Pedro Cerqueira
Segundo o professor Marcelo de Paula Corrêa, autor do estudo, é a primeira vez que essa quantidade relevante de informações sobre radiação solar ultravioleta no Brasil é reunida. “Até então, todas as recomendações que eram feitas sobre a exposição ao sol usavam informações coletadas, principalmente, nos Estados Unidos e na Europa”, explica. Parte dos dados sobre a incidência de radiação ultravioleta foi obtida com medições “in loco”, enquanto modelos matemáticos que se baseiam em diversos parâmetros (como o conteúdo de ozônio, a incidência de nuvens e a poluição) complementaram as informações para todo o Brasil e a América do Sul.
O modelo de medição é considerado muito confiável, segundo o pesquisador. A explicação sobre os níveis elevados de radiação UV no Brasil é a localização geográfica do país, que favorece o registro de uma das maiores incidências observadas no mundo. “As pessoas costumam associar a grande incidência de radiação solar com praia e com a Região Nordeste do Brasil, mas constatamos que, no verão, o Sudeste recebe uma quantidade de radiação maior que no Nordeste”, afirma Corrêa.
No Rio Grande do Norte, por exemplo, às 9h já existe uma incidência de radiação ultravioleta que exige uma proteção intensa, com índices ultravioleta máximos entre 13 e 14. Por outro lado, em São Paulo, esse mesmo índice pode atingir índice 15 no verão. Então, é preciso que as pessoas que vão se expor ao sol tenham muito bom senso, pois essa radiação vai variar de acordo com o horário, o lugar e as características da atmosfera (a incidência de nuvens, por exemplo).
A pesquisa repercutiu na classe médica e a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) logo divulgou o Consenso Brasileiro de Fotoproteção, documento atual e baseado na realidade brasileira. A publicação, anunciada no fim do ano passado e retratada pelo Estado de Minas, confirma que os parâmetros usados até então pela categoria para fazer recomendações sobre as formas e horários mais adequados à exposição ao sol eram retirados de revistas internacionais dos Estados Unidos ou da Europa, e que os poucos estudos publicados revelam que a radiação solar no Brasil é muito superior à observada nesses países. A SBD chegou a recomendar mais estudos sobre a realidade brasileira, a fim de produzir políticas públicas mais adequadas.
Horários
Além de não recomendar a exposição ao sol entre as 10h e as 15h (sendo que o horário de verão deve ser considerado), dependendo da época do ano e a localidade é preciso se precaver num período ainda maior. No Nordeste, por exemplo, é melhor evitar o sol a partir das 9h. Já no Centro-Oeste, é necessário estender esse período até as 16h. E o resultado dessa falta de informação talvez esteja retratada no último relatório divulgado pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) em relação à estimativa de novos casos de câncer de pele no Brasil para 2014: 180 mil casos, nada menos que 31% do total de casos gerais da doença que devem ser registrados no ano.
Recomendações além dos cremes
>> Entre as principais recomendações feitas pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) está a utilização do protetor solar, cujo uso é considerado a medida central do programa nacional de fotoproteção. Pelas novas recomendações da SBD, o fator de proteção mínimo a ser usado é o 30. A entidade ainda chama a atenção dos indivíduos de pele negra, que, mesmo apresentando menor predisposição para o desenvolvimento do câncer de pele, não devem deixar de se cuidar. Para garantir a proteção, a aplicação do protetor deve ser feita na forma e quantidade adequadas, devendo ser reaplicado a cada duas ou três horas. Além disso, o uso de chapéus, bonés, óculos de sol e roupas adequadas é fundamental como a proteção solar com o creme ou loção.
>> Outra recomendação da SBD é a melhor divulgação do índice ultravioleta (IV), para que as pessoas possam se proteger. Da mesma forma como uma pessoa procura pela previsão do tempo para saber o que deve vestir e se será necessário levar o guarda-chuva numa viagem a turismo ou negócios, é possível acessar o site do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), para saber a radiação ultravioleta em todo o território nacional. O site do CPTEC/Inpe é o www.cptec.inpe.br. Para informações mais detalhadas sobre a radiação ultravioleta e a prevenção aos danos causados pelo excesso de exposição, o site do projeto Sol amigo (www.solamigo.org) traz uma série de informações em linguagem didática, incluindo atividades para a conscientização de crianças e adolescentes, faixas etárias mais sensíveis aos danos provocados pelo sol.
Três perguntas para... Carolina Marçon - Dermatologista e membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia
Com base nas medições feitas nessa pesquisa, o que mudou quanto à proteção que deve ser adotada ao se expor ao sol?
É preciso entender que, quanto maior é o índice UV, maior é o risco de desenvolver queimaduras e o câncer de pele. Quando o índice está acima de oito, já é considerado muito alto e é preciso se proteger. Só para ter ideia, na cidade de São Paulo esse índice anual é de 11. No Nordeste é 14. Isso nos leva a adotar o máximo de proteção entre as 10h e as 16h, mas principalmente entre as 11h e as 13h. Procure sempre pelas sombras, use filtro solar com fator de proteção solar de no mínimo 30, use chapéu e roupas que o protejam do sol.
Com o maior conhecimento a respeito da incidência da radiação UV no Brasil será possível reduzir os casos de câncer de pele?
Com certeza. O Brasil é um país peculiar porque está localizado numa região onde bate sol o ano inteiro. Isso faz com que não seja possível fazer as mesmas recomendações usando os dados de outros países. Por isso, e também devido às características diversas de pele que temos aqui, a Sociedade Brasileira de Dermatologia reuniu 25 especialistas da área que discutiram os temas mais polêmicos, de onde surgiu a publicação de um consenso de fotoproteção mais adequado à nossa realidade. E, com base nessas novas medidas, esperamos uma diminuição dos casos de câncer de pele.
O que pode ser feito para popularizar o uso do protetor solar, visto que seu preço não é acessível?
Existem diversos projetos de lei em tramitação que podem tornar o protetor solar mais acessível, desde propostas de redução de impostos, seu fornecimento para algumas categorias profissionais que trabalham diretamente expostas as sol, como os carteiros, até a distribuição para pessoas mais suscetíveis a desenvolver doenças relacionadas à exposição solar.