Voluntárias foram acompanhadas até as crianças completarem 5 anos: resultado reforça a importância do suporte profissional

Voluntárias foram acompanhadas até as crianças completarem 5 anos: resultado reforça a importância do suporte profissional

(Creative Commons via Upsplash)


Pesquisadores liderados pela King's College London, na Inglaterra, encontraram uma ligação entre o tratamento com medicamentos para a depressão pós-parto e melhorias no comportamento das crianças até cinco anos depois do nascimento. Entre os benefícios observados, estão a redução de dificuldades comportamentais infantis, como problemas de conduta e comportamento antissocial, e de sintomas de transtorno do deficit de atenção com hiperatividade (TDAH).

Para chegar às conclusões, a equipe avaliou informações de mães diagnosticadas com depressão pós-parto e o crescimento de seus filhos, considerando o uso dos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), uma classe de antidepressivo. Os pesquisadores utilizaram informações de mais de 8 mil gestantes e bebês, e o resultado da investigação foi publicado na edição desta terça-feira(29/08) da revista Jama Network Open.

A Organização Mundial da Saúde estima que de 15% a 19% das puérperas têm depressão pós-parto, prevalência que varia conforme a realidade socioeconômica do país em que vivem . Kate Liu, autora principal, reforça que, apesar de comum, o problema é, na maioria das vezes, negligenciado. No Reino Unido, por exemplo, apenas 3% das mulheres recebem terapêuticas com os medicamentos ISRS. Na avaliação de Liu, esse cenário se deve, provavelmente, à falta de conhecimento do distúrbio e a preocupações sobre possíveis impactos a longo prazo dos antidepressivos nas crianças.

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A pesquisa, porém, mostra um efeito contrário. "Nosso estudo não encontrou nenhuma evidência sugerindo que o tratamento pós-natal com ISRS conferisse um risco aumentado para o desenvolvimento infantil. Na verdade, descobrimos que a terapêutica reduziu a depressão materna e as dificuldades comportamentais infantis associadas à depressão pós-parto", afirma Liu.

Vitor Barros Rego, psicólogo e professor universitário da Unieuro, em Brasília, explica que a depressão pós-parto pode afetar a criança e as mães de diversas formas. "Eu diria que há um desengajamento da mãe no cuidado com a criança e no cuidado de si própria. Algo que já é comum na maternidade é a mãe se anular. Mas com a depressão pós-parto, isso fica muito mais escancarado, a ponto de ela não querer tomar banho ou não ver sentido em escovar os dentes ou em se alimentar direito", ilustra. "Quando o quadro não é diagnosticado, a mãe tem comportamentos evidentes e inconscientes de rejeição do filho", completa.

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Segundo o especialista, há o risco de esse quadro resultar em problemas futuros para a criança. "O convívio com uma mãe que não é calorosa, que não estabelece vínculo, poderá fazer com que esse filho tenha baixa autoestima, dificuldade de se vincular, menos capacidade cognitiva, de bom raciocínio, concentração e também afetar a memória", lista. Liu enfatiza que todos esses desdobramentos têm sido alvo de estudos científicos. "Diferentes linhas de pesquisa têm mostrado que a depressão pós-parto prevê um aumento em problemas emocionais e comportamentais nas crianças, além de atrasos no desenvolvimento cognitivo."

Segurança 

Durante o trabalho, foram analisadas informações de 8.671 mulheres que preencheram os critérios de diagnóstico para depressão pós-parto seis meses após darem à luz. Dessas, 177 receberam tratamento pós-natal com ISRS. Questões de saúde e características de mães e filhos, incluindo sintomas depressivos e outras dificuldades emocionais e comportamentais, foram avaliados quando os pequenos tinham 1,5, 3 e 5 anos. Nas mesmas datas, checou-se a satisfação materna acerca do relacionamento com o companheiro.

Ao observar os dados, a equipe de cientistas concluiu que a depressão pós-parto mais grave estava associada a níveis mais elevados de depressão materna no futuro e de menor satisfação no relacionamento com o parceiro. Também notaram que o quadro estava ligado a níveis mais elevados de dificuldades emocionais e comportamentais nas crianças, de pior desenvolvimento motor e de linguagem e de aumento dos sintomas de TDAH.

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Segundo Alessandra Araújo, psicóloga da clínica Via Vitae, em Brasília, uma criança necessita de cinco bases para ter uma formação segura: fisiologia, segurança, relacionamento, estima e realização pessoal. Tratar a depressão pós-parto está ligado a alguns desses fatores. "Quando a mãe usa medicações seguras, ela tende a ter suas emoções mais estabilizadas, a criar uma relação com seu bebê e um vínculo de segurança. A mãe torna-se muito mais amável, afetuosa e podendo vivenciar o maternar. Não no sentido romantizado, mas da descoberta de mais um papel desempenhado pela mulher", explica.

A especialista alerta que, a partir do momento em que há uma mulher que deu à luz recentemente em um quadro mais melancólico, agitado, nervoso, impotente, se mostrando chorosa e angustiada, é preciso dar a ela mais apoio para que possa falar sobre as suas emoções e sobre como ela está vivenciando a maternidade. "Muitas vezes, olha-se para o bebê que está chegando ou que chegou e pouco se olha para essa mulher que passou por uma transformação física e social."