O governo descartou a possibilidade de alterar a meta fiscal de “déficit zero” para 2024, ou seja, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, venceu a queda de braços com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, com argumentos técnicos nas reuniões entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros da área econômica. Houve uma trégua nessa disputa, até março do próximo ano. Articulações de bastidores com o Congresso foram decisivas, porque também garantiram o apoio dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PDS-MG), para aprovaçao da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) sem alteração dessa meta.

O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias no Congresso, deputado Danilo Forte (União-CE), anunciou que manterá o déficit zero na proposta a ser aprovada pelo Congresso, a pedido do próprio governo. Logo depois, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, confirmou a posição do Palácio do Planalto. Haddad e Padilha se aliaram na defesa da meta.

Após aprovado o Orçamento da União de 2024, pela regra, o governo terá que gastar apenas o que arrecadar, sem aumentar a dívida pública para cumprir despesas de custeio e investimentos. Esse é o pomo da discórdia, porque significa o contingenciamento de gastos caso a arrecadação não aumente como o previsto, apesar da reforma tributária e de outras medidas. Uma delas é a regulação das apostas esportivas, que enfrenta resistências no Senado.



Danilo Forte fechou o acordo durante reunião com Haddad, Padilha, Esther Dweck (Gestão e Inovação) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), além do líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), no Palácio do Planalto. Enquanto recebe emendas de deputados e senadores, ainda negocia detalhes do texto final com a equipe econômica. A LDO deve ser votada na próxima semana. Na segunda-feira, haverá outra reunião com Haddad para bater o martelo.

A moeda de troca para aprovaçao do déficit zero pelo Congresso, porém, é um novo aumento de gastos com os partidos políticos. Os líderes da Câmara pretendem incluir na LDO um aumento do fundo eleitoral para as eleições municipais do próximo ano de R$ 2 bilhões, que foi quanto custou o pleito de 2022, para R$ 5 bilhões. A proposta obedece à lógica da preservação dos atuais mandatários, que precisam cevar suas bases eleitorais no próximo ano, de olho na própria reeleição. Estima-se que apenas os cinco maiores partidos da Câmara, se a proposta for aprovada, recebam de R$ 400 milhões a R$ 1 bilhão.

Crescimento

O pano de fundo das divergências no governo em relação ao déficit zero são as projeções de crescimento da economia. A última previsão do boletim semanal Focus, do Banco Central, é de 2,9% crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023 e, pasmem, 1,5% no próximo ano. Isso é tudo o que o presidente Lula não quer no segundo ano de mandato, ainda mais com uma disputa eleitoral no caminho.

Muitos no governo associam o déficit zero ao baixo crescimento econômico, daí a pressão para aumentar os investimentos e gastos governamentais, mesmo que isso tenha impacto na inflação. Embora o acordo interno com Lula seja só reabrir a discussão sobre déficit zero em março do próximo ano, caso o aumento de arrecadação não corresponda às expectativas, novas tensões poderão ocorrer em dezembro, quando for divulgado a taxa de crescimento do PIB do terceiro trimestre.

Os resultados obtidos até agora, 1,8% de crescimento do PIB no primeiro trimestre e 0,9% do PIB no segundo, foram proporcionados pela grande safra agrícola, a PEC da Transição e o Bolsa Família. Teme-se, porém, que a economia tenha estagnado depois disso. O setor de serviços puxa o desempenho para baixo. Ou seja, o cenário da atividade econômica não é favorável ao aumento da arrecadação, mesmo com a reforma tributária, a não ser que haja aumento da carga tributária significativo.

Para um governo que foi eleito principalmente pelos mais pobres, a redução da taxa de crescimento de 2023 para 2024 pode afetar bastante a popularidade. Não se trata apenas dos programas sociais do governo, mas também das perspectivas dos jovens e empreendedores, que sofrem com o desemprego e a desestruturaçao de seus negócios, respectivamente. Ainda que tenha havido crescimento dos empregos com carteira assinada.

Essa situação, caso se confirme, acirrará as contradições internas do governo, principalmente entre o ministro da Casa Civil, Rui Costa, que gerencia o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, responsavel pelo equilíbrio fiscal. O xis da questão é que a elevação do déficit para garantir a execução das obras e os programas sociais do governo impacta imediatamente a taxa de juros (Selic), cuja trajetória declinante, mantida, estimulará investimentos e reduzirá a dívida pública.

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