Imagine um papel que não amarela nem molha, não rasga facilmente e pode ser usado normalmente para escrita ou impressão. Esse produto existe e tem tecnologia 100% brasileira, resultado de uma parceria entre uma multinacional situada em São Paulo e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no interior paulista. Apesar de ter o aspecto do material de origem vegetal, o papel, na verdade, é feito de plástico e foi desenvolvido a partir da reciclagem de embalagens de biscoito, picolé, salgadinhos e rótulos. Batizado de vitopaper, o produto se assemelha ao papel couché, com superfície muito lisa e uniforme, e já foi empregado na confecção de livros, relatórios empresariais e até cadernos. A cada uma tonelada de vitopaper produzida, a estimativa é de que 750 quilos de plásticos deixem de ir para os depósitos de lixo.
A diferença principal em relação à fabricação do BOPP/PP – e segredo guardado a sete chaves – é o acréscimo de aditivos para conferir ao produto aspecto de papel. “As embalagens são cortadas, passam por uma lavagem e se transformam em pequenas bolinhas, que chamamos de pellets. Esse material recebe aditivos e é esticado em uma máquina, se transformando num filme bem fininho”, explica Patrícia. Para completar o processo, depois de cortado, o papel sintético recebe descargas elétricas como parte de um tratamento de superfície. O projeto levou cerca de três anos para ser desenvolvido e contou com a participação do Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar.
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Além de 75% reciclado e 100% reciclável, o vitopaper, no mercado há cerca de três anos, é 30% mais leve que o papel comum. Com coloração perolada, o produto pode receber todas as tonalidades durante a impressão e usa 20% menos de tinta em relação ao convencional. Um dos poréns é que não pode ser usado por impressoras caseiras. Os modelos a laser também são vetados, pois o material não resiste a temperaturas acima de 120 graus. Em compensação, água não é problema para o papel de plástico, que não absorve líquidos. Em relação à escrita, a única limitação são as canetas tinteiras – lápis e consequentemente borrachas, além das canetas esferográficas estão liberados. Não é possível em uso para embalar alimentos também é proibido por ser um produto reciclado e seu uso, por enquanto, se limita à indústria gráfica.
Resistente a traças, o papel sintético não tem prazo de validade. “O livro vai durar tanto quanto seu conteúdo”, comenta Patrícia. O produto já foi empregado na produção de livros como o infanto-juvenil Guerra e Paz, de Eraldo Miranda e ilustrações de Marcelo Alonso, inspirado nos painéis homônimos de Cândido Portinari. A Petrobras é uma das empresas que usou o vitopaper na confecção do seu relatório anual e o Itamaraty, o Ministério das Relações Exteriores, prepara resumo sobre a Rio %2b20 também produzido com o material. Além desses volumes, o produto já foi usado em cardápios, revistas e cadernos. Até agora, a estimativa é de que 1 mil toneladas do papel de plástico tenham chegado ao mercado.
Um dos entraves para a disseminação do vitopaper é o fato de ele ser mais caro que o papel convencional. Dois motivos pesam nesse aspecto: a ausência de uma grande escala de produção e os impostos. Ao contrário do papel de celulose, que para aplicação de livros e periódicos é isento de impostos, o vitopaper conta com os tributos. A isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) foi conquistada em 2011, mas o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) continuando pesando e, para se ter uma ideia, por causa disso, o produto fica 18% mais caro, percentual de ICMS aplicado em São Paulo.