À primeira vista, não há nada particularmente notável nestes vermes.
A forma em larva da mariposa Galleria mellonella, também conhecida como traça do favo de mel ou traça da cera, se alimenta da cera que as abelhas usam para fazer seu favo de mel. Para os apicultores, são pragas das quais tentam se livrar rapidamente, sem pensar duas vezes.
Mas em 2017, a bióloga molecular Federica Bertocchini, que na época estava pesquisando o desenvolvimento embrionário de vertebrados no Conselho Nacional de Pesquisa Espanhol, se viu diante de uma descoberta potencialmente revolucionária ambientalmente envolvendo estas criaturas.
Apicultora amadora, Bertocchini se deparou com estas larvas por acaso, quando estava limpando sua colmeia.
"Coloquei os vermes em um saco plástico e, em pouco tempo, percebi que eles estavam fazendo buracos (no plástico)", diz ela em entrevista à BBC Earth.
Havia algo que fazia o plástico se degradar ao entrar em contato com a boca deles.
"Foi um verdadeiro momento eureka — foi incrível", lembra Bertocchini, se referindo à descoberta inicial e à noção do que aquilo significava.
"Foi o começo da história. O começo do projeto de pesquisa, de tudo."
As larvas estavam fazendo algo que nós, como seres humanos, achamos extremamente difícil de fazer: decompor o plástico, que leva de várias décadas a séculos para se decompor completamente.
Bertocchini e seus colegas pesquisadores começaram a coletar o líquido excretado da boca das larvas. Eles descobriram que esta "saliva" continha duas enzimas cruciais, chamadas Ceres e Demeter — em homenagem às deusas romanas e gregas da agricultura, respectivamente —, que eram capazes de oxidar o polietileno no plástico, essencialmente decompondo esse material ao entrar em contato com ele.
"Leva algumas horas, em temperatura ambiente, em solução aquosa", ela explica.
Além disso, as larvas pareciam estar digerindo o plástico como se fosse comida.
"Quando o verme come o plástico e começa a decompô-lo, seu intestino reage praticamente como se estivesse comendo um alimento normal. Isso significa que há algo acontecendo com a fisiologia do animal que extrai algo dessa biodegradação do plástico. E ele simplesmente continua, como se fosse uma dieta normal", afirma Christophe LeMoine, professor de fisiologia comparativa na Brandon University, no Canadá, à BBC Earth.
Inspirado pelas descobertas de Bertocchini, ele também começou a estudar estas larvas.
"Descobrimos que o plástico permitiu a elas reter toda a gordura e, presumivelmente, continuar com o seu ciclo de vida", acrescenta.
Basicamente, estas larvas estão se entupindo de tudo que veem pela frente, antes de se transformarem em mariposas, momento em que não comem mais, apenas se reproduzem.
"Eu sempre as chamo de gônadas que voam, porque é tudo o que elas fazem", brinca LeMoine.
Deixar estes vermes soltos em um ambiente poluído por plástico pode ser perigoso para os ecossistemas, dada especialmente sua capacidade de destruir colmeias de abelhas, como observa Bertocchini. Mas ela tem esperança de que as enzimas que estas larvas produzem possam no futuro ajudar a combater a poluição por plástico a nível mundial.
Há, portanto, uma corrida em andamento para descobrir como este mecanismo funciona.
"Essa é a pergunta de um milhão ou um trilhão de dólares, porque uma vez que descobrirmos isso, vamos poder decompor um trilhão de dólares de plástico", pontua LeMoine.
Bertocchini é agora diretora de tecnologia da startup de biopesquisa Plasticentropy France — ela trabalha com uma equipe para estudar a viabilidade de aplicar essas enzimas para uso generalizado na decomposição do plástico.
"O objetivo principal é ser capaz de aplicar essas enzimas aos resíduos plásticos", explica Bertocchini.
"Eu quero muito que esta descoberta e tecnologia sejam desenvolvidas e transformadas em uma solução que possamos usar globalmente."
Mas, afinal, por que o plástico é tão difícil de decompor?
Na natureza, a maioria das coisas se decompõe porque organismos decompositores quebram as ligações químicas que mantêm uma substância unida.
Eles evoluíram ao longo de milênios para decompor tudo o que encontram pela frente. Até que surgiu o plástico — que apesar da má reputação atual, conquistou o mundo.
Os plásticos são constituídos por longas cadeias de polímeros com ligações muito fortes. E um dos segredos para quebrar estas ligações é a oxidação.
É isso que as larvas parecem estar fazendo com a saliva, introduzindo moléculas de oxigênio no plástico.
"E isso, às vezes, é alcançado no meio ambiente por meio da luz, por exemplo, da alta temperatura. E esse é o gargalo. Demora um pouco porque o meio ambiente tem seu próprio tempo", explica Bertocchini.
"Então o que as larvas fazem é simplesmente introduzir uma molécula de oxigênio. E, em algumas horas, em vez de meses ou anos, ou seja lá o (tempo) que for. É uma forma de resolver o gargalo desta reação."
Enzimas promissoras para esta finalidade podem ser encontradas em vários organismos diferentes. Na verdade, já foram identificadas mais de 30 mil enzimas, capazes de digerir 10 tipos diferentes de plásticos.
Alguns fungos e bactérias são conhecidos por digerir plásticos, mas isso é muito mais raro em animais complexos. Em 2022, foi descoberto que outro invertebrado também gosta de plástico – o "superverme" Zophobas morio, que pode engordar com uma dieta de poliestireno.
Já uma bactéria encontrada no estômago das vacas pode ser usada para digerir poliéster.
Mas uma que está gerando bastante interesse por parte dos pesquisadores é uma bactéria chamada Ideonella sakaiensis, e sobretudo sua enzima PETase.
O plástico tipo PET, mais comum em garrafas plásticas, leva centenas de anos para se decompor no meio ambiente. Mas a PETase é capaz de decompô-lo em questão de dias.
Atualmente, são produzidas 400 milhões de toneladas de resíduos plásticos globalmente todos os anos.
Deste total, de 19 a 23 milhões de toneladas (o equivalente a cerca de 2 mil caminhões de lixo) se infiltram nos ecossistemas aquáticos, onde grande parte é colonizada por micro-organismos ou comida por animais.
Serão necessárias uma série de medidas globais para reduzir a nossa dependência e consumo de plástico. Para isso, muitos países se comprometeram a ajudar a reduzir a produção e utilização de plásticos descartáveis, e um tratado global sobre plásticos é esperado para o fim de 2024.
Mas se enzimas como estas puderem em algum momento ser produzidas em massa para decompor plástico, as pequenas criaturas que mastigaram a sacola de Bertocchini talvez também possam desempenhar um papel importante nisto.
Leia a íntegra desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.