O Supremo Tribunal Federal (STF) foi avançando na discussão sobre a inconstitucionalidade do uso de drogas, visto que se trata de autolesão. Assim como não é crime cortar o próprio braço, bater a cabeça na parede ou se jogar de uma ponte, também não há de ser crime usar drogas.
Entretanto, o debate no STF levou a uma rápida reação do Congresso, que se apressou em fazer tramitar uma PEC para incluir na Constituição que é crime qualquer quantidade de droga, ainda que para consumo próprio. Ou seja, o Brasil caminha a passos largos na contramão do mundo, e parece que pouca gente está disposta a refletir sobre isso.
O problema é que no Brasil tudo vira torcida de futebol. Coloca-se qualquer tema aleatório na mesa (não importa qual), e ninguém quer pensar! Se a esquerda é a favor, então a direita é contra. Se a direita é a favor, então a esquerda é contra.
Só que ninguém avaliou se a ideia é boa ou não, de modo que estamos vivendo um mundo fantástico, onde só servem as pessoas que acreditam que “seu lado” nunca erra e o “outro lado” erra sempre. Como disse um sábio uma vez, não temos a menor chance de dar certo.
Aos que ainda pretendem um lampejo de reflexão, os países que estão legalizando as drogas não estão fazendo isso por progressismo ou porque têm governos goodvibes. Isso é puro suco de capitalismo e cálculo econômico.
A proibição estatal de qualquer coisa é incapaz de fazer com que essa coisa desapareça do mundo. Esse raciocínio é infantil. Eu tomo mais de 1 litro de café por dia. É droga, vicia e se ficar sem tomar a cabeça dói e fica tudo meio lento.
Se o Estado proibir o café amanhã, eu vou, sem a menor dúvida, procurar algum fornecedor ilegal para me vender café e vou continuar nutrindo meu vício. Àqueles que acham que uma proibição legal vai impedir o comércio de qualquer coisa, passou da hora de desligar do fantástico mundo de Bob e retornar para Terra.
Ou seja, em alguma mansão muito luxuosa agora tem um traficante com uma taça de champanhe em uma mão e um charuto na outra brindando a PEC do Tráfico. Estou falando de traficante de verdade, não esses pés de chinelo, operários do crime, que morrem e são substituídos aos lotes todos os dias.
Eles são os únicos beneficiários dessas medidas. Quanto mais proibido, mais caro, menos concorrentes, mais monopólio, mais poder e mais dinheiro. Se libera, aparece um monte de concorrente de porta aberta com vitrine na Zona Sul. Nesse cenário distópico, o traficante sangra.
Ele não morre, porque ilícito sempre vai existir. Mas a receita dele vira pó. Com a opção pela legalidade, o playboy maconheiro filhinho de papai que precisa manter a reputação ilibada para assumir os negócios do pai vai pensar duas vezes antes de se expor. Pronto, receita a menos.
Sem dinheiro, esse povo vai fazer o quê? Os americanos já nos ensinaram há mais de 100 anos: siga o dinheiro. Corte a verba, e cobra morre. Nesse caso, pega essa verba ilícita que alimenta uma maquinaria enorme lavagem de dinheiro, tráfico de armas, milícias e compra de políticos e transfere para a iniciativa privada lícita. Faz virar emprego, renda, tributo e movimentação da economia.
Além disso, imagina quantas vidas de policiais e de pessoas inocentes seriam poupadas com a interrupção de uma guerra burra, inútil e invencível. Ou seja, não tem maluquice nenhuma no raciocínio. Pelo contrário, é pura lógica.
Mas não... A gente quer agradar o traficante de garantir que é tudo dele! Até porque a classe que financia esse massacre diário vai continuar financiando porque ela não vai parar de comprar drogas. A cada grama de droga comprada, tem um inocente morrendo, uma mãe enterrando um filho, uma tropa enterrando um irmão de farda e uma sociedade se enfiando buraco adentro para políticos inflamados sustentarem seus discursos.
Esse caso mostra a urgência de a esquerda e a direita pararem de disputar quem grita mais alto para entender o país que vivemos e as consequências reais das escolhas que fazemos. Ao mesmo tempo, o cidadão precisa parar de torcer para políticos e começar a analisar as consequências reais das manifestações dos seus políticos.
A droga pode ser uma arma de autolesão ou de lesão de terceiros. É uma questão de escolha, e estamos escolhendo errado. Por isso, continuamos seguramente sem a menor chance de dar certo.