Jornal Estado de Minas

Paranoia cresce nas redes sociais em dias de manifestações

Mensagens estranhas que circulam no Facebook fomentam teoria da caça às bruxas e alimentam boatos que vão desde espionagem de perfis até invasão de naves espaciais

Shirley Pacelli
Nestes dias em que as manifestações se multiplicam nas ruas, somado ao anúncio oficial da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sobre monitoramento na internet e às quedas de serviço do Facebook, não tardou a surgir a cultura da conspiração. Os temores têm até razão de ser, alimentados inclusive por recentes polêmicas envolvendo o governo norte-americano, acusado de espionar dados de milhões de usuários de redes como o Google e o Facebook, em um projeto chamado Prism.


No dia 21, o músico Luiz Gabriel Lopes recebeu em seu perfil no Facebook uma notificação de verificação de segurança com o título “Abranda”, escrito em português de Portugal. Vários amigos lhe contaram que também receberam a mensagem do site cujo sentido é “aja com cautela”. Além disso, Luiz Gabriel contou que eventos no site simplesmente sumiram e algumas pessoas tiveram dificuldade para postar (rede sobrecarregada?).
“Existe a suspeita de que esse aviso tem o objetivo de monitorar grupos de conversa, mas não tenho certeza. Recebi também opiniões contrárias falando que era antispam e que o Facebook estaria suando a camisa para dar conta do conteúdo que os brasileiros estão gerando nos últimos dias”, diz. Além do comunicado, ele recebeu um e-mail bastante técnico sobre o qual, confessa, não entendeu muita coisa. O texto dizia que, devido a um bug, outros usuários, ao recorrer a uma ferramenta específica, receberam informações extras e podem ter tido acesso a dados sigilosos dele.

Na verdade, o e-mail tem a ver com uma falha de segurança do site, que expôs números de telefone e endereços de e-mail de aproximadamente 6 milhões de usuários. A rede enviou comunicado para todos os afetados. O White Hat, programa que oferece recompensa a pesquisadores que encontrarem problemas no Facebook, foi responsável por encontrar a falha. A empresa garantiu ter corrigido o problema em menos de 24 horas após tomar conhecimento do fato e não haver evidência de que o bug tenha sido explorado maliciosamente.

Luiz Gabriel se diz preocupado pois é sabido que as redes têm compromisso principal com o lucro e que as políticas de privacidade são bastantes controversas. “Os dados são usados para publicidade e isso já é terrível. Mas a situação se torna inadmissível quando há invasão de privacidade por parte de órgãos governamentais, criando um ambiente de paranoia”, ressalta. Ele acredita que o país está vivendo um momento em que é preciso resguardar a privacidade da troca de informações, uma vez que as redes sociais se transformaram em ferramentas de grande potencial de exercício democrático.

Juarez Fernandes se diverte com os boatos que chegam em sua página no Facebook - Foto: Arquivo PessoalTROLLS? Enquanto usuários curtem e compartilham notícias, fotos e vídeos sem verificar a fonte da informação, Juarez Fernandes Barbosa Júnior, social media de 28 anos, se diverte. “Gente, me contaram aqui que tem 32 naves espaciais em cima da minha casa e 12 ônibus espaciais da Nasa. Estão planejando um golpe, saiu até na imprensa”, brincou em um post no seu perfil. O social media acredita que há muita especulação sobre o monitoramento nas redes, mas há também muito absurdo. Ele conta que, quando amigos próximos divulgam inverdades, faz questão de corrigi-los.

Para Juarez, na maior parte dos casos, como o assunto (manifestações) é muito relevante e todo mundo está falando sobre isso, o site entende como spam e deleta posts por considerá-los como suspeitos. “Foi a mesma coisa na época do Orkut, sobre aquela história de poder mudar a cor de fundo. Tenho certeza que tem um troll por trás dessas coisas”, afirma.


Avisos de verificação de segurança do Facebook e de %u201Csumiço%u201D do evento %u201CAssembléia Popular Horizontal de BH%u201D são recebidos por usuários - Foto: Reprodução de internetAnti-spam no Face

O Facebook define como spam “o contato repetitivo com as pessoas oferecendo conteúdo ou solicitações indesejadas. Isso inclui o envio de mensagens em massa, publicações excessivas de links ou imagens nas linhas do tempo das pessoas e envio de solicitações de amizade a pessoas não conhecidas pessoalmente”. O envio de spam é uma violação dos padrões da comunidade do Facebook.


Para Fábio Assolini, da Kasperky Lab, verificação contra spam explicaria mensagem de segurança do Facebook - Foto: Kasperky/DivulgaçãoO Estado de Minas fez testes com as palavras-chave que seriam, na opinião de usuários, chamarizes para bloqueios de contas e sumiços de posts, como, por exemplo “Força Nacional”. Não houve nenhuma censura aos posts ou mensagens. Para Fábio Assolini, analista sênior de malware da Kaspersky Lab, são várias as situações que podem gerar a mensagem de segurança recebida por Luiz Gabriel. A mais comum é quando o usuário envia a mesma mensagem, com o mesmo conteúdo, para diferentes contatos; seja via chat ou postando em alguma página ou comunidade. O Facebook interpreta isso como suspeito e pede que o usuário digite a série de letras aleatórias, que em linguagem técnica é conhecida como CAPTCHA.


Segundo Assolini, essa ação de segurança visa barrar a ação de worms que poderiam enviar milhares de mensagens automaticamente para os contatos, em curto espaço de tempo, e para coibir a ação de spammers. Somente um ser humano pode reconhecer e digitar o CAPTCHA – mecanismos automatizados não podem fazê-lo facilmente.


Para o sumiço de posts, há mais de uma explicação. A mais óbvia é a de que o dono a apagou. A segunda possibilidade é que muitos usuários tenham denunciado o conteúdo e, como o sistema é automatizado, o Facebook o retira do ar e só depois analisa a situação. Os protestos envolvem muitas questões políticas e instigam a troca de denúncias em massa entre grupos contrários.


Assolini afirma que o sistema de retirada automática de posts suspeitos funciona bem contra malwares, mas acaba afetando conteúdo legítimo. “Com qual critério eles analisam, eu não sei dizer”, pondera. A terceira opção é que o conteúdo tenha código malicioso. A própria Kaspersky tem cooperação com o site e reporta warms. O bloqueio temporário e a lentidão nos acessos tem a ver com o volume compartilhado na rede, afinal todas as mobilizações estão sendo combinada via rede social. 

 

PRISM
Em resposta oficial à polêmica internacional do escândalo do Prism, o diretor de Segurança do Facebook, Joe Sullivan, afirmou que proteger a privacidade dos usuários é prioridade para a empresa. “Nós não disponibilizamos a qualquer organização governamental o acesso direto aos servidores do Facebook. Quando são solicitados dados ou informações sobre indivíduos específicos, examinamos cuidadosamente qualquer pedido e fornecemos informações apenas na medida exigida pela lei.” O posicionamento oficial foi confirmado por Mark Zuckerberg em seu perfil no site (https://on.fb.me/11KD84E).