À primeira vista, a relação entre a surdez e o Alzheimer parece não fazer muito sentido. Afinal, como o fato de não escutar pode influenciar no aparecimento de um transtorno neurodegenerativo como o Alzheimer ou vice-versa? Apesar das duas condições terem características bastante diferentes, ambas podem, sim, estar diretamente ligadas.



"Nós ouvimos com a ajuda dos nossos cérebros, portanto, o ato de ouvir, em si, já é uma forma de exercitar as nossas vias neurais. Patologias neurodegenerativas, como o Alzheimer, afetam não só as vias cerebrais que controlam a memória, mas também as vias auditivas", afirma a neurologista do Hospital Dia Campo Limpo, gerenciado pelo Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (CEJAM) em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo, Mayra Magalhães Silva.

Dessa forma, a pessoa com Alzheimer pode ter a sua função auditiva afetada de maneira precoce ou profunda. E, da mesma forma, o inverso pode acontecer, ou seja, uma pessoa com audição alterada e sem nenhum cuidado pode ter mais chances de desenvolver problemas cognitivos, como o Alzheimer, em um estágio posterior da vida.

Recente estudo publicado pela revista The Lancet Public Health indica que pessoas entre 40 e 69 anos têm um risco 42% maior de desenvolver degeneração neurocognitiva, caso tenham perda auditiva e não usem aparelho, comparadas às que utilizam os dispositivos.




"Com o uso do aparelho auditivo, o paciente que tem alguma dificuldade de escuta passa a utilizar as suas vias cerebrais auditivas que antes não estavam sendo usadas, estimulando atividade na região e evitando maiores complicações de demência, por exemplo", explica a médica.

Outro estudo realizado pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, mostra ainda que, a cada dez decibéis perdidos na audição, o risco de desenvolver doenças cerebrais, como o Alzheimer, aumenta em 27%.

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Segundo a neurologista, além dessas estimativas, existem outros fatores que podem estimular ainda mais o aparecimento do quadro. "Muitas vezes, pessoas com perda auditiva não tratada têm tendência a se isolar socialmente e, consequentemente, a sentir solidão e depressão. E esses quadros, por sua vez, intensificam o risco de estagnação mental, aumentando ainda mais o risco de desenvolver demência", explica.

De modo geral, hoje, já são cerca de 1,2 milhão de pessoas que vivem com algum tipo de demência no Brasil, além de existir uma estimativa de 100 mil novos casos a serem diagnosticados todos os anos, segundo o Ministério da Saúde. No mundo, já são 50 milhões de pessoas com o quadro, mas acredita-se que até 2030 esse número salte para 74,7 milhões e, em 2050, a enfermidade deva atingir 131,5 milhões de pessoas, em razão do envelhecimento da população.



O Alzheimer é uma doença progressiva sem cura que afeta a memória e a linguagem. A ciência ainda não sabe exatamente o que motiva seu aparecimento, mas os aparelhos auditivos devem ser considerados uma forma de cuidado, especificamente com os idosos que querem evitar complicações.

Além do uso do objeto, existem outras formas de prevenção. "É necessário, antes de tudo, manter bons hábitos de vida, que incluem desde alimentação saudável e rotina de atividade física até bons relacionamentos sociais com família e amigos", aponta a médica.

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