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Estado de Minas PARAÍSO

Conheça o menor parque nacional do mundo

Antes local deserto e esquecido, a reserva ecológica paradisíaca da ilha de Moyenne é um lembrete de como eram as ilhas Seychelles antes da chegada dos turistas


28/03/2022 06:29 - atualizado 28/03/2022 10:52


Reserva ecológica da ilha de Moyenne
Antes um local deserto e esquecido, a reserva ecológica paradisíaca da ilha de Moyenne é um registro de como eram as ilhas Seychelles antes da chegada dos turistas (foto: imageBROKER/Alamy)

Alguém que compra uma ilha tropical normalmente está em busca de luxo. Mas Brendon Grimshaw era diferente, assim como Moyenne, a ilha no arquipélago das Seychelles comprada por ele.

Grimshaw chegou pela primeira vez às Seychelles — um arquipélago composto por 115 ilhas no Oceano Índico, das quais apenas oito são permanentemente habitadas — em 1962, de férias.

Na época, ele trabalhava como editor para alguns dos maiores jornais do leste africano. Era uma época empolgante na África e, como parte do seu trabalho, ele mantinha boas relações com o novo e carismático líder que se tornaria presidente da Tanzânia, Julius Nyerere.

Mas Grimshaw procurava algo mais do que apenas férias. A Tanzânia havia declarado independência no ano anterior. Um ano depois, seria a vez do Quênia. E Grimshaw, que era inglês, sabia que empregos como o seu em breve passariam para os habitantes locais.

Sabendo que logo ficaria desempregado, Grimshaw procurou um novo rumo para sua vida, que o levasse para mais perto da natureza. Ele sonhava em comprar terras nas ilhas Seychelles — mas o ideal seria comprar sua própria ilha.


Moyenne
A ilha de Moyenne é um pontinho com 0,099 quilômetros quadrados perto da costa da maior ilha das Seychelles, Mahé (foto: imageBROKER/Alamy)

Nas suas primeiras semanas nas Seychelles, Grimshaw começou a imaginar se precisaria mudar de planos. Não havia muitas ilhas à venda, e os preços das poucas existentes eram extremamente altos.

No penúltimo dia das suas férias, um jovem aproximou-se dele na capital das Seychelles, Vitória, e, do nada, perguntou se Grimshaw queria comprar uma ilha. Eles viajaram juntos para Moyenne — um pontinho de 0,099 quilômetros quadrados a 4,5 km ao norte da costa da maior ilha das Seychelles, Mahé.

Grimshaw apaixonou-se imediatamente pelo silêncio e pelo emaranhado de vegetação selvagem do local. Mais tarde, ele diria que era perto o suficiente para ter fácil acesso à ilha principal do arquipélago, mas ainda ficava a um mundo de distância.

"Era totalmente diferente. Uma sensação especial", disse ele à equipe de filmagem que produziu ali um documentário em 2009. "Este é o lugar que eu estava procurando."

Faltando quatro minutos para a meia-noite do último dia das suas férias nas Seychelles, Grimshaw assinou o contrato de compra de Moyenne por 8 mil libras (cerca de R$ 57 mil). A ilha era dele. Mas comprar Moyenne acabaria sendo uma tarefa mais fácil que cuidar da ilha.

A recuperação da ilha

Exceto por uma família de pescadores que vivia por lá, Moyenne estava abandonada há décadas. Com o turismo começando a decolar nas Seychelles, parecia apenas questão de tempo até que alguém limpasse o terreno para construir ali um hotel cinco estrelas.


 ilha de Moyenne
Houve época em que a ilha de Moyenne tinha tanta vegetação que os cocos que caíam nunca chegavam ao solo (foto: PhotoStock-Israel/Alamy)

Moyenne é uma das menores ilhas internas das Seychelles. Mede apenas 400 metros de comprimento por 300 metros de largura — e seu litoral tem menos de 2 km. Seu ponto mais alto eleva-se a apenas 61 metros acima do nível do mar.

A ilha de Moyenne possui a mesma areia branca paradisíaca e os penhascos de granito característicos da costa das Seychelles, mas também abriga um paredão denso e contínuo de árvores que recobrem a ilha, formando uma pirâmide baixa acima do nível da água. É um turbilhão de verde em contraste com o céu de cobalto e o mar azul-safira, parecendo uma minúscula floresta tropical que emerge do oceano.

