Na era digital, regressamos às formas de relações sociais típicas da Idade Média. Essa é a tese central do livro Technoféodalisme: Critique de l'économie numérique (Tecnofeudalismo: crítica da economia digital, em tradução livre), do professor e economista francês Cédric Duran.

A partir de uma análise consistente e bem fundamentada, o pensador nos ajuda a refletir a respeito dos níveis de vigilância, exploração, dependência e controle produzidos por grandes empresas de tecnologia, como Google, Facebook, TikTok e OpenAi, apenas para citar alguns exemplos.

 



Para o autor, a ideia de que entramos em uma era de avanço ou progresso não passa de uma ilusão criada para sustentar uma nova forma de relação social que, na verdade, aponta para o retorno às condições similares à exploração e ao domínio exercido pelos senhores feudais.

O Tecnofeudalismo, conceito criado por Duran e apresentado ao longo de sua obra, é caracterizado pela exploração de dados e alto grau de dependência de tecnologias digitais. Assim, os gigantes da tecnologia lutam para aumentar seus territórios (físicos e virtuais), coletando dados pessoais para criar “produtos e serviços” que tornam seus usuários cada vez mais aprisionados a essas plataformas. Dessa forma, eles agem de forma idêntica às práticas feudais, típicas do período medieval.

Essa nova roupagem do capitalismo, que se renova regredindo, facilita o acúmulo territorial e financeiro, aumentando a concentração de riquezas. Esses novos “senhores” passam a controlar, cada vez mais, uma quantidade maior de “feudos” e, de quebra, ainda passam a dominar um exército de servos dependentes de sua “proteção” e “subsistência”.

Em outras palavras, estamos voltando às condições de submissão e dominação das quais lutamos tanto para nos libertar. Porém, agora com uma roupagem mais leve, com a impressão de que podemos sair dessa situação a qualquer momento, o que torna a resistência ao novo modelo social mais difícil ainda.

Parece óbvio, mas precisamos sempre nos lembrar (e o professor Duran faz isso muito bem) de que a tecnologia não é uma atividade neutra. Como toda forma de produção social, ela está a serviço de ideologias e interesses que, na maioria das vezes, não são evidentes. No caso do tecnofeudalismo, uma coisa é certa, ela não tem como objetivo melhorar a condição de vida de seus “servos-usuários”.

A mão invisível dos algoritmos garante sustentação econômica aos gigantes digitais, alimentando suas forças improdutivas no domínio da economia, da cultura, da política e da ética. Dessa forma, ao contrário de nossos amigos medievais, temos uma relação mais totalitária, que invade todos os espaços vitais, fazendo, inclusive, com que os Estados percam completamente sua força.

Assim, a economia tecnofeudal, ao invés de cumprir a promessa da redenção do ser humano mediante as novas tecnologias, tem como objetivo promover a restauração de monopólios, dependências de toda ordem, manipulações políticas, privilégios e facilitação da vigilância que permitirá aos novos “tecno-oligarcas” serem senhores não apenas de um território em algum continente isolado, mas donos do destino de homens e mulheres em todo o planeta.

Na era tecnofeudal nos encontramos diante uma situação-limite: decidir se entregar à alienação das novas formas de dominação ou tentamos resistir em nome da liberdade, que, como nos ensinou Cecília Meireles, é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.

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