Em seu primeiro ano, Lula fica longe de Minas -  (crédito: Ricardo Stuckert/PR - 2/8/23)

Em seu primeiro ano, Lula fica longe de Minas

crédito: Ricardo Stuckert/PR - 2/8/23

A conferência nacional do PT realizada na sexta-feira e no sábado, em Brasilia, expôs as contradições da legenda e, de certa forma, um erro de conceito cujo custo já está ficando evidente: a tese de que o governo Lula está em disputa com os aliados. O PT até hoje não assumiu a realidade de que o atual governo não se sustenta numa frente de esquerda, mas sim na ampla coalizão de centro-esquerda da qual participam também partidos que estiveram no governo Bolsonaro, na sua totalidade ou em parte. Trata-se de uma ampla coalizão democrática, mas o PT gostaria que fosse um governo de unidade popular. `

Para bom entendedor, Lula rebateu as críticas feitas pela presidente do PT, Gleisi Hoffman, à condução da economia pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Fez isso em forma de autocrítica, como o principal líder do partido, ao questionar a soberba da legenda e a razão de a legenda não conseguir falar “aquilo que o povo quer ouvir”.

"Nós temos que nos perguntar por que que um partido que, muitas vezes no discurso pensa que tem toda a verdade do planeta, só conseguiu eleger 70 deputados?", indagou. "Por que tão pouco se a gente é tão bom? Por que tão pouco se a gente acha que a gente poderia ter muito mais? É preciso que a gente tente encontrar resposta dentro de nós. Será que nós estamos falando aquilo que o povo quer ouvir de nós? Será que nós estamos tendo competência para convencer o povo das nossas verdades?", questionou ainda.

Talvez a resposta para isso esteja na agenda do PT, muito focada nas pautas identitárias e em reivindicações corporativistas, que afastam a legenda dos setores evangélicos, empresariais e mais conservadores, e no velho projeto nacional-desenvolvimentista, ultrapassado pela globalização e sem a menor viabilidade, diante da necessidade de integração às novas cadeias globais de valor. Essas prioridades de fato diferenciam o PT, como partido de esquerda, das demais forças que apoiam o governo, porém, ao mesmo tempo, geram tensões no Congresso, que acabam por aumentar o cacife do Centrão nas negociações com o próprio governo.

O PT não persegue a construção de uma plataforma de governo unitária, que contemple simultaneamente os seus interesses e os dos aliados, nem faz a menor força para isso. Isso complica muito as negociações com o Congresso e a própria coesão do governo, que tem ministros ligados ao Centrão, ao MDB e outros partidos de esquerda, como o PSB e o PDT, que também sofrem com a política de “meu pirão primeiro”.

“Precisamos ter recursos, precisamos ter a parte do crescimento econômico como uma meta e um mantra nosso. Gente, se cair a popularidade do presidente Lula, vocês não tenham dúvida sobre o que o Congresso Nacional pode fazer. Fizeram com Dilma. Se acontecer qualquer problema, esse Congresso engole a gente”, avaliou Gleisi, ao lado de Haddad, ao discursar na conferência, cujo foco deveria ser a plataforma e as alianças da legenda para as eleições municipais.


Fator de risco

As críticas das lideranças petistas ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, são um fator de risco para o governo, muito embora uma das preocupações da cúpula petista seja a perda de popularidade de Lula em razão de um eventual fracasso econômico. Essa visão tem por base a experiência vivida no governo Dilma Rousseff, na ótica de que teria sido um golpe de direita do Congresso, sem levar em conta os erros cometidos pela ex-presidente na relação com o Parlamento, dos quais a própria Gleisi foi uma das protagonistas, como ministra da Casa Civil. Além disso, Lula é um político mais pragmático, de muito mais trato, o que é reconhecido até por adversários. Ciro Nogueira, presidente do PP, por exemplo, diz que não conversa com Lula porque não resistiria a um convite para apoiar o governo.

É mais ou menos sobre as dificuldades e a despreocupação do PT com as articulações no Congresso que Lula tratou, ao explicar suas dificuldades na Presidência: “Nós dedicamos este ano a recuperar o Brasil. Nós tivemos que reconstruir coisas com uma base parlamentar menor do que já tivemos. Ficou mais difícil, é preciso ter paciência. Muitas vezes, a gente cede quando não poderia ceder. E muitas vezes a gente conquista coisas quando a gente pensava que não ia ganhar", declarou.

As críticas do PT ao Centrão como foco de sua atuação no Congresso não ajudam a aprovação das propostas econômicas do governo, que deveria ser a prioridade da legenda na conjuntura; como muitos são contra a política econômica, isso não ocorre por acaso. Ocorre que isso é uma espécie de “quanto pior, melhor”, cujo maior prejudicado é o próprio governo Lula.

O PT foi impactado emocionalmente pelos resultados das pesquisas do Ipec e do Ibope. O primeiro mostrou que o governo é avaliado como “ótimo ou bom” por 38%. As classificações como “regular” e “ruim ou péssimo” empataram em 30%. Esses resultados refletem as dificuldades objetivas de o governo apresentar resultados mais expressivos, de um lado, na economia e nas áreas sociais; e de outro, a fragilidade diante do déficit público.