Apesar do diminuto tamanho de Moyenne, a restauração da beleza natural da ilha foi uma tarefa colossal. Uma combinação de intervenções humanas violentas seguidas por abandono havia deixado a ilha desordenada e ofegante em busca de ar.

Ervas daninhas sufocavam a cobertura vegetal. Dizem que a ilha tinha tanta vegetação que os cocos que caíam nunca atingiam o solo. No emaranhado de ervas, observava-se a ausência de pássaros, enquanto ratos se abrigavam na vegetação.

Para ajudar Grimshaw, havia um nativo chamado Rene Antoine Lafortune, filho de um pescador local, então com 19 anos. Os dois tornaram-se inseparáveis e juntos imaginaram como transformar a ilha, limpando o mato, plantando árvores e abrindo caminhos pela vegetação.

O trabalho era meticuloso e exaustivo, mas tornou-se a obsessão de Grimshaw pelo resto da sua vida.

Preservar para as futuras gerações

O objetivo inicial de Grimshaw era proteger a ilha de Moyenne contra o desenvolvimento excessivo.

A princípio, isso significava revelar a beleza natural da ilha e construir uma pequena casa onde ele pudesse viver o resto dos seus dias.

Mas seu sonho de longo prazo era criar um paraíso natural que sobrevivesse a ele e permanecesse protegido por muito tempo, ao longo das gerações.


Brendon Grimshaw
Brendon Grimshaw era um editor de jornais que se tornou ambientalista (foto: Marion Kaplan/Alamy)

"O seu sonho era deixar uma ilha preservada para as futuras gerações de habitantes das Seychelles e para o mundo", afirma Suketu Patel, que conheceu Grimshaw em 1976 e virou seu amigo pelo resto da vida.

"Ele queria uma mini-Seychelles. Queria tentar reproduzir o que eram as ilhas Seychelles antes da chegada dos turistas."

Mas nem tudo era trabalho duro. Ao aparar o excesso de vegetação no canto noroeste da ilha de Moyenne, Grimshaw encontrou dois túmulos com a inscrição: "Infelizmente desconhecidos".

Ele estava certo de que piratas de séculos atrás foram enterrados ali — uma das praias no norte da ilha é conhecida como a Baía dos Piratas.

Reza a lenda que os túmulos pertenciam a dois modestos bucaneiros que foram mortos por dois líderes famosos da pirataria, para que os espíritos dos homens mortos assombrassem a ilha e protegessem o tesouro.

Não se sabe se Grimshaw realmente acreditava nestas lendas.

"Para ele, era engraçado levantar-se de manhã e perguntar: 'O que vou fazer hoje? vamos procurar o tesouro'", relembra Patel.

Existem hoje dois locais marcados nos mapas da ilha de Moyenne com o símbolo da pirataria, onde Grimshaw e Lafortune tentaram a sorte procurando o tesouro escondido dos piratas, sem nunca encontrá-lo.


Reserva da ilha de Moyenne
A ilha de Moyenne parece uma minúscula floresta tropical emergindo do oceano (foto: PhotoStock-Israel/Alamy)

À medida que o turismo nas Seychelles crescia na década de 1980, e o arquipélago se tornava sinônimo de paraíso tropical, investidores voltaram seus olhares gananciosos para a ilha de Moyenne.

Grimshaw recebeu ofertas de até US$ 50 milhões (cerca de R$ 270 milhões) para vender a ilha, mas resistiu a todas as tentativas.

Enquanto a idade de Grimshaw avançava, ele se conscientizava cada vez mais que lhe restava pouco tempo para proteger o futuro da ilha.

Ele não tinha filhos para quem transferir a custódia de Moyenne e, quando Lafortune morreu em 2007, decidiu agir.

Com Patel e outros, ele formou um fundo permanente para proteger a ilha e, em 2009, assinou um acordo com o Ministério do Meio Ambiente das Seychelles que incluiu a ilha de Moyenne como parte do Parque Marinho de Saint-Anne, mas com status especial.

Assim nasceu o Parque Nacional da Ilha de Moyenne — o menor parque nacional do mundo.

