterol ou de açúcar no sangue forem equivalentes, as análises do sangue menstrual podem ser utilizadas como meio mensal de monitoramento de condições cardiovasculares ou diabetes.
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No entanto, o verdadeiro potencial reside em encontrar formas não invasivas de diagnosticar e tratar doenças que afetam o sistema reprodutor feminino. A falta de pesquisas sobre doenças reprodutivas femininas resultou em diagnóstico lentos, relativamente poucas opções de tratamento e exames que são muitas vezes dolorosos e angustiantes para a paciente.
No Reino Unido, apenas 2,1% do financiamento da pesquisa médica vai para condições reprodutivas, apesar de pesquisas mostrarem que 31% das mulheres enfrentam problemas graves com a sua saúde reprodutiva. Menos da metade das pessoas afetadas procura ajuda médica.
Além da falta de pesquisas e de precedentes, tentar examinar o sangue menstrual significa lidar com muita resistência e tabus sociais.
A startup Theblood, com sede em Berlim, lutou para encontrar um parceiro de laboratório que concordasse em analisar amostras de sangue menstrual. “Temos que fazer tudo do zero, desde o início. Os laboratórios examinam amostras de saliva, urina ou fezes, mas não há nada para o sangue menstrual”, diz Miriam Santer, cofundadora da Theblood.
Christine Metz, professora e pesquisadora de endometriose no Feinstein Institutes for Medical Research da Northwell Health em Long Island, Nova York, acredita que o fator nojo é uma grande parte da razão pela qual tem ocorrido tão poucas pesquisas sobre sangue menstrual.
“Quando decidimos coletar material menstrual para estudá-lo, vários médicos nos disseram que não podiam pedir a seus pacientes que fizessem isso”, diz ela. "[Mas quando] fizemos uma chamada nas redes sociais, tivemos 6.000 pessoas em nosso registro. Obviamente, elas superaram o fator nojo."
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Testar o sangue menstrual nunca fez parte da prática clínica da ginecologia. A endometriose é uma das condições ginecológicas mais comuns. É extremamente dolorosa e ocorre quando o tecido que normalmente reveste o útero cresce na parte externa de outros órgãos da cavidade pélvica.
Afeta cerca de 10% das mulheres e meninas. O diagnóstico pode levar até 12 anos e só pode ser confirmado através de cirurgia.
Não existem hoje tratamentos eficazes para a endometriose. As coisas estão melhorando lentamente, em parte graças à conscientização gerada por celebridades. No entanto, atualmente a dor é tratada com hormônios que podem ter efeitos colaterais graves, e mesmo a histerectomia não garante a remoção das lesões de endometriose.
Christine Metz faz parte de uma equipe que pesquisa os efluentes menstruais em um esforço para acelerar o tempo de diagnóstico e desenvolver tratamentos para a endometriose. Conseguir financiamento para estudar o sangue menstrual tem sido difícil. “Ouvi dizer o tempo todo: 'Ah, você deveria trabalhar com câncer. Há muito mais dinheiro.' E é verdade. Simplesmente não há dinheiro disponível para isso. Vale a pena lutar o tempo todo para conseguir um centavo, mas é muito, muito, muito difícil”, diz ela.
Empresas como a Qvin e a Theblood estão pagando seus estudos com financiamento de capital de risco, na esperança de que a forma mais rápida de impulsionar a mudança seja através da demonstração de que os exames de sangue menstrual têm valor como produto de consumo.
No entanto, cada um admite que falar com investidores muitas vezes significa explicar os princípios básicos da menstruação, como o uso de absorventes internos, absorventes higiênicos e coletores menstruais.
Opções de testes domiciliares tornariam os exames para algumas condições muito mais convenientes.
Ashley Draper, uma mulher de 36 anos de Washington (EUA), participou de um estudo da Qvin que visava avaliar se o sangue menstrual poderia ser usado para rastrear o câncer no colo do útero depois de responder a um anúncio do Instagram.
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Por mais de dez anos, resultados anormais de exame de Papanicolau exigiram que Draper fizesse testes para câncer cervical a cada 6 meses. Durante um teste de câncer cervical, o médico usa um espéculo para abrir a vagina e inserir uma pequena escova ou espátula para raspar amostras de células do colo do útero na entrada do útero. Geralmente não se usa anestesia.
“É obviamente um processo muito invasivo”, diz Draper. “Você se sente como um pedaço de carne na mesa. Parece que eles estão usando processos muito arcaicos."
Reduzir o elevado custo dos cuidados de saúde e sentir-se mais no controle dos resultados de saúde também atrai Draper.
“Para mim, será uma vitória geral se isso se tornar um produto, porque reduzirá minha ansiedade e me dará mais controle sobre o que está acontecendo com os exames”.
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