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Estado de Minas

Conheça o lado tóxico dos chás populares

Pesquisa com chá de folhas de yacón, indicado para reduzir a glicemia em diabéticos, indica que seu uso pode causar lesão renal grave, assim como o consumo indiscriminado de outras plantas afeta o fígado


postado em 07/11/2011 08:42

A planta do yacón é originária dos Andes e pertence à mesma família botânica de espécies como o girassol e a arnica(foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
A planta do yacón é originária dos Andes e pertence à mesma família botânica de espécies como o girassol e a arnica (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
 

Tão úteis à humanidade, as plantas medicinais que deram origem a uma série de medicamentos usados na atualidade podem causar efeitos colaterais tão severos quanto os ocasionados pelos remédios sintéticos comprados nas farmácias. A cultura popular de usar as plantas especialmente sob a forma de chás, sem orientação de um médico e mesmo sem observar a procedência de raízes e folhas, é responsável por graves casos de intoxicação. Estudos sobre as folhas do yacón, realizados na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), ligada à Universidade de São Paulo (USP), mostra que o chá do produto, comercializado popularmente em mercados de Minas e pelo país afora, e também no Japão e na Europa, com objetivo de reduzir a glicemia em diabéticos, pode causar lesões renais graves.

O chá preparado a partir das folhas do yacón foi administrado por via oral em ratos durante três meses em uma dose equivalente a três xícaras de chá por dia para um humano de 70 quilos. “Nessa dose e ao final dos 90 dias de tratamento, os ratos apresentaram um quadro de doença renal crônica, com inflamação e destruição dos tecidos filtrantes do rim”, aponta Rejane Barbosa de Oliveira, autora da tese de doutorado “Atividades antidiabética, anti-inflamatória e toxicologia do yacón”.

A planta é uma originária da região dos Andes e pertence à mesma família botânica de espécies como o girassol e a arnica. Sua batata ou raiz, no entanto, é muito usada pelos povos andinos (veja em Palavra de especialista). O estudo realizado na FCFRP/USP demonstrou que o chá preparado a partir das folhas da planta tem duas classes principais de substâncias químicas: as lactonas sesquiterpênicas (responsáveis pelo dano renal), além de compostos denominados ACGs, responsáveis pelo efeito benigno de redução da glicemia. Segundo Rejane, que é também bióloga e doutora em ciências farmacêuticas pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, o estudo demonstrou que apesar de as substâncias terem o potencial de reduzir o percentual de açúcar no sangue o chá das folhas do yacón não deve ser usado pela população.

“A toxicidade desses compostos inviabiliza o uso oral. Uma alternativa seria o uso tópico, o qual demonstrou bons resultados em animais de laboratório, contudo não foram feitos estudos toxicológicos sobre a utilização prolongada dos extratos nesse tipo de tratamento”, diz.


O velho ditado “se é natural não faz mal” é combatido por especialistas que apontam riscos bem maiores que os benefícios no uso indiscriminado de plantas, ervas e fitoterápicos. Para se ter ideia, são registrados anualmente nos centros de controle de intoxicações do Brasil cerca de 2 mil casos de intoxicações por plantas, muitos levando ao coma e até mesmo à morte. Parte das internações ocorrem devido ao uso inadequado das plantas. “Especialmente erros na dosagem, na forma de preparo do extrato vegetal e também na forma errada de identificação da planta”, ressalta a pesquisadora.

A toxidade hepática dos chás é ressaltada pelo chefe do Serviço de Hepatologia do Hospital Universitário de Juiz de Fora, Aécio Flávio de Souza. Especialista na toxidade hepática de diversas drogas, ele ressalta que muitas vezes os chás são feitos da forma errada, o que potencializa seu efeito tóxico. “Muitas vezes a parte que deve ser usada é o caule e a população utiliza as folhas.” A erva conhecida popularmente como sacaca, vendida como remédio para emagrecer especialmente no Norte do país, é responsável por complicações hepáticas tão graves que são capazes de levar ao transplante de fígado. Em Minas, bebidas usadas livremente como o chá verde, confrei e compostos chineses, também podem causar complicações hepáticas graves. Até mesmo o conhecido chá de poejo, usado para gripes, e a valleriana, tomada como calmante, podem prejudicar o fígado. “Antes de começar a fazer uso de um determinado chá, a população deve consultar o médico. Assim pode ter uma avaliação hepática, fazendo o uso da bebida com segurança.”

O fato é que antes de comprar uma planta medicinal, que pode sim fazer mal como qualquer outro medicamento usado de forma inadequada, é preciso levar em consideração alguns fatores importantes. Além de ouvir um médico, é preciso ter a certeza de que a identificação da planta está correta e avaliar a procedência do material. “É preciso ficar atento às doses”, diz a pesquisadora Rejane Oliveira. Ela alerta ainda que deve ser seguida rigorosamente a dose e o intervalo entre elas. “As plantas medicinais podem interagir com outros medicamentos, potencializando, exacerbando ou impedindo a ação dos mesmos.

Mulheres grávidas devem ficar especialmente atentas ao uso de plantas medicinais, pois muitas podem causar abortos espontâneos. No momento de escolher o chá o melhor mesmo é optar pelas plantas geralmente cultivadas em horta, como hortelã, capim santo e camomila. “Essas são muito conhecidas, estudadas e usadas há séculos na medicina tradicional da Europa, onde têm origem”, sugere a professora de fitoterapia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Maria das Graças Brandão.

Palavra de especialista/ Rejane Barbosa de Oliveira, Bióloga

Raiz é boa e consumida

“Na região dos Andes, as raízes tuberosas do yacón são utilizadas pela população como alimento in natura, na preparação de sucos e geleias. As raízes não têm as substâncias lactonas sesquiterpênicas presentes na folha e, por isso, não são tóxicas e podem ser consumidas sem risco. Essas raízes são um excelente alimento para pessoas diabéticas, visto que são ricas em oligofrutanos, que são açúcares que não aumentam os níveis glicêmicos do sangue e ainda contribuem para o bom funcionamento e manutenção da
microbiota intestinal.”

 


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