Recentemente estamos acompanhando a discussão no Congresso Nacional sobre a votação, dentre outros temas, da reforma tributária e o pacote de corte de gastos do governo. Isso você já sabe. O ponto que pretendo discutir aqui é a relação de institucionalidade do Congresso com o Executivo que deixa qualquer turma da 5ª série “comendo poeira”.
O Congresso está ameaçando boicotar o pacote de corte de gastos e da reforma tributária porque uma decisão do STF, de relatoria do Min. Flávio Dino, determinou que as emendas de relator (as famosas emendas pix) sejam publicadas no Portal da Transparência. Estamos em um momento de “briga de campo de futebol do jardim da infância” onde uma criança é dona da bola, outra criança prefere handball do que futebol e uma terceira criança chutou a bola no lote da vizinha.
O problema é que este campinho se chama Brasil e essa bola é caríssima para o pagador de impostos. A reforma tributária já é de uma timidez constrangedora (com o perdão do trocadilho proposital) e o pacote de corte de gastos parece o seu tio pagando a parcela mínima do cartão de crédito para chegar com o carro zero na festa da família que já esteja com mandado de busca e apreensão emitido.
Ou seja, se passar, ainda estamos todos esfolados. Ocorre que se não passar o cenário é ainda mais caótico. Se vivêssemos em um país sério, o Congresso estaria se esfolando porque a reforma tributária nem chega perto de ofertar a segurança jurídica que o cidadão precisa e nem passa perto de reduzir a carga tributária.
Se o cidadão não fosse tratado como burro de carga pelo Estado para bancar gastos descontrolados, o Congresso estaria escancarando que o Executivo está muito longe de cortar gastos essenciais para controlar as contas públicas. Estaríamos falando que descontrole de gastos públicos impede investimento real no que precisa (como educação, saúde e segurança), aumenta a inflação e deixa a população pobre ainda mais pobre.
Mas não... isso é de somenos importância. O problema todo é que as emendas enviadas pelos parlamentares, algumas de forma muito pouco republicana, agora vão precisar ir para o Portal da Transparência! Quem diria isso né... imagina que coisa louca: ter que explicar quem mandou, quem recebeu e como foi gasto dinheiro público, retirado de forma coercitiva do cidadão!
Soa tão nonsense que se abre uma margem nunca dantes vista de incredulidade acerca do senso de realidade das instituições brasileiras. E isso é tão óbvio que há muitos parlamentares que, espontaneamente, divulgam quem são os beneficiários das suas emendas parlamentares.
Para estes, a decisão do STF tem zero impacto e deveria ser assim com todos. Qual a dificuldade de apontar quem são os beneficiários do dinheiro do cidadão que é gerido livremente pelo Poder Legislativo? Em qualquer Estado civilizado do mundo, o uso do dinheiro é submetido a mecanismos de escrutínio e fiscalização, para que o eleitor possa saber quais são os interesses atendidos pelos parlamentares eleitos quando do uso da sua prerrogativa institucional.
Entretanto, por vezes parece que o interesse do cidadão que banca a existência do Estado é de somenos importância. Antes eu dizia que no Brasil, que não é terra para amadores, o óbvio tem que ser dito. Agora parece que chegamos ao ponto de que o óbvio já não é óbvio mais e precisa ser reconstruído.
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