Retrato de Nietzsche, por Julian Tinayre  -  (crédito: Gravura em madeira por Julian Tinayre)

Retrato de Nietzsche, por Julian Tinayre

crédito: Gravura em madeira por Julian Tinayre

Já cansou de ouvir que o sucesso está a apenas uma mudança de mindset de distância? Que tudo que falta na sua vida é acordar às 5h da manhã, fazer yoga e recitar mantras de gratidão enquanto toma seu chá de kombucha? Pois bem, meus parabéns! Você finalmente percebeu que está sendo gentilmente enganado. Bem-vindo ao maravilhoso mundo dos fracassados conscientes, onde o sarcasmo é nosso melhor coach, e a filosofia, nosso manual de sobrevivência.

 

 

Kant 

 

O pai do imperativo categórico e do esclarecimento. Kant provavelmente teria um ataque de risos (ou de pavor) se visse o que estão fazendo com o conceito de autonomia. Os coaches adoram dizer que você é o único responsável por sua vida, que tudo depende das suas escolhas. Bom, Kant concordaria em parte – afinal, somos seres racionais e responsáveis por nossas ações. Mas ele jamais te diria que basta pensar positivo para o universo conspirar a seu favor. Na verdade, ele lembraria que viver é enfrentar dilemas morais e que nem sempre o bem-estar virá em pacotes prontinhos, como um curso de 12 semanas que promete transformar sua vida.

 

Schopenhauer 

 

 

Um pouco de pessimismo, só para temperar nossa conversa. Enquanto tem gente “coaxando” o mantra de “você é único, incrível e nasceu para brilhar”, Schopenhauer levantaria uma sobrancelha e te diria, com todo o amor do mundo, que a vida é sofrimento, frustração e, muitas vezes, pura e simples falta de sentido.

 

Ele, que já sabia de antemão que a vida é, basicamente, um grande ciclo de desejos frustrados e que o melhor que você pode fazer é diminuir as expectativas, mandaria a real: "Querido, desejar coisas só te leva a uma vida de insatisfação constante. A verdadeira felicidade está em aceitar o fracasso inevitável, relaxar e apreciar a existência".

 

 

E se isso soa pessimista demais para você, talvez seja porque passou tempo demais ouvindo frases como “seja a mudança que você quer ver no mundo”, quando na verdade, nem no espelho você quer ver essa mudança. O desejo incessante de ser “melhor” ou de “ter sucesso” só aumenta nossa angústia.

 

 

Nietzsche

 

 

Com sua marreta filosófica, nos lembra que o super-homem, esse ser que transcende as limitações humanas e cria seus próprios valores, não tem absolutamente nada a ver com acordar cedo e fazer uma lista de gratidão. Ele nos diria que a verdadeira liberdade envolve confrontar a realidade dura e crua, e não transformá-la em uma nuvem cor-de-rosa onde tudo é possível desde que você “queira o suficiente”.

 

Ele, o sempre animado Friedrich Nietzsche, que te sussurra ao ouvido: “Torne-se aquilo que você é!”. O problema é que ele não te disse que, às vezes, o que você realmente é... é uma bagunça sem fim.

 

 

Mas, claro, o capitalismo-coaching prefere o caminho mais curto: soluções fáceis para problemas complexos. O mundo é um caos? Respire fundo e imagine sucesso! Está infeliz no trabalho? Gratidão! Sua vida financeira desmoronou? Foco e ação! No fundo, tudo é sua culpa. E a solução? O próximo curso online, o próximo livro de autoajuda, o próximo post viral de “você consegue!”.


Diferentemente do que dizem os gurus do desenvolvimento pessoal, a filosofia não oferece um “mindset vencedor”. Ela oferece o pensamento crítico. E pensar criticamente é, muitas vezes, desconfortável. Filosofar, em certa medida, é admitir que o mundo é caótico, que nem tudo tem solução e que viver é, muitas vezes, aceitar nossas limitações.

 

 

Se você está cansado de frases feitas e soluções mágicas, talvez seja hora de parar de “coachar mantras”. Aceite que o mundo não gira em torno do seu mindset e que a verdadeira liberdade é aprender a viver no caos, sem fórmulas prontas. 

 

Ah, e se tudo der errado, lembre-se: nem Kant, nem Schopenhauer, nem Nietzsche acordavam às 5 da manhã.


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