Aos 14 anos, a primeira convocação para a Seleção Brasileira de tenistas cadeirantes. Vai disputar o BNP Paribas World Camp, que equivale ao Campeonato Mundial da modalidade, e que acontecerá em Vilamoura, Portugal, de 2 a 8 de maio. Essa é Vitória Miranda, mineira de Belo Horizonte, residente no Granja de Freitas, bairro da Zona Leste da capital. A jovem é atleta do Butija Tennis, quadra especializada no Bairro Belvedere. O time brasileiro terá ainda outros três tenistas: Meirycoll Duval, Ana Cláudia Caldeira e Rafael Medeiros, que disputarão no adulto, enquanto Vitória jogará a categoria de 18 anos.
Vitória se torna a continuidade de uma história de atletas mineiros com destaque no mundo. Para se ter uma ideia, nos Jogos Paralímpicos de Tóquio’2022, nada menos que seis mineiros fizeram parte da equipe brasileira: Meirycoll Duval, Ana Cláudia Caldeira, Rafael Medeiros, atletas do Butija Tennis; Gustavo Carneiro, de Uberlândia, e Daniel Rodrigues, que está sem clube. Além deles, dois treinadores, Léo Botija e Rafael Oliveira, de Uberlândia. O time brasileiro tinha oito tenistas. Gustavo, por problemas pessoais, acabou não indo à disputa.
“Vocês são os números 1 e 2 do Brasil, mas esperem que logo, logo estarei apertando vocês.” Foi com essa frase, segundo Meirycoll, que Vitória as encontrou nos seus primeiros treinos, há dois anos. “Olha só a vontade dessa menina em se tornar vencedora, A gente apoia”, diz ela.
A história de Vitória com o tênis em cadeira de rodas começa quando ela tinha apenas 9 anos. Léo Butija, seu treinador, contou que tinha sido procurado por um amigo, da Associação Mineira de Reabilitação (AMR), que lhe disse que teria uma menina, nova, que poderia jogar tênis. “Falou que mandaria um vídeo dela. Mas esse vídeo só fui ver oito meses depois dessa conversa.”
Nesse ínterim, no entanto, Vitória conta que se encontrou, por acaso, com a mãe de um atleta paralímpico de tênis, mineiro, Rafael Medeiros. “Ela me perguntou se queria jogar tênis. Disse que sim e ela me trouxe aqui no Butija Tennis, para testar.”
No início, Vitória conta que gostava, mas depois foi perdendo essa vontade. “Eu entrava em quadra e chorava. Não queria mais esse esporte. Não sei por quê. Talvez porque não conseguia fazer o que via outros jogadores do mesmo esporte fazendo. Mas eu era nova e não percebi isso. Decidi parar.”
Quando fez 12 anos, resolveu procurar pelo treinador e dizer que queria voltar a jogar. “Ele me disse que tinha chegado numa boa hora, pois estava fechando a equipe e que tinha apenas mais uma vaga e que ela seria minha.” Daí em diante, Vitória começou a se formar jogadora.
PRIMEIRO TÍTULO
A convocação de Vitória aconteceu sem que ela tenha conquistado nem um torneio sequer. No entanto, a jovem é a 15ª do ranking geral feminino brasileiro, que tem Meirycoll como número 1 e Ana Cláudia, a 2. Ela disputa torneios há pouco tempo, desde novembro de 2021, e já demonstrou ser uma jogadora de força. “Disputei só dois torneios até agora. Um foi em Uberlândia, onde fui vice-campeã do torneio de consolação, disputado por jogadoras que tinham sido eliminadas na fase de classificação.” Mas o melhor resultado aconteceu em São Paulo, onde foi vice-campeã de duplas, jogando em parceria com Meirycoll. “Foi um grande incentivo pra mim”.
E muito da dedicação de Vitória, segundo conta, se deve ao fato de estar ao lado de Meirycoll, Ana Cláudia e Rafael. “Treinar com eles é o máximo. São a minha inspiração. Eles me contam tudo, experiências, o que acontece nos torneios disputados pelo mundo, nos Jogos Paralímpicos. Quero ser como eles. E devo muito, também, ao meu treinador, o Léo, que é um grande incentivador e me ensina tudo. Além disso, a história dele, que começou como boleiro, deixa a gente de cabelo em pé.” E lança um desafio para ela mesma. “Quem sabe meu primeiro troféu ou medalha não seja em um torneio internacional?"
EXPECTATIVA
Vitória participará de um torneio em Uberlândia, no próximo fim de semana, e depois de um camping (treinamento), por uma semana, em São Paulo, antes da viagem a Portugal. Assim será a reta final de sua preparação.
Em Vilamoura, no Mundial, Vitória terá dois desafios. O primeiro, que o torneio é misto, ou seja, homens e mulheres se enfrentando, uma novidade da Federação Internacional. O segundo, que disputará na categoria 18 anos, ou seja, enfrentando jogadores e jogadoras quatro anos mais velhos que ela.
Mas ela está se preparando. “Estamos procurando informações de jogadores e jogadoras. Com algumas delas eu já joguei e conheço o jogo. Mas com estudo a gente pode conseguir ter um trunfo a mais contra os adversários. O mais importante é que não tenho medo.”
Moradora do Granja de Freitas, Vitória tem um pai que é serralheiro, Fábio, de 36, e a mãe é diarista, Solange, de 43. Ela tem cinco irmãos: Kennedy, Euler, Diogo, Diego, filhos do primeiro casamento do pai, e Tales, de apenas 5 anos, fruto, como ela, desse casamento. “Todos eles me dão muito apoio para que siga jogando tênis.”
Ela estuda na Escola Municipal Dr. Júlio Soares, no Granja de Freitas. E aí entra o treinador mais uma vez. “Ela tem de me mostrar o boletim todos os meses. Se tiver nota vermelha, ou seja, perder média, não joga. Ela sabe que essa é uma exigência”, conta Léo, que a ajuda a aprender inglês. Usa a história de Malala, uma menina tailandesa que enfrentou o governo de seu país pelo direito de estudar e também da mulher. “Para um jogador de tênis, é fundamental saber uma segunda língua”, diz Butija.
TIME MINEIRO
A competição mundial em Vilamoura será em todas as categorias. Meirycoll, Ana Cláudia e Rafael também participarão. Eles já têm experiência internacional. Rafael já disputou oito mundiais – na Suécia, dois na Holanda, Japão, Itália, África do Sul, Turquia e Israel. Seus melhores resultados foram dois vice-campeonatos, na Holanda e Japão, e foi sétimo na Itália. Já disputou três edições dos Jogos Paralímpicos – Londres’2012, Rio’2016 e Tóquio’2022.
Meirycoll tem seis participações em mundiais: Japão, Itália, Holanda (2), Portugal e Israel. Fez a sua primeira participação paralímpica nos Jogos de Tóquio’2022. Ana Cláudia também disputou a sua primeira Paralimpíada em Tóquio. Formou dupla com Meirycoll. Portugal será seu segundo Mundial. No primeiro, na Itália, ficou na sétima colocação.