Fruto símbolo do cerrado, o pequi garante o sustento de milhares em vários municípios do Norte de Minas. Alguns dizem que tem poder afrodisíaco. Mas, foi provado cientificamente que a importância do pequi vai além de matar a fome do sertanejo: tem propriedades que ajudam a prevenir doenças do coração. Depois de 10 anos de pesquisas, o biólogo César Koppe Grisolia, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB), desenvolveu um produto com efeitos fitoterápicos do pequi, que ajuda a evitar a formação de placas de gordura nos vasos sanguíneos, combatendo o colesterol e diminuindo o risco de problemas cardíacos. O produto, que será vendido em forma de cápsulas, deve chegar ao mercado no próximo ano.
O pesquisador ressalta que, primeiramente, avaliou os efeitos do pequi na prevenção de doenças do coração em camundongos. Depois, realizou testes em 125 voluntários, durante dois anos. Ele lembra que o pequi é um alimento altamente rico em vitaminas A e C, frutose, sais minerais e compostos antioxidantes,que capturam radicais livres, moléculas novas formadas nos organismos. “Tem propriedades que melhoram as funções cardiovasculares porque ajudam o colesterol bom (HDL) e combatem o colesterol ruim, o LDL” “Para que as pessoas possam fazer uso de suas
propriedades, desenvolvemos cápsulas de extrato da polpa e outras de óleo de pequi”.
Tecnicamente o novo produto é enquadrado na categoria dos nutracêuticos, algo que, grosso modo, se situa entre um alimento e um remédio. Teoricamente, eles nutrem e trazem saúde. “É um produto que incrementa as funções fisiológicas, revigorante e que vai além de um alimento”, explica Grisolia. “O que desenvolvemos tem tanto propriedades
nutracêuticas como fitoterápicas, mas vamos registrar na Anvisa apenas na primeira categoria, porque o processo é mais simples e barato”, diz o biólogo.
Por outro lado, o pesquisador admite que as pessoas que têm o hábito de “roer pequi”, como os moradores dos pequenos municípios do Norte de Minas, podem ficar menos propícias a desenvolver doenças cardíacas, por conta dos efeitos do fruto símbolo do cerrado. “Tanto o óleo como o extrato do pequi possuem substancias com capacidade antioxidante, que inibem a oxidação dos lipídios nos vasos sanguineos, e com isso, combatem a formação de placas de gordura nas paredes dos vasos”, acentua.
O produto obtido a partir do pequi já rendeu mais de 10 artigos científicos sobre o assunto.A pesquisa serviu também para destacar a importância da preservação do cerrado, bioma que está tão ameaçado quanto a Amazônia. Grisolia criou um modelo de exploração sustentável, com geração de mão-de-obra e renda para as comunidades rurais da região. “Meu trabalho ostra que o cerrado preservado é economicamente importante Para quem acha que pesquisa só é importante quando se consegue um ganho econômico, fizemos isso. Mas para outros, manter a biodiversidade é uma questão de respeito às outras formas de vida".
PRESERVAÇÃO DO BIOMA
A escolha do cerrado como principal tema de discussões da 63ª Reunião Anual da SBPC deverá suscitar uma série propostas para a preservação do bioma, que está seriamente ameaçado pelos desmatamentos. Esta é a perspectativa de ambientalistas, técnicos e pesquisadores que vão participar do encontro. A direção da SBPC ressalta que escolha do cerrado como tema do seu principal encontro anual não foi por acaso. O bioma está presente em mais de dois milhões de quilômetros quadrados (24%) do território nacional. É encontrado no Planalto Central, nas regiões centro-oeste, nordeste, norte e sudeste, ocupando mais de 40% do território mineiro.
Trata-se da segunda maior formação vegetal brasileira (a primeira é a Amazônia) e a savana tropical mais rica do mundo em diversidade de espécies. É ainda o berço de nascentes de importantes rios como Tocantins-Araguaia, Paraná, São Francisco, sendo considerado área de recarga nacional. Além disso, o cerrado concentra um terço da biodiversidade nacional e 5% da flora e da fauna mundiais conhecidas. No entanto devido à alta pressão antrópica, registra-se grandes perdas da biodiversidade, com preocupantes índices de extinção de espécies animais e vegetais.
“Acredito durante a reunião da SBPC, deverá surgir um conjunto de denúncias concretas sobre o mau uso da terra, ocupação desordenada e os impactos dessa ocupação no cerrado no futuro, acabando com a águ que vem do subsolo e matando os rios. Será feito um alerta ao país sobre a destruição do cerrado”, afirma o professor e pesquisador Elimar Pinheiro, do Centro de Desenvolvimento Sustentável, da Universidade de Brasília (UnB).
REUNIÃO DA SPBC
A Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência é um dos maiores eventos científicos do País. É realizada desde 1948, com a participação de autoridades, gestores do sistema nacional de ciência e tecnologia e representantes de sociedades científicas. O encontro serve para medir e difundir os avanços da ciência nas diversas áreas do conhecimento, sendo também um fórum de debate de políticas das públicas para a ciência e tecnologia.
FRUTO SÍMBOLO DO CERRADO
O pequizeiro é verificado ao longo de todo bioma cerrado. Como outras espécies do bioma, é uma árvore frondosa e tortuosa. Com grande poder de resistência ao clima de poucas chuvas, ela floresce entre os meses de agosto a novembro. A safra vai de novembro a fevereiro. Nesse período, o pequi proporciona uma verdadeira fartura nos municípios do Norte de Minas como Montes Claros, Mirabela, Coração de Jesus, Lontra, Brasília de Minas e Japonvar. Nesses lugares, famílias inteiras – homens, mulheres e crianças – se dedicam à cata do fruto símbolo do cerrado no mato.