Pessoas se reúnem durante um evento noturno eleitoral após os primeiros resultados do segundo turno das eleições legislativas na França                  -  (crédito: Geoffroy VAN DER HASSELT / AFP       )

Pessoas se reúnem durante um evento noturno eleitoral após os primeiros resultados do segundo turno das eleições legislativas na França

crédito: Geoffroy VAN DER HASSELT / AFP

A economia é prima-irmã da política e, por mais que os economistas não sejam qualificados para discussões políticas mais profundas, são mínima ou pretensamente capazes de relacionar os efeitos da política sobre a economia e vice-versa. As eleições na Europa (Reino Unido e França), a disputa presidencial nos Estados Unidos e a queda de braço entre os presidentes do País e do Banco Central, no Brasil, são alguns dos fatores mobilizadores do cenário político atual.


Recentemente, o jornal The Guardian apresentou um léxico político para definir as ideologias da extrema direita, da direita radical e do populismo que caracterizam os partidos políticos da Europa. Com base no projeto “The PopuList”, criado por mais de cem cientistas políticos de mais de trinta países, o léxico traz definições que, muito embora aplicado à Europa, traz fortes identidades em todo o Ocidente.


De acordo com o léxico do “The PopuList”, a direita radical carrega duas ideologias predominantes: o nativismo e o autoritarismo. Define-se nativismo como a “crença de que os estados devem ser habitados exclusivamente por membros do grupo nativo”. Ao autoritarismo, atribui-se a crença “em uma sociedade estritamente ordenada”, na qual são impostas infrações linha dura para a garantia do cumprimento da lei e da ordem.

 


Adicionalmente a essas ideologias, a extrema direita e a direita radical pretendem acabar com a democracia. Nas três modalidades políticas, há consenso em capturar o Poder Judiciário e a mídia, usurpar órgãos constitucionais e, em muitos dos partidos, atacar a sociedade civil que defende a integração da política e da economia europeia.


Há duas semanas, a França gerou fortes tensões políticas com o resultado do primeiro turno de suas eleições legislativas, antecipadas em três anos pelo Presidente Macron em um gesto autoritário e arriscado. O resultado final não foi o esperado pelo atual dirigente francês, nem tampouco pelas pesquisas que colocavam a extrema direita no poder. O povo francês mostrou seu apreço aos valores de igualdade, fraternidade e liberdade. Venceu a democracia!


Na prática, a França terá um parlamento bem dividido, muito embora a maior bancada seja da coalização de esquerda, seguida pela coalização do partido do Presidente Macron, de centro direita, mas com expressivo crescimento da bancada de extrema direita. As composições parlamentares atuais, na Europa, têm criado cada vez mais desafios para os líderes do Executivo. Fenômeno semelhante tem se verificado em todo o Ocidente. O mundo segue polarizado!


Muitas são as razões para o crescimento da polarização, e os cientistas políticos são os “experts” para decifrarem como os movimentos políticos têm levado a movimentos sociais caracterizados pela divisão e pela desintegração das sociedades. Sem sombra de dúvida, o aumento das desigualdades sociais e o não cumprimento das agendas prometidas em campanha vêm alimentando a descrença e promovendo o radicalismo nas sociedades, em especial no Ocidente.


Especificamente no Brasil, podemos afirmar que, desde a eleição presidencial de 2014, o Brasil vive intenso cenário de polarização política, acirrado nas eleições de 2018 e ainda mantido nas eleições de 2022. Internamente, o clima segue com fortes tensões que só geram prejuízos à parcela mais frágil nesse arranjo: a sociedade civil. Exemplo recente foi o conturbado cenário politico que pressionou o câmbio (dólar) e gerou tensões no mercado financeiro.


O Banco Central do Brasil (BCB), instituição dita “independente”, viu seu presidente envolvido em agenda político-partidária incompatível com seu cargo. O Presidente da Nação, querendo enfrentar a politica de juros do BCB, pagou por falar o que não devia, com decisão unânime do BCB pela manutenção da atual taxa de juros - trágica para as contas públicas sob a ótica do equilíbrio fiscal, além dos efeitos nefastos sobre a atividade econômica.


No centro da polarização, habita a incapacidade de gestão dos dirigentes ante os Parlamentos constituídos pela insatisfação de uma sociedade nostálgica, que (i) ora opta por pactos antidemocráticos apoiando partidos supremacistas; (ii) ora opta por partidos de ideologias religiosas que distorcem os valores humanos com manipulações e crescente aumento do poder; e (iii) ora acredita que as esquerdas ainda são capazes de cuidar das agendas sociais.


O filósofo e historiador Yuval Noah Harari, em artigo publicado na revista The Economist, na semana passada, afirmou que “a humanidade também enfrenta as ameaças existenciais adicionais da mudança climática e da Inteligência Artificial (IA) fora de controle (...). Os robôs assassinos estão chegando, mas os humanos estão paralisados pela discordância” (tradução livre).


Não há dúvida de que o prejuízo da polarização recai, ao final, sobre a maioria da população que se constitui como massa de manobra daqueles que têm sede de poder e utilizam, cada vez mais, de ferramentas de IA e propagação de fake news para expandirem seus domínios políticos. Que os sinais da França sejam sopro de esperança e ecoem sobre as democracias do mundo todo! Afinal, igualdade, liberdade e fraternidade deveriam se constituir como lema de todas as nações.