Então é Natal! Muita coisa mudou ao longo do tempo, outras nem tanto. A colecionadora Priscila Freire, de 91 anos, e o escritor Daniel Cruz Fonseca, de 30, escrevem sobre a diferença da celebração natalina por parte das respectivas gerações. Em uma coisa os dois concordam: o momento é sinônimo de esperança e de celebração da vida. Feliz Natal! é o que a coluna deseja a todos os leitores.
PELEJA E SAUDADE
• Por Priscila Freire
“Trinta anos atrás, ainda se mandavam cartões-postais com lindas ilustrações de Natal. Recebíamos 20 ou 30, era uma peleja para responder ainda a tempo de desejar feliz ano novo. Os bancos e casas comerciais enviavam agendas com o mapa do mundo, bandeiras dos países, noções de temperatura ambiental.
Cheguei até a ganhar almanaques fantásticos com ilustrações e noções de história, anedotas e quadrinhos. O armazém nos presenteava com a folhinha, que era colorida e ficava na cozinha para nos dar o bom do dia. Ela ia se desfolhando à medida que o tempo passava.
Tudo isso foi desaparecendo aos poucos, sem que déssemos muita atenção a esse sumiço. Que pena, “a escola era risonha e franca”.
Hoje, ficamos aguardando o noticiário tenebroso do mundo inteiro dentro da nossa casa. O Natal passa a ser obrigação: temos que festejá-lo, reunir a família, comprar presentes, fazer os embrulhos e barulho. É triste olhar para o tempo, nos magoarmos com a falta daqueles que viveram conosco e se foram.
Melhor ficarmos junto dos mais jovens que estão a festejar. O Natal, como fazíamos quando estávamos juntos, merece saudade e renovadas esperanças. E que essas possam vir a nos trazer prazer, o prazer de estarmos vivos e festejando.
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Afinal, que bom termos o Natal, mesmo que o nosso mundo tenha ficado mais pobre.”
O VALOR DO AFETO
• Por Daniel Cruz Fonseca
“O Natal, enfim, chega. Escorregando pela neve do último lançamento no streaming, deságua na nossa chuva tupiniquim, em meio ao calor do verão, e traz consigo esta pausa para reflexão.
A gente respira fundo o ar nostálgico da ceia – farofa e pernil –, começa a se animar ou até planejar. Monta a árvore pra postar no Instagram, “faz” um cartãozinho com inteligência artificial pra mandar no grupo, pega a sobra do décimo-terceiro e pensa naquele presente ideal que caiba no orçamento, mas combine com o ente querido. “Frete grátis”, “compra online”, “cupom especial”, “espero que goste”.
Como nossa geração é de sobreviventes da pandemia, aprendemos a dar valor a esse encontro familiar (desde que não falem de política desta vez). E, nisso, a gente vai dando um jeito: até chama o parente distante para uma chamada virtual, ou faz selfie e envia para quem ainda está no trabalho. A piada do pavê continua, e o momento de gratidão, embora mais curto, parece mais sentimental.
Nesse instante, a gente se olha nos olhos e enxerga o que há de importante no meio desta vida apressada: o sorriso de afeto das pessoas que amamos.
O Natal é uma escolha. Escolhemos separar aquele momento para toda a eternidade da memória. E a brisa da madrugada parece mais fresca assim, como se nos embrulhasse no presente perfeito de ternura. É nesse desvario que o Natal vira esperança – não daquelas inalcançáveis, mas a esperança-enfeite de árvore, que tá ali, discreta, esperando que você repare nela.”