O ano está por um fio ou, para ser mais exato, 3 semanas. "O tempo não para", disse o poeta. Se bem usado, ótimo; se não, pena para quem desperdiçou o próprio tempo.

O Centro de BH também está por um fio, mas ao contrário do tempo, pode permanecer assim por anos, por décadas. Permanecer não chega a ser muito preciso, porque o Centro piora, e continua a degradar-se.

As pessoas vão se mudando, as empresas vão se mudando, os jardins e as praças vão se deteriorando, a insegurança vai tomando conta. Quando a gente presta atenção, é difícil saber se todo mundo foi embora do Centro porque estava ruim, ou se ficou ruim porque o Centro esvaziou.



Se o diagnóstico é um dilema transcendental padrão Tostines, o prognóstico é bastante fácil: basta repopular o Centro com moradores e negócios.

O diagnóstico é simples, mas os caminhos, não.

Se as pessoas saíram do Centro porque a insegurança é gigante, é razoável supor que só se interessem e voltar quando for novamente seguro. Se preferiram sair por conta da sujeira, precisa limpar para estimular o caminho contrário.

Mas se foi pela ausência de unidades residenciais modernas e adequadas, pela quase inexistência de prédios novos ou revitalizados, aí é mais difícil, porque o Centro não tem, atualmente, como responder (em quantidades compatíveis com a requalificação desejada e o adensamento necessário).

E tem uma outra "pegadinha" nessa equação que ninguém gosta de falar: não apenas não pode ter a predominância de unidades para baixa renda, quanto os casos reais mostram que a prioridade é trazer a classe média e os agentes de mudança, pessoas envolvidas com arte, cultura e formadores de opinião. São a classe média e os agentes de mudança que farão a "roda da fortuna" (ou a "roda da sustentabilidade") girar, atraindo e fomentando comércio e serviços interessantes, e o retorno de negócios e empresas para o Centro.

Sem comércios, serviços, negócios e empresas interessantes, não há densidade suficiente, não há gente suficiente circulando pelo Centro (apenas passando pelo Centro), e não há a limpeza e a segurança naturalmente garantidas em locais vivos e movimentados.

Sem essa abordagem, prevalece o ciclo que todos conhecemos, onde o poder público investe, limpa, revitaliza praças, traz mais efetivo policial e promove algumas atividades culturais para, dali a uns poucos anos, uma próxima administração anunciar um novo programa de revitalização.

O problema é que, assim como um carro sem motor exige gente para empurrar a cada movimentação, o Centro demanda verba pública continuamente para refazer aquilo que foi feito outro dia mesmo.

O nosso Centro não tem mais "motor", e o motor é gente e tudo aquilo que existe em torno de gente: moradias, comércio, serviços, negócios e empresas. É consumo, impostos, olhos na rua, agentes privados fazendo a sua parte e ajudando a manter os prédios ocupados, as ruas mais vigiadas e mais limpas.

Primeiro, o poder público precisa criar condições e oferecer estímulos para que o setor privado se interesse em revitalizar e reocupar os prédios vazios, subutilizados e deteriorados. Como preferir, sem limitação de tamanho, valor ou público-alvo. Depois, você deixa o setor privado agir e investir, correndo um risco que o poder público não precisa correr.

Quando as ações de estímulo à iniciativa privada são bem desenhadas e miram um futuro próspero, a habitação social de baixa renda estará contemplada e será, certamente, um dos objetivos mais importantes mas, ao invés de coibir ou disputar espaço com outras tipologias, estará cada vez mais presente subsidiada por ganhos em unidades de outro valores e outro público-alvo.

Essa é a lógica que norteia as ações de estímulo à revitalização do Centro de São Paulo e do Rio de Janeiro, onde o programa Reviver Centro já mostra resultados impressionantes, bem como um aprendizado de sintonia fina desde o seu lançamento, em 2021.

Em apenas 2 anos, o Reviver Centro (Rio) já contabiliza 35 operações e 2.760 unidades residenciais. Vou repetir: duas mil, setecentos e sessenta unidades residenciais em pouco mais de dois anos.
Se isso não for a medida de um incrível sucesso em termos de políticas públicas, precisaremos redefinir os termos e os dicionários. E rapidamente, porque eles continuam avançando por lá.

A principal diferença entre o programa Reviver Centro do Rio e o projeto de lei em discussão na Câmara dos Vereadores de BH (PL 551/23) é de ordem conceitual: no Rio, a municipalidade está usando, transferindo o risco e os investimentos para o setor privado, ao permitir que prédios revitalizados (ou construção nova) e destinados à moradia gerem como benefício para seu incorporador um coeficiente de construção que pode ser aplicado e outros empreendimentos, em outros bairros.

Como medida de inteligência para atingir o objetivo de levar moradia popular para o Centro do Rio, o benefício é maior quando a revitalização (ou construção nova) produz habitação de baixa renda. Numa situação limite, talvez um empreendedor topasse não ver resultado numa incorporação do Centro, em troca de um coeficiente construtivo que possa ser utilizado num bairro mais valorizado.
Isso é o setor produtivo, privado, assumindo riscos e investimentos para, juntamente com o poder público, realizar políticas públicas de forma eficaz e confiável (e muito mais rapidamente).

Legislação moderna e inspirada nos casos brasileiros que estão funcionando, numa parceria de verdade com a iniciativa privada. O poder público se valendo da agilidade do setor privado, numa relação franca, na qual os objetivos de cada parte estejam claros e objetivamente colocados, convergindo.

Se queremos continuar a verter recursos públicos a cada nova administração municipal para revitalizar a revitalização passada (num eterno "dia da marmota"), então estamos firmes no caminho, adicionando mais um capítulo a uma história conhecida.

Mas se, ao contrário, a ideia é realmente fazer do Centro novamente um órgão com autonomia, energia, vitalidade, segurança e atratividade, o caminho é deixar as diferenças de lado e trabalhar o projeto de lei de revitalização do Centro (o PL 551/23) para que seja um espelho das legislações do Rio e de São Paulo, que já tem resultados a apresentar.

Não é momento de inovar; a hora é de buscar inspiração naquilo que já está funcionando, e em português.

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