Pode parecer fácil imaginar Grimshaw como uma figura excêntrica. Afinal, ele se mudou sozinho para o outro lado do mundo, comprou uma ilha, acreditava em piratas e passou a vida restaurando um ponto de terra aparentemente irrelevante.

Mas muitos habitantes das Seychelles ainda são gratos pelo legado que Grimshaw deixou para a nação que adotou.

"Pessoalmente, não acho que ele fosse maluco", afirma Isabelle Ravinia, da Administração dos Parques Nacionais das Seychelles.

"Ele devolveu a ilha ao país, o que foi um ato nobre. Normalmente, as pessoas tentariam vender a ilha antes de morrer para conseguir dinheiro para outra coisa. Em vez disso, ele fez algo incrível."

Grimshaw morreu em 2012. Seu corpo foi enterrado ao lado do túmulo do seu pai (que foi viver com ele na ilha) e dos dois piratas desconhecidos. Atendendo a seu pedido, o túmulo de Grimshaw tem a seguinte inscrição: "Moyenne o ensinou a abrir os olhos para a beleza à sua volta e agradecer a Deus".

Em seu testamento, ele expressou seu último desejo: "A ilha de Moyenne deve ser mantida como um local de oração, paz, tranquilidade, relaxamento e conhecimento para os cidadãos das Seychelles e para os visitantes estrangeiros de todas as nacionalidades, cores e credos."


Moyenne, a ilha
Graças ao trabalho de Grimshaw e Lafortune, a ilha de Moyenne hoje é cortada por trilhas naturais (foto: PhotoStock-Israel/Alamy)

A continuidade do trabalho de Grimshaw

A tarefa de atender ao desejo de Grimshaw agora está a cargo da Fundação Ilha de Moyenne, administrada por Patel.

Exceto por um restaurante chamado Jolly Roger, que serve pratos locais como peixe grelhado e frutos-do-mar com curry e molho crioulo vermelho, um pequeno museu dedicado à vida de Grimshaw e dois berçários para filhotes de tartarugas gigantes, Moyenne permanece preservada.

A ilha não tem porto, e chegar até lá tem uma magia toda especial. Em nenhum outro ponto das ilhas Seychelles você tem a sensação de descoberta de uma ilha deserta como ao desembarcar descalço nas águas rasas da costa de Moyenne.

Ao chegar à terra firme e dar os primeiros passos ao longo da trilha levemente inclinada em meio à floresta, as árvores se fecham atrás de você e um novo mundo se abre à sua frente.

Raios de sol coloridos se infiltram pela copa das árvores até o solo, a temperatura é mais baixa, e as 16 mil árvores da ilha — mogno, mangueiras, mamoeiros e palmeiras — plantadas por Grimshaw e Lafortune te rodeiam.

Há uma estimativa que diz que Moyenne tem mais espécies vegetais por metro quadrado que qualquer outro parque nacional do mundo.

De vez em quando, você pode ter seu caminho bloqueado por uma das cerca de 50 tartarugas-gigantes-de-aldabra que vivem livremente em Moyenne. Elas não têm pressa — e nem você deve se apressar enquanto as vê passar.

De volta às águas rasas nas praias da Baía dos Piratas, observe as tartarugas-de-pente que frequentemente visitam o local para desova.


Tartaruga-gigante-de-aldabra na reserva ecológica da ilha de Moyenne
Cinquenta tartarugas-gigantes-de-aldabra perambulam livremente pela ilha de Moyenne (foto: Kit Day/Alamy)

Mesmo durante a alta temporada, dificilmente há mais de 50 visitantes na ilha ao mesmo tempo — e nunca mais de 300 ao longo de um dia.

Seis ilhas compõem o Parque Marinho de Saint-Anne, mas Moyenne é a única, além da minúscula Ilha Cachée, que não possui hotéis ou outra forma de propriedade privada.

E, graças a Grimshaw e seus amigos, Moyenne provavelmente permanecerá assim.

"Existe algo que te conquista quando você vai até lá", afirma Patel.

"Se você acha que tem um grande problema, quando você está na ilha percebe que aquilo, no fim das contas, não é um problema. Moyenne é a vida como deveria ser."

Leia a íntegra desta reportagem (em inglês) no site BBC Travel.

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