A dependência de combustíveis fósseis para geração de energia é o principal causador das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera. Enquanto na COP26, a conferência do clima da ONU, formuladores de políticas públicas buscam soluções para a descarbonização do mundo, nos laboratórios, cientistas estão atrás de tecnologias que tornem possível essa transição. Para isso, processos naturais como a fotossíntese têm sido uma importante fonte de inspiração.
Em Cingapura, cientistas da Universidade Tecnológica de Nanyang (NTU) apostam nas microalgas para reduzir a necessidade do uso de combustíveis fósseis. Em um estudo recente, publicado na revista ACS Applied Materials Interfaces, os pesquisadores demonstraram como o encapsulamento de uma proteína desses organismos pode aumentar em até três vezes as propriedades de coleta de luz e conversão de energia, produzida durante a fotossíntese.
De acordo com Chen Yu-Cheng, professor da Escola de Engenharia Elétrica e Eletrônica da NTU e principal autor do estudo, ao imitar como as plantas e outros organismos convertem a luz solar em energia, a fotossíntese artificial pode ser uma forma sustentável de gerar eletricidade que não depende de combustíveis fósseis ou gás natural, recursos não renováveis. Ele explica, porém, que um dos desafios desse processo é obter energia com a mesma eficiência de outras fontes movidas pelo calor do Sol, como os painéis solares. Em média, esses últimos têm uma classificação de eficiência de 15% a 20%, enquanto a da fotossíntese artificial é atualmente estimada em 4,5%.
"A fotossíntese artificial não é tão eficiente quanto as células solares na geração de eletricidade. No entanto, é mais renovável e sustentável", destaca o aluno de doutorado Yuan Zhiyi, que faz parte da equipe de pesquisa. "Uma nova tecnologia bioinspirada baseada no processo natural das microalgas poderia ser usada para fazer células solares mais eficientes e abrir caminho para uma maior eficiência na fotossíntese artificial. Usar algas como fonte de energia biológica é um tema popular de interesse em sustentabilidade e energia renovável, pois o uso delas potencialmente reduz a quantidade de subprodutos tóxicos criados na fabricação de painéis solares", destaca.
Proteína
O estudo analisou um tipo específico de proteína encontrada nas algas vermelhas. Chamadas de ficobiliproteínas, elas são responsáveis por absorver luz dentro desses organismos para iniciar a fotossíntese. Essas proteínas coletam energia luminosa de toda a faixa espectral de comprimentos de onda de luz, incluindo aqueles que as clorofilas absorvem mal, e a convertem em eletricidade. "Devido às suas propriedades fotossintéticas e emissoras de luz únicas, as ficobiliproteínas têm aplicações potenciais promissoras em biotecnologia e dispositivos de estado sólido. Aumentar a energia do aparelho de coleta de luz tem estado no centro dos esforços de desenvolvimento para dispositivos orgânicos que usam luz como fonte de energia", diz Cheng.
Para amplificar a quantidade de energia que as algas podem gerar, a equipe desenvolveu um método para envolver as algas vermelhas em pequenas microgotas de cristal líquido com tamanho de 20 a 40 mícrons e expô-las ao Sol. Quando a luz atinge a gota, ocorre um efeito pelo qual as ondas luminosas viajam ao redor das bordas curvas da gotícula. A luz fica efetivamente presa nessa cápsula por um longo período de tempo, proporcionando mais oportunidades para que a fotossíntese ocorra e, portanto, gerando mais energia.
A energia gerada durante a fotossíntese na forma de elétrons livres pode, então, ser capturada por eletrodos como uma corrente elétrica. "A gota se comporta como um ressonador que confina muita luz", diz Chen. "Isso dá às algas mais tempo de exposição à luz, aumentando a taxa de fotossíntese. Um resultado semelhante pode ser obtido revestindo a parte externa da gota com a proteína de algas também. Ao explorar as microgotículas como um transportador para biomateriais de coleta de luz, o forte aumento do campo elétrico local e o confinamento de fótons dentro da gota resultaram em uma geração de eletricidade significativamente maior", afirma.
As gotas podem ser facilmente produzidas a granel a baixo custo, tornando o método da equipe de pesquisa amplamente aplicável, destacam os pesquisadores. A maioria das células solares baseadas em algas produzem uma energia elétrica de 20 a 30 microwatts por centímetro quadrado. A combinação de algas-gotículas NTU aumentou esse nível de geração de energia em pelo menos duas a três vezes, em comparação com o processo natural.
Chen prevê a criação de "fazendas de algas", onde esses micro-organismos em crescimento poderiam eventualmente ser combinados com gotas maiores de cristal líquido para criar geradores de energia flutuantes. "As microgotas usadas em nossos experimentos têm o potencial de ser ampliadas para gotas maiores, que podem então ser aplicadas a algas fora de um ambiente de laboratório para criar energia. Embora alguns possam considerar o acúmulo de algas algo esteticamente feio, elas desempenham um papel muito importante no meio ambiente. Nossas descobertas mostram que existe uma maneira de converter o que alguns podem ver como 'biolixo' em bioenergia", conclui Chen.