Leon Myssior
Leon Myssior
Leon Myssior é Arquiteto e Urbanista, sócio da incorporadora CASAMIRADOR, fundador do INSTITUTO CALÇADA e acredita que as cidades são a coisa mais inteligente que a humanidade já criou.
GELEIA URBANA

Você pode escolher morar na cidade ou no campo, mas escolherá a cidade

Cidades podem ser cansativas, barulhentas e estressantes, mas é nas cidades onde o conhecimento e a ciência florescem

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“Na Manchester e na Chicago industriais do século XIX, 60% das crianças morriam antes de seu quinto aniversário, e a expectativa de vida era de 26 anos, ao passo que os números para o campo eram, respectivamente, de 32% e quarenta anos. Ao longo da maior parte da história, as cidades foram lugares de onde era preciso escapar. No século XX, nos Estados Unidos e na Europa, testemunhou-se uma fuga vertiginosa das cidades, violentas e abarrotadas, para a terra prometida dos subúrbios arborizados. Nos anos 1990, após décadas de crise urbana, 60% dos nova-iorquinos e 70% dos londrinos afirmavam que preferiam morar em outro lugar. Pesquisas recentes, usando ressonância magnética para entender os processos neurais associados à vida urbana, revelaram que aqueles criados em meio aos estresses sociais do ambiente frenético da cidade sofreram reduções da massa cinzenta no córtex pré-frontal dorsolateral direito e no córtex cingulado anterior perigenual. Essas são regiões-chave do cérebro que regulam nossa capacidade de processar emoções e estresse. A cidade altera nossas conexões neurais: os citadinos, portanto, têm muito mais probabilidade de sofrer de transtornos de humor e ansiedade do que os habitantes do campo. Crime, doença, morte, depressão, decadência física, pobreza e superlotação têm muitas vezes feito da cidade um lugar de sofrimento onde se sobrevive na medida do possível”.

 

A leitura de “Metrópole: A história das cidades, a maior invenção humana” de Ben Wilson, embora exigente (em atenção, aos detalhes), não cansa de surpreender e jogar luz sobre a dinâmica do ser humano ao longo dos últimos sete mil anos.

 

 

“Quando as condições do ambiente mudaram radicalmente no sul da Mesopotâmia, os estilos de vida associados às zonas úmidas desapareceram. Contudo, por essa época, após um longo milênio de desenvolvimento, a civilização urbana encontrava-se madura. A retração dos pântanos, claro, deixou Uruk numa situação de penúria. Mas a história da urbanização é, em grande parte, a história da adaptação dos humanos ao meio ambiente variável, bem como da adaptação que os humanos impõem ao meio ambiente para atender às suas necessidades. Privados de sua antiga forma de subsistência, os agricultores dos pântanos buscaram refúgio na cidade, resultando numa população urbanizada de 90% na baixa Mesopotâmia”.

 

As pessoas podem ter sido mais felizes em Uruk, antiga “metrópole” suméria, cercada por jardins e servida por aquedutos, do que durante a revolução industrial, na Manchester do século dezenove. Afinal, as cidades de então contavam sua população às centenas (ou poucos milhares), e os recursos naturais disponíveis eram mais do que suficientes, numa grande taba que congregava coletores, fazendeiros e artesãos.

 

 

E faz sentido, uma vez que a revolução industrial cria uma enorme demanda por mão de obra, e a promessa da libertação dos senhores feudais. Os empregos vieram, mas a “libertação” pode ter tido um gosto bastante amargo. As cidades não estavam preparadas para esse influxo gigante de novos moradores. Pior, ninguém estava preocupado com essa massa de gente (exceto eles próprios), mal instalados e em condições terríveis, muito piores do que as deixadas para trás.

 

Mas havia emprego, salário e alguma remuneração, o que deixava as “grandes fomes” no passado. O gosto foi amargo, mas a troca parece ter compensado em alguma medida, porque o pêndulo do êxodo permaneceu inerte nessa posição (campo > cidade), e nem mesmo o movimento para os subúrbios alteraram a tendência.

 

 

A despeito dos transtornos de humor e ansiedade, taxas de criminalidade, depressão, decadência física e outros males do espírito, é nas cidades que a arte e a cultura florescem, que o conhecimento e a ciência prosperam. É nas cidades que a expectativa de vida se amplia constantemente, e a mortalidade infantil despenca.

 

Mas nem tudo são flores, e é nas cidades, também, onde os conflitos interpessoais e grupos organizados se manifestam com maior protagonismo, barulho e implicações reais. Parte desse mal estar pode ser atribuído a cidades ruins, sujas, feias e desprovidas de áreas de lazer, parques e praças; parte pelo trânsito, sempre piorado pela ausência de metrô em quantidade e com a amplitude necessárias.

 

 

Mas a gestão e a legislação urbanística também fazem a sua parte, para o bem ou para o mal. Quando as gestões são deficientes, descuidadas na zeladoria e na segurança pública, quando o executivo municipal tem uma visão romântica ou francamente errada do que seja uma cidade, quando a empresa de trânsito lidera os projetos de desenvolvimento urbano, a cidade sofre, e a população sofre: tudo é longe, tudo é difícil, desarticulado, barulhento, lento e cansativo.

 

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A civilização pode ser barulhenta, e a convivência desarmoniosa, mas as cidades precisam se configurar em torno do que é certo e consagrado: densidade, uso misto, rede de metrô amplas, áreas de lazer, equipamentos esportivos e culturais.

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