Quem são as pessoas LGBTI+ que marcaram as revoluções da história mundial? Quem foram as pessoas LGBTI+ das realezas mundo a fora? E dos principais acontecimentos políticos nacionais e internacionais? Quem foram as pessoas LGBTI+ que mais contribuíram para as artes nos últimos séculos? Talvez você tenha dificuldade de se lembrar de nomes LGBTI+, mas se lembra de muitas pessoas heterossexuais ou de pessoas sobre as quais você nunca ouviu falar sobre a orientação afetivo-sexual.
Algum leitor menos informado sobre o tema pode pensar: “mas não é importante dizer se a pessoa é LGBTI+ ou não, o que importa são os feitos dela”. Eu concordaria apenas se não fosse relevante saber se as pessoas são heterossexuais e cisgênero, mas a história nos conta, por exemplo, que Dom Pedro I, Maria Leopoldina e Domitila eram pessoas cisgênero e heterossexuais (presumidamente). A história não fala apenas de seus feitos, mas de seus relacionamentos. Então, por que esconder essas questões quando a figura histórica era LGBTI+? Por que não normalizar essas informações para que tenhamos referências de pessoas LGBTI+?
A história das pessoas LGBTI+ é tão antiga quanto a história da humanidade. Sempre existiram pessoas LGBTI+ e elas estavam em todos os espaços, assim como estão hoje. Elas lutaram em guerras, elas fizeram parte de reinos mundo a fora, elas tomaram importantes decisões políticas e foram vaguardistas nas artes, assim como pessoas cis e heterossexuais também foram.
Não sabemos essa história porque a religião e a moralidade (inclusive política) apagaram propositalmente as pessoas LGBTI+ tanto no Brasil quanto no mundo ao longo dos anos. Quando não foi possível apagar as pessoas, devido a alta relevância de seus feitos e posições que ocuparam, a estratégia foi manter seus nomes na história, mas apagar o fato de que são LGBTI+. Assim, aprendemos apenas uma história heteronormativa e cisgênero.
Projetos sobre história LGBTI+
Apesar da exclusão da história LGBTI+ ainda perdurar, com a censura de conteúdos que não se encaixam no que setores conservadores querem ensinar sobre a história, algumas pesquisas têm sido realizadas para resgatar a relevância das pessoas LGBTI+ na história do Brasil e do mundo.
Eu estive no Museu Nacional da Escócia, em Edimburgo, onde pude apreciar um projeto fantástico: o LGBTQIA+ Hidden Histories Trail (em livre tradução Trilha de Histórias Ocultas LGBTQIA+). Esta trilha é uma colaboração entre jovens pesquisadores e artistas que buscam destacar histórias LGBTQIA+ nas coleções do museu. Ou seja, objetos históricos estavam no museu, lembranças das personalidades históricas estavam lá, mas antes era escondido que elas eram pessoas LGBTI+. Somente por meio desse projeto foi revelada explicitamente essa parte da identidade dessas pessoas nas coleções do museu.
Um dos objetos é um vitral mostrando o retrato do Rei Jaime I. Ele reinou na Escócia desde 1567 e com a união das coroas se tornou rei da Inglaterra e Irlanda a partir de 1603. A pesquisa revelou uma história escondida: Rei Jaime era um homem LGBTI+. Casado com a Rainha Consorte Ana da Dinamarca, ele era famoso por ter uma sucessão de "favoritos" masculinos ao longo de seu reinado, um termo então usado para se referir a um parceiro ou amante romântico. O mais conhecido deles foi George Villiers, o duque de Buckingham, que foi o favorito do rei de 1608 até a morte de James, em 1625. Esse vitral, originalmente localizado na Abadia de Wroxton, na Inglaterra, foi feito para comemorar uma visita que o rei e seu 'favorito' fizeram à região. O projeto do museu mostra essa e outras peças e explica com mais detalhes as histórias escondidas por trás de cada objeto.
Interessante, não é? Já imaginou quantas histórias um projeto desses no Brasil revelaria e o quanto seria importante ter mais evidências da importância das pessoas LGBTI+ em nossa história? O que mudaria revelar as identidades LGBTI+ da família real portuguesa-brasileira? E das pessoas que participaram do golpe militar de 1964, assim como das que lutaram contra o golpe? Bandidos e heróis LGBTI+ fariam parte de nossa história, abertamente.
Outros projetos como o da Escócia já acontecem no mundo. A maior parte do que temos de história, entretanto, é mais recente e fala de uma história que não foi possível apagar devido aos movimentos sociais LGBTI+ organizados e ao acesso mais amplo à informação a partir da segunda metade do século passado. Há projetos que revelam a história da Diversidade e da luta pelos direitos LGBTI+.
O Museu da Diversidade Sexual em São Paulo, por exemplo, tem uma exposição permanente que retrata a história da diversidade sexual no Brasil e no mundo. Já o Museu do Sexo, em Nova York, conta com uma extensa coleção de artefatos que retratam a história dos movimentos pelos direitos LGBTI+. Em San Francisco, nos Estados Unidos, foram criados monumentos em homenagem aos ativistas LGBTI+ que lutaram pelos direitos da comunidade. Além disso, há livros que falam dessa história, como o Movimento LGBTI+: uma breve história do século XIX aos dias atuais, escrito por Renan Quinalha e publicado pela editora Autêntica. Vale ler e visitar esses espaços para conhecer melhor nossa história ocultada pelos conservadorismo.