PARIS - Os modestos 1% a 3% do genoma dos neandertais sobreviventes nos humanos modernos provavelmente ajudaram os primeiros "Homo sapiens" a se adaptar a uma Europa fria, dando-lhes dar uma pele mais espessa, anunciaram cientistas em dois estudos publicados na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos.
Os cientistas acreditam que os humanos tenham adquirido o DNA dos neandertais através da miscigenação entre 40.000 e 80.000 mil anos atrás, o que resultou nas populações atuais da Europa e do leste da Ásia.
Nativos africanos têm pouco ou nenhum DNA dos neandertais, pois seus ancestrais não se misturavam com os neandertais, que viviam na Europa e na Ásia.
A mais recente pesquisa mostrou que a influência do DNA dos neandertais nos humanos não se distribuiu de forma uniforme no genoma humano.
Dois estudos em separado publicados esta quarta-feira, um na revista científica britânica Nature e outro, na americana Science, reportaram ter encontrado concentrações de DNA de neandertais nos genes que influenciam a característica de pele e cabelos.
Segundo os autores do artigo da Nature, entre outras coisas, estes genes influenciam a produção de queratina, proteína fibrosa que dá resistência à pele, aos cabelos e às unhas e pode ter fornecido um isolamento maior em um clima mais frio à medida que o "Homo sapiens" migrou para o norte, após deixar a África.
"Sendo assim, os alelos (variações genéticas) dos neandertais que afetam a pele e os cabelos pode ter ajudado os humanos modernos a se adaptar a ambientes não africanos", destacou o estudo.
"É tentador pensar que os neandertais já estavam adaptados ao ambiente não africano e forneceram este benefício genético aos humanos", acrescentou o co-autor David Reich, professor de genética da Escola de Medicina de Harvard.
Uma pesquisa recente concluiu que os humanos devem de 2% a 3% de seu genoma aos neandertais, mas estes estudos se intitulam os primeiros a demonstrar o efeito biológico que esta transferência genética teve no desenvolvimento humano.
Além da influência na pele e nos cabelos, eles descobriram que os neandertais também conferiram um risco para problemas de saúde como o diabetes tipo 2 e a doença de Crohn.
A equipe encarregada do estudo da Nature incluiu cientistas de Harvard, Instituto Broad em Cambridge e Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva na Alemanha, analisou e comparou os genomas de 846 pessoas de origem não africana, 176 africanos e um neandertal de 50.000 anos.
Os autores do artigo publicado na Science usaram simulações estatísticas com o sequenciamento genético de 379 europeus e 286 asiáticos e um neandertal para chegar à mesma conclusão sobre a influência do nosso primo distante em genes relacionados com a pele e o cabelo humanos.
Mais adiante, eles concluíram que até 20% do genoma neandertal poderia se reconstituído hoje ao acrescentar a totalidade da assinatura do DNA remanescente nos humanos modernos.
"Se você analisar um número suficiente de indivíduos (que estimamos em cerca de 2.000), seria teoricamente possível identificar todo o genoma dos neandertais que ainda persistem nos humanos modernos", explicou por e-mail à AFP Benjamin Vernot, do departamento de Ciências Genéticas da Universidade de Washington, co-autor do artigo da Science.
"Infelizmente, é difícil diferenciar o DNA do neandertal do DNA humano, apenas simplesmente porque é muito similar ao nosso. Então, enquanto deve haver 50% de genoma de neandertal ainda flutuando no genoma dos humanos modernos, nós só conseguimos identificar 20%", prosseguiu.
Os cientistas identificaram entre 300 e 400 genes por indivíduo que seriam pelo menos parcialmente de neandertais, afirmou, mas isto varia de pessoa a pessoa.