No Cruzeiro desde 5 de janeiro, o paranaense Mário André Mazzuco, de 42 anos, é o principal responsável pelas conversas com empresários, jogadores e dirigentes. Mas as tarefas do diretor-executivo vão além de negociar salários e buscar reforços de acordo com as preferências do técnico Felipe Conceição. Muitas vezes, ele precisa ter jogo de cintura para tranquilizar os atletas em meio à situação financeira caótica vivida pela Raposa, que acumula salários atrasados e tenta encontrar soluções para minimizar uma dívida calculada em R$1 bilhão.
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Cruzeiro anuncia contratação de três reforçosAlan Ruschel desembarca em BH após anúncio do CruzeiroCruzeiro encaminha terceira contratação para defesaCom jovens da base e reforços, Cruzeiro inicia pré-temporada na Toca IITokushima Vortis, do Japão, anuncia contratação de Cacá, do CruzeiroEm entrevista ao Superesportes, André Mazzuco comparou o desafio de trabalhar no Cruzeiro com a experiência de um ano e meio no Vasco, outro gigante do futebol brasileiro que tem a parte econômica no fundo do poço por causa de gestões temerárias passadas. O executivo conduziu o Departamento de Futebol do clube carioca de julho de 2019 a dezembro de 2020: “Venho para o Cruzeiro em um cenário parecido, de perda de receita muito grande, acúmulo de dívida muito grande, e um momento esportivo que nunca havia passado em sua história”.
Na opinião de Mazzuco, um dos caminhos para o Cruzeiro vencer a crise é retornar à elite do Brasileiro, que oferece um cenário mais favorável com receitas de cotas de TV, premiação e exposição dos jogadores no mercado. Em 2020, o time fracassou na missão ao terminar a Série B em 11º lugar. Por isso, o diretor defende a ideia de montar um grupo competitivo desde o início do ano para não só subir como brigar pelo título da Segunda Divisão. “O resgate que queremos ter é de conquista. A gente precisa mirar a conquista.” Confira os principais trechos da entrevista, que está na
íntegra no Superesportes.
Você já trabalhou em clubes de diferentes portes: Paraná, Coritiba, Red Bull, Paysandu, Vasco e Cruzeiro. Financeiramente, o cenário do Cruzeiro é o pior que enfrentará tendo em vista os desafios e a grandeza do clube?
Independentemente do momento recente do Cruzeiro, o mercado do futebol brasileiro no período pós-pandemia vive muita instabilidade. O Cruzeiro é uma história recente, porque a gente considera 2017 e 2018 com títulos importantes e relevantes. É uma ruptura que aconteceu recentemente, por isso assustou muita gente. Também entrou em uma crise que culminou com o rebaixamento. Acho que foram muitas coisas ao mesmo tempo que geraram toda essa questão do Cruzeiro. É desafiador, mas o primeiro passo é entender o que a gente pode, os nossos limites e ter uma equipe pronta para buscar soluções em todos os setores.
Na prática, como está a divisão do trabalho entre você, Deivid (diretor técnico) e Pedro (Moreira, gerente de futebol)?
Hoje, o Departamento de Futebol é gerido pela diretoria-executiva, na qual eu completo esse posto. Abaixo da diretoria-executiva temos a diretoria técnica, que hoje o Deivid participa; o Pedro Moreira, que é o nosso gerente; o Claudiomir (Rates), nosso supervisor; e na parte mais técnica o Antônio Almeida e o Brunno (Noce), que fazem parte do nosso núcleo de análise de mercado. Dentro dos processos decisórios, temos o Benecy (Queiroz), hoje da nossa estrutura administrativa. E a parte da comissão técnica, tendo à frente o Felipe Conceição, que é o nosso comandante. Uma coisa que a gente tem premissa é de que o Departamento de Futebol do Cruzeiro seja único. Ele não tem essa divisão de principal e categoria de base. É um processo contínuo em que estamos realizando essa aproximação para que seja um processo de formação e desenvolvimento que termine na equipe principal. Vai facilitar na filosofia, na criação de identidade, no pensamento convergente.
Como é sua relação com o Pedro Lourenço, principal patrocinador do clube? Ele tem tido voz ativa no futebol?
