Demonstração da prótese robótica de tornozelo.

Demonstração da prótese robótica de tornozelo.

(Aaron Fleming, NC State University)

Controlada por impulsos nervosos, uma prótese de tornozelo robótica que está sendo desenvolvida na Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, consegue replicar quase perfeitamente os movimentos naturais das articulações. Essa nova tecnologia, que tem foco em um membro pouco desenvolvido no âmbito dos protéticos, promete melhorar o equilíbrio e o movimento de pessoas amputadas. Por meio do controle neural realizado pelos sensores, o usuário pode restaurar uma gama de habilidades, como ficar de pé em superfícies desafiadoras, agachar-se e correr.

O projeto surgiu em 2017 e, hoje, se encontra na fase de testes clínicos. "Nossa motivação é simples: queremos melhorar a qualidade de vida dos indivíduos com membros amputados. Próteses de perna robóticas estão disponíveis comercialmente, mas sua função é limitada a prover assistência apenas no caminhar cíclico", diz a pesquisadora Helen Huang, uma das autoras do estudo, publicado, neste mês, na revista Science Robotics .

Em nota, Aaron Fleming, coautor do trabalho, explica que, basicamente, os sensores são colocados sobre os músculos na área da amputação. "Quando o usuário pensa em mover o membro amputado, os sensores captam os sinais através da pele e os traduzem em comandos para a prótese", completa. Esse controle acontece por intermédio da resposta de sinais eletromiográficos (EMG), que são detectados nos músculos do usuário.

Especialista em biomecânica do movimento humano com foco em reabilitação e professora da Universidade de Brasília (UnB), Claudia Ochoa Diaz explica que essa tecnologia é capaz de medir algumas variáveis, como aceleração e velocidade do caminhar. Com isso, é possível calcular, na prótese, as fases da marcha, permitindo o controle para que a movimentação consiga emular um passo ou um andar parecido com os de pessoas não amputadas.

Teste comparativo

Cinco pessoas que tiveram amputações abaixo do joelho ou em uma perna testaram a solução tecnológica e relataram melhoras significativas no equilíbrio e na estabilidade postural. Para isso, foram realizadas comparações entre as respostas dos participantes a situações que os desequilibraram em dois contextos: com as próteses que normalmente utilizam e com o protótipo.

Para os criadores da prótese robótica, o resultado mais impressionante é o progresso na postura dos usuários, que se tornou igual à de indivíduos não amputados e com articulações intactas. "Essa mudança foi percebida tanto na biomecânica (movimentos do corpo e força produzida) quanto no sistema nervoso interno que controla o corpo humano", diz Huang.

O cientista enfatiza que, costumeiramente, pessoas que sofrem amputações encontram dificuldades no controle de equilíbrio ao fazerem atividades cotidianas, como pegar uma criança no colo e se movimentar em uma fila. "Nós acreditamos que o controle neural pode melhorar a função das próteses robóticas para trazer mais autonomia para o dia a dia", aposta.

Avanço

Julian Machado, médico ortopedista do Hospital Santa Lúcia e diretor científico da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia do Distrito Federal, explica a importância do foco nesse tipo específico de prótese: "Os tornozelos e os pés eram menos priorizados do que os joelhos. Quando você pensa no tornozelo, temos os movimentos lateral, anterior ou posterior, e isso era perdido. Então, ficava aquele tornozelo rígido, duro, que só dá um passo para a frente".

De acordo com o especialista, o desenvolvimento do protótipo é um avanço importante no campo da ortopedia: "Com um tornozelo que mimetiza o movimento natural, você vai ter melhor equilíbrio corporal e balanço para caminhar, subir escadas, pisar em obstáculos e até mesmo correr", justifica. "O que a gente vê no cinema, de próteses que têm todos os tendões, todos os movimentos e toda a sensibilidade, é possível de se imaginar em um futuro não tão distante."

Palavra de especialista / Alta demanda

"Próteses de tornozelo e de joelho, ou seja, próteses transfemurais e transtibiais, são bastante demandadas. Há uma prevalência de doenças periféricas (nos membros inferiores) devido a condições como diabetes, além de traumas causados por acidentes e questões genéticas. Os tumores também são outra causa. Muitas vezes, as pessoas que têm próteses puramente mecânicas não conseguem ajustar seus parâmetros e começam a desenvolver estratégias de compensação, onde apoiam o peso corporal no membro preservado. Ali, começam a surgir algumas condições preocupantes, já que essa sobrecarga de peso pode ocasionar osteopenia e, possivelmente, osteoporose — ou seja, pode comprometer a densidade óssea das articulações. A pessoa desenvolve esses mecanismos por segurança porque ela sabe que a prótese não é inteiramente confiável."

Claudia Ochoa Diaz , especialista em biomecânica do movimento humano com foco em reabilitação e professora da UnB