Brasília – Um dos grandes temores dos pacientes com câncer é ter de retomar o tratamento depois da primeira rodada de remédios. Além do sofrimento e dos inúmeros efeitos colaterais causados pela quimioterapia, essas pessoas precisam lidar com a possibilidade de que as drogas usadas anteriormente tenham perdido o efeito esperado. Isso ocorre porque os tumores costumam desenvolver uma certa resistência aos medicamentos, assim como uma bactéria deixa de responder às ações dos antibióticos.
Para evitar esse beco sem saída, oncologistas costumam optar por tratamentos mais agressivos, que dispensem um retorno aos remédios. Mas há chances de que a solução esteja justamente no caminho contrário: uma terapia com pausas programadas poderia adiar o desenvolvimento do tumor resistente. A conclusão é resultado de um estudo norte-americano publicado ontem na revista Nature, que observou a resistência à medicação em um grupo de ratos com câncer de pele.
Os cientistas submeteram um grupo de cobaias cancerosas a uma terapia direcionada por oito semanas e notaram que, depois de dois meses de tratamento, 20% deles desenvolveram resistência às drogas. Os tumores que permaneceram nesses animais foram implantados em outros ratos, nos quais o câncer resistente se desenvolveu. Como se esperava, esses bichos não responderam ao tratamento tão bem quanto o primeiro grupo.
Ao comparar os tumores dos dois tipos de cobaia, os pesquisadores notaram que ambos tinham quantidades similares do gene prejudicial que o remédio tentava destruir. Conhecido como BRAF, ele é responsável pelo crescimento das células. “O BRAF sofre mutação para assumir uma forma superativada em aproximadamente 50% dos tumores de melanoma. Tumores com essa mutação são extremamente sensíveis a inibidores, mas a resposta dura apenas alguns meses, quando a resistência se desenvolve”, explica Meghna Das Thakur, autora do estudo e pesquisadora no Instituto Novartis de Pesquisa Biomédica, nos Estados Unidos.
O estudo, no entanto, foi capaz de mostrar que os genes dos ratos menos suscetíveis ao tratamento produziam uma quantidade muito maior de proteínas que os outros. Essa diferença mostrou aos cientistas que esse gene continuava muito ativo, e que poderia estar até mesmo sendo beneficiado pela ação dos remédios.
A grande surpresa do experimento ocorreu alguns dias depois que os pesquisadores suspenderam o medicamento. Os tumores resistentes deram sinais de regressão, o que para eles mostrou que o gene BRAF havia se tornado dependente da droga, fazendo com que algumas células cancerosas morressem na ausência do medicamento. “No entanto, esse efeito parece ser passageiro, e as células do tumor se reestabeleciam na ausência da droga e começavam a proliferar”, ressalta Meghna. A partir dessa suposição, eles criaram dois tipos de tratamento: um contínuo, como o usado hoje em hospitais, e um intermitente.
Depois de 100 dias, as cobaias tratadas normalmente já mostravam sinais de resistência ao medicamento. Já os ratos que tinham pausas de alguns dias entre uma dose e outra da terapia ainda mostravam resposta às drogas passados 200 dias do início do tratamento. Para os pesquisadores, os resultados mostram que a terapia pode ser mais eficiente quando administrada com intervalos.
Referência Esses resultados, ressaltam os autores, são válidos apenas para o tratamento do melanoma pelo remédio vemurafenib. Mas a pesquisa pode ser usada como referência para o aperfeiçoamento do tratamento de outros tipos de câncer que também mostram resistência aos medicamentos voltados especialmente para combater cada um. Grande parte dos pacientes costuma sofrer com a falta de resultados mesmo depois de os tumores apresentarem uma diminuição drástica na primeira dosagem dos remédios.
