A invenção, batizada de Portactil, é uma das diversas inovações apresentadas em uma exposição especial no Congresso Internacional Software Livre e Governo Eletrônico (Consegi), realizado na Escola de Administração Fazendária (Esaf), na semana passada. É com o software livre que o mouse-leitor foi criado, assim como vários outros programas e equipamentos projetados para abrir portas para pessoas com algum tipo de deficiência. Ao serem alterados, executados e até mesmo distribuídos livremente, esses programas dão um novo sentido à acessibilidade, que não é mais limitada por licenças ou preços restritivos.
O leitor em braille criado no Instituto Federal do Ceará (IFCE), por exemplo, foi projetado como um acessório de apoio ao tablet, mas já ganha status de leitor digital de bolso. Conectado à prancheta digital via bluetooth, o aparelho comanda um texto que aparece na tela e é lido, letra por letra, por uma voz feminina. Sozinho, o mesmo equipamento oferece uma entrada de fone de ouvido e outra de cartão de memória, no qual podem ser armazenadas centenas de livros com áudio e braille em arquivos de formato aberto.
O ritmo da leitura é comandado por botões ou por um acelerômetro, que permite avançar o texto com um movimento de pulso. “Essas plataformas de leitura existem apenas em desktops. O tablet e o leitor dão mobilidade ao deficiente visual”, compara Anaxágoras Girão, do IFCE. Em parceria com Elias Júnior, da mesma instituição, ele também criou uma bengala que se comunica por bluetooth com um smartphone para guiar cegos. O acessório se localiza por meio de tags de identificação por radiofrequência, que ficam instaladas sob o piso táctil para deficientes visuais já usado em prédios públicos e calçadas.
Poder da mente
Entre as várias invenções apresentadas no Espaço de Robótica e Inovação, destaca-se a preocupação com a acessibilidade de pessoas que sofrem com problemas como deficiência visual ou paralisia. Adaptando ideias e máquinas que são bastante familiares ao público, os pesquisadores mostram como é possível criar novas formas de mobilidade e inclusão digital. O conceito guiou o trabalho de conclusão de curso de Felipe Nascimento e Felipe Santos, formados pelo Centro Universitário do Pará (Cesupa). Eles dedicaram dois anos de estudo a um projeto que tinha como objetivo transformar uma cadeira de rodas comum em um acessório totalmente automatizado e movido por nada mais que o pensamento.
Um conjunto de sensores é colocado sobre a cabeça do usuário, que só precisa pensar na direção desejada para mover a cadeira elétrica. As impressões neurais são lidas como em um exame de eletroencefalograma e traduzidas por um algoritmo de reconhecimento de padrão. “O impulso de movimentação ativa as mesmas áreas, mas de formas diferentes. Treinamos a pessoa para cada direção, como ela precisa se concentrar para andar. Quanto mais treinamento, mais controle ela vai ter”, explica Felipe Nascimento. O equipamento, construído peça por peça, tem preço estimado em R$ 4 mil, menos da metade do preço de uma cadeira elétrica comum.
Na tela O programa desenvolvido por Sebastião Fonseca, do Serpro de Belém, também tem como público-alvo as pessoas com mobilidade reduzida — mas a movimentação que ele oferece está na tela do computador. Com o auxílio de uma simples câmera digital de baixa resolução, o sistema permite que o usuário mova o cursor da máquina apenas com os movimentos da cabeça. A seta viaja conforme a pessoa olha para um lado ou outro da tela e clica quando pousa sobre um botão por muito tempo. O sistema também pode ser usado, demonstra Sebastião, para digitar letras em um teclado digital e emitir mensagens pelas caixas de som do computador ou até mesmo via mensagem de texto para um parente ou cuidador. “Ele ainda não foi testado com deficientes, mas é funcional”, garante o criador, que faz parte do Comitê do Software Livre.
Sistemas operacionais inclusivos encontram grande apoio em softwares livres, que oferecem acessibilidade com a simples combinação de um computador comum e um programa de baixo custo. É essa vantagem que Claudio Dallalana, do Serpro do Rio de Janeiro, empregou no Sistema Interativo de Navegação no Linux (Sinal). O pesquisador desenvolveu um sistema operacional para deficientes visuais que dispensa instalação. “Geralmente, alguém precisa preparar o computador para o deficiente visual, que deve esperar o trabalho do técnico”, justifica Dallalana.
O Sinal consiste em um conjunto de ferramentas criadas para cegos reunidas em um CD, que são acessadas e comandadas por atalhos no teclado. O pacote inclui até mesmo assistente para impressão em braille e um editor de texto com suporte em áudio. O disco, projetado para máquinas com o sistema operacional Linux, só precisa ser inserido no computador para funcionar. A mídia pode ser usada em computadores de familiares, de empresas e até mesmo de lan houses, sem necessidade de substituir os sistemas originais.