Por aqui, meus amigos de fé e irmãos de arquibancada, aguardamos a chegada do nosso Davi. Não, não é uma nova contratação do Galo, embora seja um baita reforço. Vem aí o anagrama de Vida, o Davi, atleticano novo, ainda que aliados gremistas estejam inocuamente à espreita. Davi Aysú, amor em tupi-guarani, uma homenagem aos antepassados da mamãe – a Vitória, um nome adequado.


Qual Davi?, perguntarão no futuro. O Davi da Vi. Até o fechamento desta edição, o Davi da Vi insistia em permanecer no forninho. Pelos meus vastos conhecimentos da obstetrícia e a larga experiência enquanto atleticano patológico, obviamente que Davi só está esperando pra nascer porque deseja nascer campeão.

 




Como o papai, que, nascido em 1972, já chegou campeão brasileiro e campeão do mundo. Bem, bastou nascer e começou a uruca. Passei 41 anos pensando o que tinha feito em vidas passadas – genocídios? Golpes de estado? Foi preciso ganhar a Libertadores, em 2013, para finalmente me libertar. E o Brasileiro de 21, a cerveja no bolo.

 


Agora o Davi tá na bica de entrar em campo, alonga-se, está em aquecimento, a mamãe não aguenta mais os polichinelos. Aguarda somente o penta. Sabe que ele virá. Espera o sinal: o hino do Galo tocado repetidas vezes, alto e desagradável, a incomodar a vizinhança durante os devaneios do papai campeão. Francisco, seu irmão, vai poder te falar mais sobre isso, Davi, quando você chegar.

 


Claro que tocaremos também aquela do Caetano: “Sua mãe e eu, seu irmão e eu, lhe damos as boas-vindas, venha conhecer a vida, eu digo que ela é gostosa, tem o sol e tem a lua, tem o medo e a rosa, eu digo que ela é gostosa, tem a noite e tem o dia, a poesia e a prosa”.

 


E tem o Galo, Davi. Como a gente te quer bem mais que tudo nessa vida, já vamos escolher seu time de uma vez, de forma que, quando você der por si mesmo, não haverá mais caminho de volta. Inocentes dirão tratar-se de um time de futebol. Mas você verá bem cedo, Davi, que o Galo é um jeito de se estar eticamente no mundo.

 


Um jeito de cair e levantar, de resistir, de estar do lado certo da história, de amar sem contrapartida, de lutar sempre, de chorar apenas nas vitórias, de fazer do caminho a sua viagem, de estar com os seus entre pretos e brancos, pobres e ricos, vivos e mortos.

 


Quando você nascer, Davi, pentacampeão, o mundo estará prestes a eleger o Trump. Um genocídio estará em curso. Ainda há fome na África e no Brasil. As florestas estão sendo destruídas. Os poderosos seguem explorando petróleo e produzindo lixo. A extrema direita dissemina ódio como forma de fazer política, e desacredita o aquecimento global, as vacinas, o racismo, a homofobia, a misoginia.

 


Em 2005, Davi, o Galo caiu. Foi um dos dias mais tristes da minha vida. Mas assim que o juiz apitou o final do jogo, o estádio lotado, alguém começou a cantar o hino. E a gente cantou, e chorou, e chorou. E o seu avô, David só que com D mudo, que não liga muito pra futebol, também chorou quando, naquela noite, viu um restaurante inteiro cantando. No ano seguinte, subimos campeões. E o papai chorou em todas as vitórias, e pra sempre parou de chorar nas derrotas. Nas derrotas, a gente luta.

 


Quando você chegar, pentacampeão, o Galo estará aí pra te mostrar o caminho das pedras. E haja pedra no caminho. Mas a gente segue, a gente luta, e, quando menos se espera, a gente ganha. Quanto mais difícil a vitória, mais épico e interessante se faz o nosso caminhar. Davi, da vitória. Da Vitória (obrigado, Vivi!). Da Vi. Seja bem-vindo, meu pequeno campeão. 

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