Desde que começou a trabalhar com futebol, no final dos anos 1990, o vice-presidente executivo de futebol do Cruzeiro Itair Machado de Souza passou a acumular títulos em campo e processos fora dos gramados. Logo na primeira experiência como dirigente, durante ascensão meteórica do Ipatinga (do Módulo II do Mineiro para a 1ª Divisão do Brasileiro), Itair foi alvo de ações trabalhistas e processos de improbidade administrativa – dois deles em andamento até hoje. Em 2014, quando estava afastado do futebol, o dirigente foi condenado a três anos e seis meses de prisão pela Justiça Federal por crimes de sonegação de tributos na ordem de R$ 4 milhões, mas a pena foi convertida em prestação de serviços comunitários e pagamento de multa.
De acordo com a sentença da juíza Rogéria Maria Castro Debelli, da 4ª Vara do Tribunal Regional Federal (TRF), e com denúncia do Ministério Público Federal (MPF), Itair e seu irmão Luciano Machado de Souza movimentaram volumes de recursos incompatíveis com a realidade fiscal declarada. Os valores decorrentes de receitas obtidas com a venda de telebingos da empresa Campeão Promoções e Eventos chamou a atenção da Justiça a partir de 1998.
“Os réus, de forma livre e consciente, deixaram de informar à Receita Federal, em 1998, valores referentes à real movimentação financeira da empresa Campeão Promoções e Eventos, que tinha nome fantasia Telebingão Campeão, com nítido intuito de sonegar tributos”, diz a denúncia do MPF. O irmão de Itair movimentou naquele ano R$ 8,4 milhões em suas contas, apesar de ter se declarado isento do pagamento de Imposto de Renda.
Segundo a juíza, ficou provado que a empresa deixou de recolher impostos aos cofres públicos na ordem de R$ 3,8 milhões e que houve “omissão e declaração de informações falsas às autoridades fazendárias”. O processo incluiu como evidências cheques emitidos em favor de concessionárias de veículos, que teriam sido comprados para sorteios dos bingos, e outros R$ 1,4 milhão que seriam usados para propagandas da empresa nas rádios e televisões.
Processos em andamento Outro processo envolvendo o cartola cruzeirense completou 10 anos no mês passado e ainda segue tramitando na Justiça. Em abril de 2009, um ano depois que o Ipatinga Futebol Clube chegou ao auge nos gramados disputando a Série A do Brasileirão, Itair Machado foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais em ação que apontou irregularidades em contratos do clube com a Prefeitura de Ipatinga.
O processo trata de vários convênios firmados desde o início dos anos 2000 sem prestação de contas ou averiguação de despesas, considerados pelo MP como “perfume, mera fachada, justificando os gastos exorbitantes, cuja destinação não vinha sendo devidamente comprovada”. O documento aponta que entre as explicações de gastos, o dirigente Itair Machado justificou o repasse de R$ 168 mil recebidos da prefeitura como pagamento para o transporte de seus atletas. No entanto, o clube recebeu no mesmo período recursos para a mesma finalidade da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Segundo o promotor de Justiça Fábio Finotti, alguns processos envolvendo Itair Machado tramitam há mais de 10 anos e enfrentam como obstáculo a lentidão da Justiça, que tem várias fases e etapas a serem cumpridas até a sentença final. “No caso de Itair, antes de ele aparecer como diretor do Cruzeiro, estava quase impossível encontrá-lo. Foram várias cartas precatórias para Belo Horizonte”, explica Finotti.
Em outra ação de improbidade administrativa apresentada em 2014, envolvendo a Prefeitura de Ipatinga, o clube e Itair Machado, o Ministério Público questiona novos repasses feitos dos cofres públicos municipais para fixar propagandas no Estádio Municipal de Ipatinga. “Salta aos olhos o fato de o município ter pagado para fixar propaganda em estádio que é seu (Estádio Municipal Epaminondas Mendes Brito, conhecido como Ipatingão). O Ipatingão é patrimônio do município de Ipatinga”, diz a peça.
Procurado pela reportagem, o vice-presidente do Cruzeiro não atendeu as ligações. Segundo a assessoria de imprensa do clube, Itair Machado não concederia entrevistas exclusivas ontem, uma vez que participou de entrevista coletiva com mais de uma hora de duração na segunda-feira.
Em campo, time focado na reação
As denúncias de irregularidades na administração do Cruzeiro coincidem com o pior momento na equipe na temporada. A equipe soma quatro derrotas e um empate nos últimos cinco jogos e precisa dar resposta o mais rápido possível, até porque tem jogo decisivo na Copa do Brasil daqui a uma semana, quando recebe o Fluminense, no jogo de volta das oitavas de final. Na ida, no Maracanã, houve empate por 1 a 1. “Estamos preocupados com o que a gente faz dentro do campo. O resto, deixamos para a diretoria, que já falou sobre o assunto. A nós cabe tirar o mais rápido possível o time da situação em que está”, afirma o volante Lucas Romero, que, como os demais jogadores, está ciente de tudo que está ocorrendo, mas prefere não entrar no assunto. “O que a gente pode fazer para ajudar o Cruzeiro neste momento é dar a resposta dentro de campo.” Para dificultar ainda mais a situação, o técnico Mano Menezes ficou sem o lateral-direito Edílson, que sofreu estiramento muscular na panturrilha direita. (Paulo Galvão)