Originalmente, a floresta se estendia por 1,3 milhão de quilòmetros quadrados, mas hoje restam apenas 24% da Mata Atlântica, de acordo com dados da Fundação SOS Mata Atlântica. 
 -  (crédito:  Felipe José Ferreira/Wikimédia Commons)

Mata Atlântica

crédito: Felipe José Ferreira/Wikimédia Commons

Na semana passada, a sociedade americana reforçou a “lógica darwinista do capital” quando optou pela volta de seu ex-presidente, Donald Trump, ao governo dos Estados Unidos. Trocando em miúdos, a sociedade americana parece ter optado pela força bruta do capital para tentar manter sua soberania, elegendo o fim dos acordos climáticos, dos direitos de refúgio e dos lentos avanços de redução das desigualdades de raça/cor e gênero.

 

Em seu primeiro mandato, o então presidente Trump saiu do Acordo de Paris em aceno claro de seu total desprezo às questões climáticas. Reforçou, em sua campanha atual, seus interesses em retomar e expandir as produções baseadas em energias fósseis e, simultaneamente, deixou bem claro o endurecimento de sua política migratória que, já no mandato anterior, havia causado graves violências aos direitos humanos. É a força do capital em sua vertente destrutiva!

 

Aliás, se tem algo que caminha de mãos dadas é o desrespeito ao meio ambiente e aos seres humanos que a defendem. Os números da Global Witness sobre os assassinatos de defensores do meio ambiente, em 2023, mostram o quanto a violência está inserida nos espaços que precisam e devem ser preservados. Em 2023, 196 defensores do meio ambiente foram assassinados enquanto exerciam seus direitos de protegerem suas terras.

 

 

Em 2023, a Global Witness estimou que 85% dos assassinatos se deram na América Latina, sendo que os dois países com as maiores ocorrências foram Colômbia, com 79, e Brasil, com 25 assassinatos. Além disso, o relatório aponta que 43% dessas vítimas eram povos indígenas e 6%, afrodescendentes. Em suma, metade dos assassinatos eram de pessoas estruturalmente mais vulneráveis.

 

Cerca de um ano antes do início da Organização Não Governamental (ONG) inglesa Global Witness, surgiu, no Brasil, a ONG “Nossas”, com pautas voltadas para a justiça e a equidade em suas diversas formas de expressão democrática. Ambas combinam pautas que se entremeiam, tais como direitos humanos e ambientais.

 

A ONG Nossas tem feito intensa campanha contra o Projeto de Lei (PL) 2159, de 2021, que está em vias de ser votado no Senado Federal. O PL 2159/2021 prevê a simplificação do licenciamento ambiental para atividade que seja efetivamente poluidora e/ou capaz de degradar o meio ambiente. Um contrassenso em plena crise climática e de necessidade de mudança de rumo nas práticas ambientais.

 

No entanto, as forças antagônicas são a tônica dos processos democráticos, considerando-se que a força do capital é, majoritariamente, exercida para garantir ou preservar interesses privados que pouco ou nada dialogam, via de regra, com interesses coletivos. Nesse jogo de forças, na iminência de se votar o PL 2159/2021, surge o Projeto de Lei Complementar (PLP) 176, de 2024, com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento de atividades sustentáveis.

 

A proposição do PLP 176/2024 contou com a colaboração do Instituto Escolhas, associação civil sem fins lucrativos, que há 9 anos produz estudos sobre temas ligados ao desenvolvimento sustentável. No caso específico do PL 176/2024, o objetivo é (i) destinar parcelas cada vez maiores, das carteiras de financiamento dos bancos de desenvolvimento, para atividades sustentáveis; e (ii) promover forte alteração na estrutura de governança dessas instituições financiadoras.

 

Enquanto o setor privado estruturado segue com suas estratégias de cumprimento de normas de governança e inclusão, com forte conotação de atendimento às exigências das regras de mercado, os governos vêm se mostrando hesitantes e os organismos internacionais seguem melindrosos na busca por confluências de visões e ações, e com baixa capacidade de liderar novos arranjos entre os setores.

 

 

Se, por um lado, o PLP 176/2024 ousa propor escalonamento do financiamento dos bancos de desenvolvimento às atividades econômicas, com vistas a tornarem suas carteiras 100% voltadas às atividades de baixo impacto ambiental, até 2045, por outro, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) se vangloria de ter financiado mais de US$2 bilhões, em 2023, para atividades sustentáveis – valor equivalente a cerca de 13% de sua carteira. Notemos, aí, o abismo dos propósitos!

 

O capital tem força dicotômica: é capaz de construir e destruir. E essa aparente contradição tem origem no próprio funcionamento global do sistema econômico: são nas sociedades com sistemas democráticos e capitalistas mais solidificados, nas chamadas economias centrais, que o capital produz, sobre os países menos estruturados (periféricos), a “antidemocratização” do capital.

 

Volto à ideia original do título desta coluna, à noção análoga ao darwinismo aplicada à capacidade de detenção do capital. Sob a lei do mais forte, tem se construído pressões climáticas e precárias formas de vida social. A privação tornou-se força motriz do darwinismo do capital revelada por meio das enchentes, dos deslocamentos e das buscas por refúgios e por todas as formas de sentido das chamadas vidas periféricas.

 

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O antropólogo e economista inglês Jason Hickel afirmou que “o capitalismo produz demasiado, mas também não produz o suficiente das coisas certas”. O retorno de Trump reforça a apreensão sobre essa distopia econômica que tem destruído todo e qualquer senso de humanidade e de bem-estar comum. Nesse “distópico pseudo darwinismo” do aprimoramento das sociedades capitalistas, o perigo maior é ser engolido por sua própria fome de viver. A natureza tem orquestrado sua fatura!