Rapidamente desenvolvi por Gabriel Milito um apreço absolutamente incomum. Embora não saiba em quem Milito votou para presidente, se Milei ou qualquer outro, já o tenho como um caráter excepcional, sendo dispensável o infalível medidor.


Não botaria minha cara no fogo, como Bolsonaro por Queiroz, mas, destro, a essa pouca altura já arriscaria a mão esquerda, aquela que segura a cebola na hora de seu esquartejamento. Estou certo de que não restaria prejudicada a minha parte nas funções da cozinha, dada a confiança que de presto adquiri neste homem de raras qualidades.

 




Vi uma foto do Milito com o sorriso aberto, a esperar o abraço do Arana na hora do gol. É curioso, porque parecia não haver dentes na boca do Milito, o que conferia a ele a humildade somente alcançada pelos banguelas, de uma doçura sincera e uma alegria desprendida.


Tive a vontade de ultrapassar o Arana e eu mesmo me jogar naquele abraço de avô. Sim, Milito tem um quê de Benjamin Button. Aos 43, é como se fosse o adorável Gepeto. O pai da matéria.


Claramente estou apaixonado por Milito. Que homem! Acordo pensando no Milito, durmo pensando no Milito. Há quem receba flores e se apaixone. Imagina receber meu Galo de volta, embalado pela Massa que julguei pra sempre morta no cadafalso daquela Arena, nosso ex-túmulo de mármore. Agora estamos aqui, novamente absortos por pensamentos de Atlético, e fodasse todo o resto, emprego, filhos, casamento, boletos.


Chego a achar Gabriel Milito um homem bonito, de uma elegância tímida e despojada. Um Javier Bardem que tivesse perdido o pente, um Ricardo Darín melhorado. Coitado do Diniz perto do Milito, com aquela camisa polo, aquela fuça de técnico – de técnico da Net –, aquela falta de educação no trato com seus comandados.


Milito, não. Milito não perde uma oportunidade de exaltar os seus. Tem de botar todo mundo pra jogar não por um rodízio inócuo ou uma invencionice de professor Pardal. Mas porque a intensidade com que joga, com a bola ou sem ela, não permite aos atletas 90 minutos de excelência todos os jogos. Substitui para manter igual.


É intenso por um motivo simples e objetivo: precisa ganhar. Com o elenco que treina, no time que joga, só a vitória interessa, sempre. Jogando em casa ou fora dela, estando atrás ou na frente do placar, seja qual for sua posição na tabela. Por isso vai jogar sempre igual, vertical, intenso, pra frente quando tem a bola, mordendo o calcanhar do adversário se não está com ela. Vai dar gosto de ver.


Milito gosta do jogo. Não importa se era o Cuiabá ou o Sport. Gosta do jogo jogado com paixão. Gosta do gol. Como o menino que faz do jogo de rua a final do Mundial. O jogo do Galo sempre foi esse. Um time de ataque. O time de Guará, Ubaldo, Reinaldo, Éder e Dario. Tardelli, Ronaldinho, Hulk e Paulinho.


Um time de paixão. Sua torcida não viveu de catalogar títulos e empilhar taças. Embora as tivesse, viveu e vive como aquele menino – no gol do Dinho ou do Vanderlei, nos mortos levados ao Mineirão no jogo da taça em 21, está tudo posto. Quantas estrelas poderia ter sobre o nosso escudo? Três? Três amarelas e uma vermelha? Só há uma. A estrela-guia, a nossa paixão.


Que sorte a gente deu com Gabriel Milito. Ou não. Porque se foi São Víctor que o buscou na Argentina, ele sabe exatamente qual o DNA daquele Galo Doido de 2013. O jogo intenso e pra frente, a paixão desse povo que acredita sempre. Eis a nossa receita desde 1908.


Milito também deu muita sorte: não tem time no mundo em que suas ideias façam mais sentido. Agora estamos todos aí, defensores do Jemerson e haters do Vargas, bolsonaristas e pessoas normais, todos indistintamente MILITANTES, apenas a aguardar o próximo jogo do Galo, e o próximo, e o próximo, e o próximo. Obrigado, Milito, por trazer de volta o Rivotril Litrão.

 

 

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