Tudo bem que essa incubadora de imbecis que chamamos de rede sociais tem nos abobalhado -  (crédito: Pixabay)

Tudo bem que essa incubadora de imbecis que chamamos de rede sociais tem nos abobalhado

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Desejar filhos é coisa de gente grande. E não falo aqui de riqueza, estatura ou idade, mas de grandeza espiritual mesmo. Perceba que destaco o fator “desejo” e não o ato de realmente tê-los. Isso porque muitos, por questões biológicas ou de planejamento familiar, não podem realizá-lo. No entanto, o simples ato de desejá-los é parte de um processo de crescimento.

 

 

Em um mundo infantilizado, crianças não são bem-vindas. Parece contraditório, não é? Mas precisamos destacar a diferença entre infância e infantilização. A primeira diz respeito a um tempo de vida. A segunda define um tipo de gente que só não quer crescer mesmo pois isso é muito difícil.

 

Ao voltar das férias, percebi que há um processo cultural de infantilização em jogo. De restaurantes do Bob Esponja às pizzarias do Harry Potter (locais em que fui levado via condução coercitiva pelos meus meninos), o público era majoritariamente adulto.

 

Lógico que cada um faz o que quer com seu próprio dinheiro, mas confesso que experimentei algum estranhamento, principalmente quando ia tirar fotos e percebia que, na fila, as crianças incomodavam o ambiente instagramável dos meninos e meninas de 30, 40 e 50 anos.

 

Tudo bem que, por vezes, um roubo de batatinha do irmão agitava o local. Mas nessa hora invocava a sabedoria milenar: um filho faz de você um pai; dois fazem de você um eterno juiz. E eles corriam, brincavam de pega-pega e aproveitavam o ambiente que, teoricamente, era convidativo às práticas infantis. O problema é que isso atrapalhava um pouco a mesa ao lado, espécie de távola redonda onde Millenials e Geração Z discutiam seriamente se a “vassoura do bruxo” era de floresta mágica ou replantada.

 

 

 

Tudo bem que essa incubadora de imbecis a que chamamos de rede sociais tem nos abobalhado com dancinhas de trinta segundos e aulas de história com bonecos de massinha, mas agora parece que o negócio tomou as ruas.

 

Olhar para uma criança, quando não se é uma delas, exige compromisso ético, responsabilidade demais para quem precisa de aplicativo para tomar decisões e vive no negacionismo moral dos influencers, uma espécie de anti-iluminismo que despreza a conquista da autonomia.

 

Estamos imersos em um conflito de duas temporalidades: o ciclo biológico e a história individual. A primeira, regida pela natureza, segue sem culpa o som da coreografia da vida. A segunda, cheia de fantasias e ideações, tenta construir uma existência sem incômodos e, portanto, irreal.

 

A natureza segue seu tempo próprio, geralmente cíclico, convidando-nos a nascer, crescer, reproduzir e morrer. Tomar consciência disso faz parte dada angústia humana. Por isso que tentamos controlar, a todo momento, nossa biografia. Outros, com procedimentos estéticos e escolhas medrosas, tentam fugir disso.

 

Muitos e muitas deixarão o tempo passar, na esperança de ser possível conciliar natureza e cultura. No entanto, a realidade é cruel. Óvulos e espermatozoides não seguem a lógica corporativa, desconhecem plano de previdência e estão se lixando para estabilidade financeira. Cuidado! Samambaias, peixinho beta e gatinhos não conseguem carregar caixão nem preencher a papelada do asilo.

 

Mas fiquemos calmos, também trago boas notícias. Com certeza, alguma inteligência artificial fará isso por você. Lógico, o que você acha que elas são? Apenas entidades frias, incapazes de algum vínculo afetivo? Afinal de contas, você se relacionou a vida inteira com plásticos, chips, teclados, cabos e gadgets. Eles irão, com certeza, guardar suas fotos, recordar sua comida preferida e, em alguma mesa de bar, cantarolar sua música, brindando à sua memória.

 

Cuidar de alguém, sobretudo um sujeito que precisa conhecer o mundo e as coisas da vida, é falar para si mesmo que, agora, o jogo é sério e você cresceu. Muitos, com o desejo da infantilização permanente, só querem fugir dessa realidade, eternizando o sonho de Peter Pan, e, da mesma forma que bois e vacas deixam seu rastro fecal por onde passam, também deixarão por aqui um outro rastro, chamado, sintomaticamente, de “carreira”, nada mais que isso.