Pesquisadores e empresários concordam que para o Brasil se tornar uma potência mundial é preciso investir em desenvolvimento científico e tecnológico. No entanto, nem sempre a pesquisa acadêmica se converte em produto comercializável, bem como o conhecimento contribui para a melhoria de processos na indústria e outros setores. O tema foi discutido na tarde de ontem em Belo Horizonte pelo ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antônio Raupp, que reuniu-se com o reitor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Clélio Campolina, juntamente com pesquisadores da instituição. À noite, o ministro falou a empresários na Federação da Indústria do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Campolina pediu ao ministro empenho para o estabelecimento de um marco regulatório, que possa facilitar a relação entre a produção científica e o setor industrial no Brasil. A UFMG, que reveza o primeiro lugar com a Universidade de São Paulo (USP) no registro de patentes, encontra dificuldades em levar as invenções para o setor produtivo em função da legislação vigente no país. “A transferência de patentes é um imbróglio geral. Um marco legal é fundamental”, ponderou o reitor da maior federal do estado.
Durante o encontro, o ministro Raupp falou sobre as diretrizes da pasta na área de tecnologia e principalmente em inovação industrial. Apresentou também o programa Ciências sem fronteiras, lançado no último mês pelo governo federal, e respondeu a perguntas dos professores em relação às ações do ministério para o Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, e em relação à base de pesquisa na Antártida, o continente gelado, destruída parcialmente em fevereiro depois de um incêndio.
A exemplos de outros setores como o rodoviário, o ministro sugeriu que a produção de conhecimento e transferência de tecnologia deve seguir o modelo das parcerias público-privadas. O reitor da UFMG afirmou que o projeto que tramita no Congresso Nacional ainda está longe de ser o ideal e pediu ajuda ao ministro para agilizar o processo de criação de leis que determinem como as universidades, que são públicas, possam comercializar descobertas científicas.
Um marco regulatório possibilitaria também o aporte de recursos do setor privado em pesquisa, o que na opinião tanto de acadêmicos como do próprio ministro, representaria um ganho em termos de inovação para o país. “No Brasil, o investimento das empresas é menor que o do governo. Isso não é um padrão usual. Na maioria dos países, tanto os tradicionais, como Estados Unidos e europeus, quanto os emergentes, como China, o investimento maior vem das empresas”, afirmou o ministro.
Durante o encontro, Raupp não anunciou investimentos específicos para Minas Gerais, mas propôs parceria entre o Centro de Tecnologia em Nanotubos, instalado no BHTec (Parque Tecnológico de Belo Horizonte), com a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação (Embrapii), criada no ano passado e que está em processo de implementação. Aos moldes da Empresa Brasileira de Pesquisa e Agropecuária (Embrapa), a Embrapii vai fomentar a inovação na indústria brasileira.
O ministro reafirmou que a área de ciência tecnologia foi colocada pelo governo federal como central na política de desenvolvimento do país e negou que os cortes de cerca de 20% no orçamento de 2012 (segundo o ministro de cerca de R$ 7 bilhões) demonstre um recuo nessa área estratégica. De acordo com ele, o corte no orçamento foi compensado por investimentos da ordem de R$ 4 bilhões, por meio do Finep Inova Brasil, em projetos de inovação das empresas. Segundo Marco Antônio Raupp, os cortes em infraestrutura global foram minimizados pelo ganho substancial no investimento nas empresas. Veja os destaques da reunião de Raupp na UFMG:
NANOTUBOS
O modelo de gestão do Centro de Nanotubos foi apresentado ao ministro por pesquisadores da UFMG como uma forma de melhorar a relação entre a indústria e a universidade. Com investimento de R$ 36 milhões, o centro irá desenvolver pesquisas científicas, bem como atuar na transferência de tecnologia e na realização de pesquisas sob demanda pelo mercado. Como o centro concretiza parceria entre a Petrobras, empresa estatal, e o InterCement, ligado à empreiteira Camargo Corrêa, do setor industrial, foi assinado acordo de propriedade intelectual que resguarda a autonomia da pesquisa acadêmica. A aplicação industrial dos nanotubos de carbono alcança as áreas de energia, eletrônica, medicina e as indústrias química e petroquímica. Já foram identificadas 197 possibilidades de aplicação do material. Com estrutura cilíndrica formada por átomos de carbono, o diâmetro dessas moléculas corresponde a bilionésima parte do metro (um nanômetro).
CIÊNCIA SEM FRONTEIRA
O ministro Raupp informou que o programa terá R$ 4 bilhões, nos próximos quatro anos, para aumentar o intercâmbio das universidades brasileiras com centros de referência mundiais em pesquisa científica. Uma das linhas é a oferta de bolsas para que pesquisadores brasileiros possam realizar parte dos estudos de pós-graduação (modalidade sanduíche) ou a totalidade do curso em outros países. Também prevê a vinda de cientistas renomados para atuar nas universidades brasileiras. O ministro, no entanto, afirmou que é preciso flexibilidade por parte das instituições brasileiras, que às vezes dificultam o retorno dos intercambistas ao Brasil.
ALCÂNTARA E BASE NA ANTÁRTIDA
Marco Antônio Raupp reconheceu o atraso no lançamento de foguetes no Centro de Alcântara (MA). Ele relembrou o acidente de 2003, quando uma explosão na torre móvel resultou na morte de 23 pessoas. Em relação à pesquisa brasileira na Antártida, o ministro afirmou que, enquanto se reconstroi a base brasileira, os pesquisadores irão usar as bases de outros países, como Inglaterra e Chile. De acordo com ele, houve uma perda de infraestrutura, mas as informações das pesquisas foram salvas.
EDITAIS
Ao ser questionado sobre investimentos do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação em Minas Gerais, o ministro disse que um dos caminhos é a UFMG concorrer a recursos federais para ampliação de infraestrutura. O ministro anunciou que, em agosto, será apresentado edital no valor de R$ 400 milhões.