É um colaborador, não entra no processo decisório. Eu o conheci recentemente, temos uma relação muito importante, mas lógico que as decisões do clube são técnicas. Elas respeitam o processo interno, desde o treinador até a diretoria executiva, o presidente, enfim. Não há intervenção, e sim colaboração. É uma pessoa muito importante para o momento do Cruzeiro, que precisa de bons parceiros para se recuperar. O Pedro é um bom parceiro, assim como o sócio do Cruzeiro. Não há como a gente se recuperar espontaneamente. Você vai ter que buscar receitas alternativas e criativas.
Como lidar com a montagem do grupo para a temporada de 2021, ao mesmo tempo em que o clube está com salários atrasados?
A gente procura ser muito transparente. Temos um diálogo totalmente aberto com os jogadores que estão aqui. Mostramos a eles o que a gente vai enfrentar e, ao mesmo tempo, a busca constante por soluções. Em momento algum dissemos que seria fácil, porque não vai ser, mas temos uma equipe trabalhando para isso. O Cruzeiro passa por momento atípico em sua história, então quem puder entender o Cruzeiro como oportunidade e puder fazer um sacrifício de comprar a ideia conosco, é disso que estamos precisando agora.
Existe uma previsão de pagamento de salários ou o cenário no clube ainda é prematuro?
É prematuro. No futebol, as receitas previstas às vezes não são as maiores que você tem em uma temporada. Esse é o grande problema, porque os clubes, em sua maioria, têm de contar com a receita variável para fazer a coisa girar. E às vezes essa receita variável não acontece. Há um compromisso para que as receitas que entrem no clube sejam utilizadas para trazer esse equilíbrio econômico que precisamos para atletas, funcionários e fornecedores.
Qual o tamanho da folha com que o Cruzeiro deve trabalhar nesta Série B?
Não podemos esquecer que o Cruzeiro era um clube com folhas extremamente altas, sobretudo no período recente de conquistas. E quando você cai para a Série B, tem um impacto grande nisso por causa dos jogadores ainda com contrato. Não tem muito o que fazer. Vimos algumas situações que ocorreram: Fred, Dodô, o próprio Dedé. Não há muito como mexer, o clube fica de mãos amarradas. Temos que pensar naquilo que vai nos trazer o resultado que queremos. Com relação às contratações, não vai ter como estabelecer ‘olha só, precisaremos de folha de 1 milhão’. Não há como prever isso, porque há jogadores com contrato, que precisamos ajustar dentro do orçamento que temos, e os novos adequar dentro da realidade.
Mas você pode revelar o valor da folha do Cruzeiro?
Não posso falar número, mas não vai ser uma folha baixa, pois o Cruzeiro ainda não tem essa capacidade de adequação. Seria somente se limpasse tudo e começasse do zero. Independentemente do valor, o que importa é fazer um time eficiente, com convicção. O time do Cruzeiro, no papel, deveria ter subido na temporada que passou. Agora a gente precisa focar em ser eficiente e assertivo para subir.
Você é a favor do teto salarial de R$ 150 mil? Desde a chegada de Sobis e Pottker esse assunto voltou à tona, pois eles têm patamares acima do teto estabelecido aos atletas que já estavam na Toca.
Não posso opinar sobre quando eu não estava, mas, com visão de fora, acho que foi necessária a ruptura naquele momento. Realmente, foi uma medida efetiva, porque senão o Cruzeiro fechava a porta naquele baque do início da crise. Haverá uma variação, isso é fato, há alguns jogadores ganhando mais, outros promissores. Os jogadores têm a noção do valor de mercado. Isso é importante, vale entender o momento de cada um, trabalhando com dados, informações, até mesmo para argumentar. Jogadores que jogaram menos ou mais, vieram do campeonato x ou y, você tem uma forma de valorizar isso. Não sou a favor ou contra um teto, mas não vejo a necessidade de se estabelecer um teto. É preciso ver qual o tamanho do que você pode, e aí vai da sua habilidade de gerir, de ter jogadores com menor valor para fechar o número que pode fazer.
O Cruzeiro vai precisar propor nova repactuação salarial aos jogadores que recebem acima de R$ 150 mil? O acordo inicial previa pagamento da diferença a partir de abril de 2021...
O Cruzeiro busca alternativas para equilibrar esse impacto de dívidas ou demandas que apareçam agora. A receita realmente é diminuta, e precisamos buscar alternativas para equilibrar o ano no futebol, por exemplo. Em casos específicos, sim. Vamos ter que sentar, conversar e tentar achar uma solução. Não vai ter jeito. É uma situação real, matemática.