“Se não é sofrido, não é Galo.” Ouço por aí que essa frase já deu, que o atleticano não pode mais aceitar essa condição de sofrência crônica, essa situação de corno em música sertaneja. Vejo amigos sinceros a desejar a vitória tranquila, o gol decisivo aos 20 minutos do segundo tempo, a celebração lúcida, a explosão comedida diante do jogo fácil. Vejo a meninada a invejar esses Barcelonas, que a cada 100 jogos ganham 90 de 6 a 0. Vocês estão completamente equivocados.
O atleticano que renega a sofrência é um ingrato. Sim, porque foi a sofrência que nos deu quase tudo. Se não fosse por ela, não teria havido São Victor e a canhota de Deus. Não teria havido Luan, contra o mesmo Tijuana, no México, aos 47 do segundo tempo. Se a cabeçada de Leo Silva tivesse cumprido a mesma estranha trajetória, porém aos 15 minutos, seria apenas uma cabeçada e não a mais importante cabeçada da história do futebol mundial.
Você, inimigo da sofrência, onde estava quando Edcarlos subiu no cabeceio e, sendo Edcarlos, acertou a bola com seu fêmur sagrado, eliminando o Corinthians no minuto final? Creio que sua comemoração, permitida apenas àqueles que momentos antes se autoflagelam na esperança vã, tenha sido uma homenagem à galinha, a mulher do galo.
Aos que sofrem, a redenção lhes permite tudo, bailar a dancinha do Mano, tatuar a taça na testa, correr pelado a volta no quarteirão, botar o filho na escola pública e, com a economia aferida, comprar um pacote para o Marrocos. Por fim, pedir demissão para viajar, porque não havia férias, consumidas antes em libertadoras comemorações. Aos que sofrem, o botão do foda-se está sempre à mão.
Por isso é bom termos o Patric por perto. Patric é a garantia do sofrimento, o selo ISO 9.000 da sofrência, a certeza da merda. Não fosse o pênalti maroto (não foi pênalti) cometido por ele, teríamos passado com tranquilidade e galhardia por aquele “River Plate” transmitido em preto e branco pela televisão de tubo. Agora estaríamos dando como favas contadas a eliminação desse Defensor, e sabemos bem que aí mora o perigo. O sofrimento, além de outros benefícios, ensina a humildade e o respeito.
Agora estamos nós a lidar com o sentimento do corno, traídos por Diego Tardelli. Outro dia eu mesmo estava aqui a escrever uma carta de amor ao dito cujo, enquanto ele já furunfava com os amigos gremistas. Primeiro, é bom lembrar do Fernando Henrique: “Esqueçam o que escrevi”. Depois, é apertar o famoso botão, nunca mais comer no restaurante dele, nunca mais comprar na loja da esposa. Que vá lá cuidar de sua 32a independência financeira, e também de sua liderança entre os maiores mercenários do futebol mundial, segundo ranking da lendária revista France Football publicado em 2015. Hoje já deve ser hors-concours.
O sujeito acostumado à sofrência levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima. Quem precisa de Diego Tardelli se o Ricardo Oliveira é maior do que o Pelé?
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