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Estado de Minas

Depressão pós-parto afeta os homens

Muitos pais, não apenas os de primeira viagem, sentem-se abandonados pela esposa, se entristecem, perdem a libido e, em casos mais graves, adotam medicamentos para superar a fase


postado em 21/08/2011 08:09

 

A filha nasceu e Maria Cristina e o marido se separaram (foto: Jair Amaral/EM/D.A PRESS)
A filha nasceu e Maria Cristina e o marido se separaram (foto: Jair Amaral/EM/D.A PRESS)


Apesar de comum e de atingir um em cada quatro homens que vão ser papais, o assunto é delicado e esbarra em vaidade e preconceito. Embora eles procurem cada vez mais os consultórios médicos para buscar ajuda, encontrar um homem com coragem de dizer que foi vítima de uma depressão pós-parto masculina é como achar uma agulha no palheiro. Aceitando dar entrevista ao Estado de Minas, na condição de usar nome fictício, Vinícius, de 40 anos, clínico geral em Belo Horizonte, quebrou a regra: "A depressão pós-parto masculina existe, sim. Sofri disso quando minha esposa engravidou da minha segunda filha, em 2004. Eu pirei. Quis sumir no mundo. Chegamos a pensar até em nos separar. Tive crises de choro e carência. Mas me salvei com terapia, antidepressivos e o carinho dela, amigos e familiares. O pai, com a chegada de um filho, é esquecido."

O que Vinícius revela pode soar estranho e absurdo, mas essa vilã que acomete 20 em cada 100 mulheres também tira o sono dos pais e manda embora a disposição, o apetite, o prazer e a alegria da paternidade, colocando em risco até mesmo os casamentos. O que ocorre, como acreditam especialistas, é que eles passam a considerar a teoria do "ganhei um filho, mas perdi a mulher". Em 2010, um estudo divulgado na revista científica da Associação Médica Americana apontou que um em cada quatro homens que têm filhos sofre com esse tipo de depressão entre o terceiro e o sexto mês de idade da criança.

No Brasil, apesar de pouco explorado, o assunto, segundo especialistas, não é raro. Pelo contrário, já é rotina em muitos consultórios. E mais: não é de hoje. Segundo explica a psicóloga Cynthia Boscovich, é preciso, primeiro, diferenciar tristeza de depressão. "A tristeza materna, conhecida como baby blues, é muito comum e atinge cerca de 80% das mulheres. É aquele sentimento semelhante à depressão, porém, menos grave e de intensidade menor. Geralmente, aparece quando o neném nasce e logo desaparece, dura cerca de uma semana", diz, lembrando que, para se caracterizar como depressão, os sintomas de tristeza e desânimo, por exemplo, têm que persistir por mais tempo, em torno de 30 dias, e comprometer de fato o dia a dia da pessoa.

Por mais que o nascimento de um filho tenha sido planejado, sua chegada muda a logística do casal. "Não dá para devolver um bebê. É para o resto da vida", lembra a psicóloga, acrescentando que o pai precisa estar bem para dar  suporte à mãe. Mas, segundo ela, muitos homens se sentem acuados com o instinto materno e com essa nova condição. "Eles passam a se sentir muito assustados com a nova realidade. Como a mulher passa a se dedicar mais ao filho, o homem sente que perdeu sua companheira. Além disso, tem a pressão de manter a questão econômica e a responsabilidade cai sobre seus ombros. Ele passa a se sentir sem espaço", diz Cynthia, acrescentando que não se trata apenas de pais de primeira viagem. "Pode ocorrer tanto com aqueles que têm o primeiro filho quanto com quem terá o terceiro."

Quando veio a primeira filha de Vinícius, em 2003, tudo foi como o esperado. "Estávamos casados há cinco anos e havia um ano que programávamos ter um filho", conta. Em agosto de 2004, com a mulher ainda amamentando, veio a surpresa: ela engravidou de novo. "Pensamos em nos separar, uma sensação ruim tomou conta de mim. Foi um período muito dolorido", revela ele, dizendo que um dia antes de a segunda filha vir ao mundo teve uma crise de choro. "Saí andando pela rua aos prantos." Veio o bebê, e Vinícius procurou ajuda médica para tomar antidepressivos.

Os motivos para o quadro depressivo masculino, de acordo com a psicóloga Cynthia Boscovich, não são exatos. "Há muitos fatores que podem contribuir para isso. Podem estar relacionados a momentos de dificuldade e angústia após a chegada do bebê, pois ocorre mudança da dinâmica familiar, que faz com que questões inconscientes venham à tona, causando os sintomas", diz, lembrando que o nascimento da criança é fator desencadeante. "Pode ser que o homem tivesse uma predisposição para isso", completa. O que curou Vinícius, segundo ele, foi o carinho entre ele e a esposa. "Ela não me cobrava nada e me entendia. E via que estava sofrendo. A ajuda dos amigos, da família e dos médicos é fundamental. Depois de todo o processo, não me vejo feliz se não tivesse superado isso junto dela."

Mas, em muitos casos, a depressão no homem pode acabar com uma história de amor. É o caso da advogada Maria Cristina de Sena de Souza. No terceiro ano de casamento, Maria resolveu ser mãe, e depois de um ano de tentativas, nasceu Bárbara, há 12 anos. A vida a dois nunca mais foi a mesma. "Ele surtou. Queria disputar a atenção da minha filha comigo. Fazia pirraça e outros absurdos. Começou um pesadelo e pedi o divórcio", lembra Maria Cristina.

Tratamento

No caso da depressão materna, o uso de medicamentos antidepressivos é evitado, lembra a psicóloga. "Não é possível dar a elas remédios tarja preta, já que estão amamentando. No entanto, para os homens é possível", diz, lembrando que a psicoterapia pode ajudar bastante na diminuição dos sintomas e também na avaliação da necessidade de encaminhamento para inclusão de medicamentos no tratamento.

Para o professor de psicologia da PUC Minas e professor convidado da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Hélio Lauar a depressão pós-parto masculina ainda não é diagnóstico. " É uma depressão como qualquer outra, mas o fator desencadeante é o parto. O exercício da paternidade é sempre uma prova simbólica para ele reeditar toda a relação que teve com o pai", diz, apontando que, por isso, muitos homens não suportam nem a ideia da gravidez. "Em pessoas com quadro de transtorno obsessivo compulsivo (TOC), há a fantasia, inclusive, de destruição da criança", alerta.

Sexo

De acordo com o urologista e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia/Minas Gerais Luiz Otávio Torres, o homem aparece no consultório quando sente a falta do sexo com a esposa. "Como ele é colocado em segundo plano depois do parto, ele não procura a mulher para a relação sexual. Ou, quando vai tocá-la, como sabe que vai sair leite no peito, acaba desistindo. A maioria dos pais sabe que essa fase é temporária e acaba aceitando. No entanto, há aqueles que começam a ter problemas de ereção. Por isso, o casal deve saber lidar com a chegada do bebê. Muitas mulheres esquecem que têm um companheiro", diz. (*nome fictício)


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