Engenheiros da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, anunciaram nesta semana a criação do primeiro computador com tecnologia à base de nanotubos de carbono. A máquina, descrita na revista Nature, permite a execução de duas tarefas intercaladas (multitasking) e pode ser o marco de uma nova era da computação. Acredita-se que a substituição do silício pelo novo material pode dar um fim ao aquecimento excessivo de máquinas e resultar em dispositivos muito mais rápidos e menores.
Os nanotubos são minúsculos cilindros feitos de folhas de carbono. É como se uma rede ultrafina de futebol, com vértices de carbono, fosse enrolada, resultando num material que combina altíssima resistência com leveza. “Eles têm propriedades mecânicas excelentes. É difícil comprimi-los, mas a elasticidade deles é muito grande”, descreve Fernando Lázaro Freire Junior, professor de física da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Desde a divulgação das propriedades do material, há mais de 20 anos, uma grande expectativa foi criada sobre as possibilidades que ele poderia trazer à eletrônica. Os tubos são tão pequenos que poderiam multiplicar em muitas vezes a capacidade de um chip de silício comum, e com um desempenho bastante superior. O nanomaterial surpreende pela alta condutividade, o que permitiria ligá-lo e desligá-lo com rapidez surpreendente — na prática, isso significa realizar tarefas eletrônicas com muito mais rapidez, como uma pessoa com um cérebro de raciocínio mais rápido que o comum. Contudo, os tubinhos se mostram muito difíceis de serem domados, o que tem adiado os planos de aplicá-los a supercomputadores. O feito da equipe de Stanford, portanto, tem sido considerado um passo importante nessa busca, apesar de ainda não ter resultado em um processador muito veloz.
Soluções
O maior feito dos cientistas foi ter resolvido dois problemas que vinham sendo a pedra no sapato dos engenheiros, mesmo depois de décadas de pesquisa. O primeiro é que alguns dos nanotubos sempre saíam defeituosos, sem a capacidade de alternar seu estado entre ligado e desligado (isto é, agindo mais como um fio elétrico do que como um semicondutor). “Já que a mãe-natureza produz os nanotubos, eles nem sempre se desenvolvem exatamente como queremos”, explica Max Shulaker, estudante de doutorado em engenharia elétrica e um dos autores do trabalho.
Os tubos problemáticos eram como mangueiras com vazamentos que não podiam ser consertados. Então, os especialistas resolveram simplesmente eliminá-los. O processo de faxina criado por eles consiste em “desligar” todos os tubos funcionais e aquecer os problemáticos com eletricidade até que se transformassem em vapor de CO2. O tratamento é relativamente simples e corrige o problema em um conjunto de bilhões de componentes de uma só vez.
O segundo problema era a dificuldade de deixar os transistores alinhados. Como são muito pequenos, tendem a ficar for a de lugar. Os engenheiros resolveram essa questão com a ajuda de um algoritmo. O cálculo de simulação apontou formas de corrigir o desalinho que causava o defeito. O “design à prova de imperfeições”, de acordo com os pesquisadores, pode ser aplicado em escala industrial.
Primeiro passo
Com apenas 178 transistores, o primeiro computador de nanotubos está longe de ter o poder de processamento necessário para superar as máquinas atuais, que contam com bilhões desses componentes eletrônicos. O sistema operacional também é rudimentar e pode realizar somente tarefas simples, como contar ou separar números. Mas o modelo tem seu valor por provar que o complicado nanomaterial tem aplicação prática.
“Nosso computador é o que se chama de um Turing completo, o que significa que é o mais genérico possível de se produzir”, descreve Shulaker. A performance foi limitada, de acordo com o pesquisador, não pela matéria-prima, mas pela falta de equipamentos adequados à nanoprodução em um laboratório de universidade.
O constante processo de aceleração e miniaturização das máquinas resulta em processadores cada vez mais compactos, que acabam perdendo em desempenho e desperdiçando energia na forma de calor. Nenhum desses problemas existiria com os nanotubos. “Esse trabalho mostra que, com esforço e pesquisa, há chances de termos computadores melhores. Mas, para o usuário doméstico, o horizonte para chegar a isso é demorado”, alerta Fernandes, que estima ao menos mais duas décadas de espera até que o computador feito com o novo material chegue ao mercado.