Antecipando-se à posse de Donald Trump, e apesar de Javier Milei, Mercosul e União Europeia avançaram em acordo histórico de livre comércio, que teve negociações iniciadas há 25 anos, ainda sob o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). É resposta à ascensão do nacionalismo econômico e às novas lufadas de acentuado protecionismo comercial que vêm do Norte, com a imposição de barreiras comerciais mais rígidas, segundo tem reiterado o presidente eleito dos Estados Unidos. Para além do fator Trump, outro importante catalisador ao interesse máximo e definitivo da Europa no Mercosul: a expansão da presença da China no continente, competidor tecnológico global, que está à frente da Iniciativa Cinturão e Rota da Seda (ICR).
A avaliação é de Alexandre Brito, economista, doutorando em Relações Internacionais, consultor e professor da PUC Minas. Brito acompanhou desde 2006 a discussão do acordo Mercosul e União Europeia, no âmbito da Coalizão Empresarial Brasileira – fórum da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que debate, se posiciona e apresenta ao governo federal os interesses da indústria brasileira nas negociações internacionais. Há nessa coalizão dois blocos de interesses: os setores agroindustrial e mineral, mais ofensivos, querem ganhar acesso aos mercados; já os setores de máquinas e equipamentos, eletroeletrônicos e químico são mais defensivos, têm maior interesse na proteção.
“Com os EUA prontos para recorrerem às tarifas comerciais contra China, México e outros países, e dado o enfraquecimento das instituições multilaterais de promoção do comércio, esse acordo é contraponto que se reveste de particular interesse geopolítico”, analisa Brito. Por um lado, a União Europeia tenta manter a sua influência na nova ordem econômica, em um mercado importante e de grande similaridade política e cultural. De outro, mantém abertos os canais de abastecimento de matérias-primas e destino de capitais e investimentos, em uma região relativamente segura do ponto de vista jurídico, e na mira de robustos investimentos chineses.
O acordo, que no contexto europeu enfrenta, pelo momento, a oposição da França, da Áustria e da Polônia – e a indecisão da Itália e dos Países Baixos –, ainda precisará ser aprovado no Conselho da União Europeia (27 membros) e, na sequência, pelo Parlamento Europeu. França, Áustria e Polônia ainda não reúnem 35% da população e mais de 45% do PIB para barrar o acordo. Os indecisos, governados pela extrema direita, tendem a ser mais críticos, mas a indústria italiana tem forte interesse nesse acordo, sobretudo a indústria automobilística.
Há ganhos geopolíticos e ganhos econômicos relativos para ambos. Brasil é forte na agroindústria e produtos como soja, café, celulose e minério deverão ter as alíquotas zeradas logo após a ratificação. Haverá um cronograma para zerar as alíquotas, de forma escalonada, em até 15 anos. Entre setores mais fragilizados, no caso mineiro, estão o de produção leiteira e químico. Mas o acordo é positivo por reforçar a competitividade da agroindústria, mesmo que a cota para as exportações e importações de cada produto não seja grande. E, no caso particular do aço mineiro, não enfrentará problemas com o acordo, pois a indústria siderúrgica europeia já não é forte.
Sendo europeus os principais players da indústria automobilística brasileira, o setor poderá se beneficiar da integração, com a organização do mercado, optando pela maior produção de carros populares no Mercosul e de luxo na Europa. E, por uma questão de competitividade, outros países desejarão também buscar acordos com o Mercosul. O primeiro a ser firmado deverá ser com Suíça, Noruega e Islândia, países da Área Europeia de Livre Comércio (EFTA), avalia Alexandre Brito. Contudo, críticos consideram que tal acordo poderá enterrar a indústria mais sofisticada brasileira. A ver.
Em números
Principal parceiro comercial e de investimentos do Mercosul, as importações da União Europeia originárias do bloco foram de US$ 55,8 bilhões em 2023, ou seja, 12,8% de todas as exportações do Mercosul. Por outro lado, as vendas da União Europeia para o Mercosul totalizaram US$ 59,4 bilhões, que representam 0,85% de todas as exportações europeias.
Queijo mineiro
Se ratificado o acordo Mercosul-União Europeia, o setor lácteo poderá importar, sem tarifa, uma cota de 30 mil toneladas. Há contudo, proteção das indicações geográficas: o queijo do Serro não poderá ser fabricado na União Europeia; assim como o Camembert não pode ser fabricado no Mercosul.
Ferrovias
O ex-deputado estadual João Leite (PSDB) vai assumir, nesta terça-feira, a vice-presidência da Associação Nacional de Ferrovias Autorizadas (ANFA), criada para impulsionar a infraestrutura do país por meio das ferrovias, aposta para reduzir o custo Brasil e ampliar a competitividade dos produtos brasileiros.
Golpes digitais
O advogado Alexandre Atheniense, especializado em direito digital, é o autor da obra “Golpes digitais” (Conhecimento, 2024). Em extenso estudo de 351 processos julgados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo entre 2020 e 2023, Atheniense sistematizou oito tipos de golpes: boleto falso; falso leilão; motoboy; WhatsApp; falsa vaga de emprego; empréstimo; perfil falso; e SIM Swap. Até 2030, segundo estimativa de estudos especializados, os golpes digitais vão provocar prejuízo de R$ 3,3 bilhões.
Liberdade de expressão
O Instituto Brasileiro de Perspectivas em Educação e Liberdade (Ibpel) lançará, na Academia Mineira de Letras, sob organização de Humberto Lucchesi de Carvalho e Roberto Miglio Sena, nesta terça-feira, o livro “A liberdade de expressão em seus variados aspectos” (Dialético). São dez artigos de 12 autores especialistas na temática.
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Licitação suspensa
Ao acompanhar o relatório do desembargador Pedro Bitencourt Marcondes, a 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve a suspensão da licitação aberta pela Loteria Mineira, com o propósito de contratar empresa para explorar com exclusividade o sistema de jogos. A exigência do edital de uma certificação específica a ser apresentada pelas concorrentes – a WLA-RFG, Nível 4 – foi considerada não condizente com a realidade competitiva do mercado. Poucas empresas da América do Sul a possuem. Nem a Caixa Econômica Federal é nela creditada.