Resistência Há várias formas de os pacientes de câncer se tornarem resistentes à terapia, e muitas delas envolvem alterações na expressão ou na atividade dos alvos das drogas. Dessa forma, o medicamento ainda afeta a pessoa doente, pois a resistência é formada diretamente nas células cancerosas, e não pelo organismo do paciente em si – um quadro que torna o tratamento mais sofrido que benéfico. Até hoje, as formas mais eficazes de evitar a resistência dos tumores é iniciar o tratamento ainda no início da doença ou usar várias drogas, que podem ser combinadas ou alternadas.
“Quase todos os pacientes, eventualmente, se tornam resistentes a drogas como o vemurafenib. Há vários tipos de mecanismos de resistência, que vão desde novas mutações à superexpressão de proteínas como a BRAF. Não há uma forma simples de explicar esse problema, mas suspeito que o melanoma avançado com diferentes mutações genéticas tenha mais chances de se tornar resistente a inibidores”, reflete o imunoterapeuta Jeffrey Weber, do H. Lee Moffitt Cancer Center & Research Institute.
De acordo com o especialista, que não participou do estudo, a suspensão do tratamento em pacientes humanos tem poucas chances de resultar numa regressão expontânea de tumores. Contudo, a ideia de testar uma terapia direcionada com intervalos poderia ter resultados positivos. “Em pacientes com o perfil desse artigo, a ideia de dosar o inibidor BRAF de forma intermitente faz sentido e devia ser formalmente testada. Eu suspeito que a resposta seria baixa em pacientes não selecionados, mas o artigo fornece um guia para a seleção de pacientes que podem se beneficiar da dosagem intermitente”, arrisca Weber. Ele ainda aponta que alguns oncologistas já haviam observado que o câncer pode voltar a responder ao medicamento quando há uma pausa de três meses no tratamento.
O experimento com ratos, no entanto, ainda não mostra qual seria o ritmo ideal de tratamento para uma terapia mais eficaz para humanos – um aspecto que deve variar para cada paciente. “É muito importante enfatizar que simplesmente não é possível comparar a duração da sobrevivência observada dos ratos com o que poderia ser observado em pacientes humanos numa dosagem intermitente”, alerta Martin McMahon, coautor do estudo e pesquisador da Universidade da Califórnia. “Esses resultados não são definitivos para humanos, até que as ideias sejam testadas em experimentos clínicos cuidadosamente controlados.”
Para evitar esse beco sem saída, oncologistas costumam optar por tratamentos mais agressivos, que dispensem um retorno aos remédios. Mas há chances de que a solução esteja justamente no caminho contrário: uma terapia com pausas programadas poderia adiar o desenvolvimento do tumor resistente. A conclusão é resultado de um estudo norte-americano publicado ontem na revista Nature, que observou a resistência à medicação em um grupo de ratos com câncer de pele.
Os cientistas submeteram um grupo de cobaias cancerosas a uma terapia direcionada por oito semanas e notaram que, depois de dois meses de tratamento, 20% deles desenvolveram resistência às drogas. Os tumores que permaneceram nesses animais foram implantados em outros ratos, nos quais o câncer resistente se desenvolveu. Como se esperava, esses bichos não responderam ao tratamento tão bem quanto o primeiro grupo.
Ao comparar os tumores dos dois tipos de cobaia, os pesquisadores notaram que ambos tinham quantidades similares do gene prejudicial que o remédio tentava destruir. Conhecido como BRAF, ele é responsável pelo crescimento das células. “O BRAF sofre mutação para assumir uma forma superativada em aproximadamente 50% dos tumores de melanoma. Tumores com essa mutação são extremamente sensíveis a inibidores, mas a resposta dura apenas alguns meses, quando a resistência se desenvolve”, explica Meghna Das Thakur, autora do estudo e pesquisadora no Instituto Novartis de Pesquisa Biomédica, nos Estados Unidos.
O estudo, no entanto, foi capaz de mostrar que os genes dos ratos menos suscetíveis ao tratamento produziam uma quantidade muito maior de proteínas que os outros. Essa diferença mostrou aos cientistas que esse gene continuava muito ativo, e que poderia estar até mesmo sendo beneficiado pela ação dos remédios.
A grande surpresa do experimento ocorreu alguns dias depois que os pesquisadores suspenderam o medicamento. Os tumores resistentes deram sinais de regressão, o que para eles mostrou que o gene BRAF havia se tornado dependente da droga, fazendo com que algumas células cancerosas morressem na ausência do medicamento. “No entanto, esse efeito parece ser passageiro, e as células do tumor se reestabeleciam na ausência da droga e começavam a proliferar”, ressalta Meghna. A partir dessa suposição, eles criaram dois tipos de tratamento: um contínuo, como o usado hoje em hospitais, e um intermitente.
Depois de 100 dias, as cobaias tratadas normalmente já mostravam sinais de resistência ao medicamento. Já os ratos que tinham pausas de alguns dias entre uma dose e outra da terapia ainda mostravam resposta às drogas passados 200 dias do início do tratamento. Para os pesquisadores, os resultados mostram que a terapia pode ser mais eficiente quando administrada com intervalos.
Referência Esses resultados, ressaltam os autores, são válidos apenas para o tratamento do melanoma pelo remédio vemurafenib. Mas a pesquisa pode ser usada como referência para o aperfeiçoamento do tratamento de outros tipos de câncer que também mostram resistência aos medicamentos voltados especialmente para combater cada um. Grande parte dos pacientes costuma sofrer com a falta de resultados mesmo depois de os tumores apresentarem uma diminuição drástica na primeira dosagem dos remédios.
Resistência Há várias formas de os pacientes de câncer se tornarem resistentes à terapia, e muitas delas envolvem alterações na expressão ou na atividade dos alvos das drogas. Dessa forma, o medicamento ainda afeta a pessoa doente, pois a resistência é formada diretamente nas células cancerosas, e não pelo organismo do paciente em si – um quadro que torna o tratamento mais sofrido que benéfico. Até hoje, as formas mais eficazes de evitar a resistência dos tumores é iniciar o tratamento ainda no início da doença ou usar várias drogas, que podem ser combinadas ou alternadas.
“Quase todos os pacientes, eventualmente, se tornam resistentes a drogas como o vemurafenib. Há vários tipos de mecanismos de resistência, que vão desde novas mutações à superexpressão de proteínas como a BRAF. Não há uma forma simples de explicar esse problema, mas suspeito que o melanoma avançado com diferentes mutações genéticas tenha mais chances de se tornar resistente a inibidores”, reflete o imunoterapeuta Jeffrey Weber, do H. Lee Moffitt Cancer Center & Research Institute.
De acordo com o especialista, que não participou do estudo, a suspensão do tratamento em pacientes humanos tem poucas chances de resultar numa regressão expontânea de tumores. Contudo, a ideia de testar uma terapia direcionada com intervalos poderia ter resultados positivos. “Em pacientes com o perfil desse artigo, a ideia de dosar o inibidor BRAF de forma intermitente faz sentido e devia ser formalmente testada. Eu suspeito que a resposta seria baixa em pacientes não selecionados, mas o artigo fornece um guia para a seleção de pacientes que podem se beneficiar da dosagem intermitente”, arrisca Weber. Ele ainda aponta que alguns oncologistas já haviam observado que o câncer pode voltar a responder ao medicamento quando há uma pausa de três meses no tratamento.
O experimento com ratos, no entanto, ainda não mostra qual seria o ritmo ideal de tratamento para uma terapia mais eficaz para humanos – um aspecto que deve variar para cada paciente. “É muito importante enfatizar que simplesmente não é possível comparar a duração da sobrevivência observada dos ratos com o que poderia ser observado em pacientes humanos numa dosagem intermitente”, alerta Martin McMahon, coautor do estudo e pesquisador da Universidade da Califórnia. “Esses resultados não são definitivos para humanos, até que as ideias sejam testadas em experimentos clínicos cuidadosamente controlados.”